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Exercício não tem idade

Para os idosos, os ganhos ao corpo e à mente da atividade física podem ser a linha divisória entre depender de outros e conseguir ter mais vigor e autonomia

Por Juan Ortiz, Juliana Coin e Pedro Nakamura
19 fev 2021, 13h56

Não importa se você nunca foi chegado a dar umas caminhadas, andar de bicicleta ou praticar outro esporte. Ou se faltava tempo para incluir um exercício na rotina. Mesmo em tempos de pandemia, que cobram cuidados extras no ir e vir, a ciência tem ótimos argumentos para convencê-lo a começar a suar a camisa — especialmente após os 60 anos.

“A atividade física é extremamente importante em qualquer momento da vida, mas sobretudo quando pensamos no envelhecimento”, diz a geriatra Maisa Kairalla, da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG).

Uma revisão de estudos conduzida por pesquisadores da Irlanda do Norte apresenta uma lista extensa de benefícios que idosos adeptos dos exercícios têm em relação àqueles não afeitos a mexer o esqueleto. Para ter ideia, os ativos encaram menor risco de morte precoce, câncer de mama e próstata, fraturas, quedas recorrentes, limitações funcionais, declínio cognitivo, Alzheimer, depressão… Um combo e tanto. Reunindo dados de outros trabalhos robustos, a análise comprova que a atividade física altera e resguarda diversos sistemas do organismo, promovendo ganhos físicos e mentais.

A revisão revela ainda que, em adultos acima dos 60 anos que realizam doses baixas de exercícios moderados a vigorosos no dia a dia, a redução da mortalidade por todas as causas chega a 22%. No caso daqueles com mais de 70 anos que mantiveram altos níveis de movimentação, a queda foi ainda mais significativa: 34%.

Além de estender o tempo de vida e poder driblar doenças da pesada, há outro ganho precioso em jogo: curtir os anos da aposentadoria plenamente, sem limitações físicas. O grupo de idosos mais ativos conseguiu reduzir pela metade o risco de declínio da capacidade funcional de alto nível, como é conhecida a habilidade de caminhar longas distâncias ou subir escadas.

Informações de seis estudos contemplados pelos cientistas norte-irlandeses, envolvendo um total de quase 4 mil indivíduos na meia-idade, apontam também que aqueles que se exercitam intensamente (praticando corrida com frequência, por exemplo) apresentam uma tremenda vantagem: adiam o tal do declínio funcional em cerca de 13 anos, em média. Não é pouca coisa.

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“Isso está relacionado com a capacidade de manter a autonomia. Ou seja, significa conseguir se levantar de manhã, colocar uma roupa sozinho, tomar banho, ter controle urinário, preparar a própria comida, utilizar um celular, sair para o mercado e fazer as compras”, descreve o fisioterapeuta Luis Telles da Rosa, professor da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), no Rio Grande do Sul.

Não é à toa que o Consenso de Copenhague, documento que reúne diretrizes globais sobre exercício e envelhecimento, traz a capacidade funcional como um de seus pilares. E reforça: tudo bem entrar nessa onda mais tarde. “Em idosos que não eram previamente ativos, as evidências mostram que vários sistemas fisiológicos são aprimorados com o aumento da atividade física e a adesão a programas de treinamento”, diz o consenso.

Como a atividade física repercute em cada canto do corpo

Ossos: são fortalecidos, o que reduz o risco de quedas e fraturas, além de melhorar a mobilidade. Atividades de impacto, como corrida, são as que mais estimulam o esqueleto.

Músculos: sua formação e preservação dependem da prática esportiva. Com a musculatura em dia, evita-se a sarcopenia, quadro ligado a tombos e mortalidade precoce.

Cérebro: os exercícios retardam o declínio cognitivo, a demência e o Alzheimer. Ainda favorecem a interação social, combatendo a solidão e o risco de quadros depressivos.

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Coração: ao suarmos a camisa, conseguimos controlar melhor o colesterol, a pressão, a glicemia e o peso. É um pacote de vantagens que culmina na proteção cardiovascular.

Pulmões: modalidades que envolvem força, equilíbrio e exercícios aeróbicos aperfeiçoam a função pulmonar e, assim, turbinam a capacidade respiratória.

Benefícios para a mente

Embora a saúde física seja nitidamente privilegiada, não é só ela que sai no lucro quando os exercícios são incorporados ao cotidiano. É unanimidade entre os experts que dar adeus ao sofá tem um potencial efeito protetor sobre o cérebro, já que promove a formação de vasos sanguíneos e novos neurônios. Além disso, reduz processos inflamatórios e possíveis lesões relacionadas ao estresse oxidativo na massa cinzenta — fenômeno comparável ao enferrujamento dos metais.

“Não podemos afirmar que, sozinha, a atividade física evita o desenvolvimento de doenças neurodegenerativas e quadros de demência. Mas os trabalhos científicos sugerem que a prática regular de exercícios pode retardar o início desses problemas”, esclarece a neurologista Chien Hsin Fen, do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP). O Consenso de Copenhague também aborda esse aspecto: “(…) o declínio cognitivo associado e a neurodegeneração podem ser desacelerados ou retardados em adultos fisicamente ativos”, crava a diretriz.

A prática esportiva reduz o risco de declínio cognitivo em proporções que variam de 26 a 38%, de acordo com aquela revisão feita na Irlanda do Norte. Quem abandona o sedentarismo e parte para níveis moderados de atividade física atinge a menor porcentagem, enquanto aqueles que se exercitam de maneira mais intensa obtêm os melhores resultados. Altos níveis de atividade física ainda estão atrelados a uma redução de 32 a 42% na probabilidade de desenvolver especificamente o Alzheimer — já para os quadros de demência, a variação é de 14 a 21%.

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Idosos que se movimentam mais também apresentam uma incidência 21% menor de depressão em comparação àqueles que permanecem paradões. “O exercício físico diminui os processos de envelhecimento de diversas regiões do cérebro, como o hipocampo, relacionado à memória, e o córtex pré-frontal, ligado às emoções”, explica o educador físico e doutor em psiquiatria Felipe Schuch, professor da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), no Rio Grande do Sul.

O que ainda não está muito claro, informa Schuch, é de que jeito exatamente o exercício estimula o cérebro. Uma das hipóteses diz respeito à própria natureza do envelhecimento. Ao provocar pequenas inflamações, o exercício físico regular seria capaz de incitar as defesas anti-inflamatórias do corpo. Como consequência, isso acabaria protegendo o cérebro do estresse oxidativo, que contribui para o declínio de nossas faculdades mentais.
Um novo sentido

Doenças à parte, não dá para perder de vista mais um benefício importante que a atividade física proporciona à mente: o prazer. Essa é inclusive uma das principais motivações para a prática de exercício entre idosos, conforme aponta um experimento liderado pela Universidade da Colúmbia Britânica, no Canadá. Os pesquisadores conduziram entrevistas minuciosas com 22 homens de 67 a 90 anos. Entre as falas dos voluntários, destacou-se o uso de palavras como “agradável”, “uau”, “revigorante”, “relaxado” e “zen” para descrever o impacto do suor da camisa em seu bem-estar.

O aspecto do prazer não pode ser menosprezado, porque é ele justamente a razão pela qual o exercício acaba sendo introduzido de vez na rotina. Ora, o idoso precisa gostar do que faz para seguir em movimento. Os estudiosos canadenses ressaltam que as atividades em grupo são as mais entusiasmantes nesse sentido. E têm um efeito adicional: dão sentido à vida.

“Para esses homens, praticar exercícios coletivamente os deixa com um forte senso de realização”, concluíram os autores. É claro que nem todos os indivíduos encontrarão nos esportes em grupo a saída para pôr fim ao sedentarismo. Como o Consenso de Copenhague pontua, o idoso não é uma pessoa só. E o desafio dos profissionais é saber como motivar perfis distintos.

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Então, como começar a malhar na maturidade?

A verdade é que há diversos fatores capazes de despertar o interesse em uma rotina mais ativa. Um exemplo é a escolha do local de treino: muita gente relata que prefere se exercitar ao ar livre em vez de academias. A afinidade com o professor de educação física também conta, assim como o estilo da modalidade e o tipo de esforço exigido.

Seja onde e com quem for, a Organização Mundial da Saúde (OMS) atualizou suas recomendações e, hoje, preconiza que o ideal é fazer atividade física moderada de 150 a 300 minutos por semana — ou de 75 a 150 minutos da versão intensa, quando não houver contraindicação. Para definir qual é o exercício ideal, educadores físicos e médicos precisam avaliar os seguintes fatores: histórico e estado atual de saúde; ocupação profissional; interações e vínculos sociais; características nutricionais; uso de medicações; e hábitos prévios de prática de esporte, entre outros. Com base nas respostas, é possível estabelecer um programa que se adapta às necessidades específicas de cada um.

Um dos esquemas mais indicados para a terceira idade é o treino multimodal, que integra exercícios aeróbicos, de força e de equilíbrio. Os primeiros podem ser representados por caminhadas ao redor de uma praça ou, para se proteger do coronavírus, marchas paradas na sala ou ao lado da cama. Essa é a modalidade que concentra mais efeitos positivos à saúde mental, diga-se.

Já a segunda categoria — a dos exercícios de força — serve para preservar os músculos e fortalecer os ossos, imprescindíveis para a boa capacidade funcional. “Quanto mais idoso, mais importante é se dedicar a esse tipo de treino”, defende Maisa. Geralmente o foco são os membros inferiores, com repetições de tarefas como sentar e levantar da cadeira ou subir lances de escada.

Por último, mas não menos importante, entram os exercícios de equilíbrio, que têm o objetivo primordial de reduzir o risco de quedas. Esse tipo de atividade consiste em manter várias posturas — como ficar parado em um pé só ou colocar os pés em linha reta, um na frente do outro, de olhos fechados.

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Segundo uma pesquisa feita pela Universidade Federal do Triângulo Mineiro com 345 voluntários acima da sexta década de vida, a incidência de quedas entre idosos é de 37%. Além disso, o medo de cair está associado à maior ocorrência de tombos recorrentes.

Fora essa tríade, há um quarto tipo de atividade que pode ser adicionada simultaneamente aos exercícios de estabilidade do corpo: os estímulos mentais, como operações matemáticas básicas. “A atividade de dupla tarefa, ou seja, motora e cognitiva, interfere no funcionamento do cérebro e na capacidade de controlar o equilíbrio”, descreve Telles da Rosa. Um exemplo prático: enquanto o idoso se sustenta em uma perna, precisa responder quanto é 37 menos 18. Corpo e cabeça trabalhando…

Da teoria à prática

Alguns aspectos influenciam na (falta de) disposição para malhar, como as características do local onde se vive. Em 2011, um levantamento da USP constatou que o local de residência exerce papel fundamental na decisão de praticar atividade física. Os cientistas conduziram questionários com 890 moradores de Ermelino Matarazzo, bairro da zona leste paulistana.

Segundo o estudo, pessoas com melhor percepção de segurança no entorno de sua casa tendem a se exercitar mais. Espaços bem iluminados, por exemplo, favorecem caminhadas noturnas. Mas isso não deveria ser determinante. Durante a quarentena imposta pela Covid-19, ficou claro que, mesmo dentro de um apartamento e com pouco espaço, é possível realizar treinamentos físicos completos.

Outro entrave para inserir caminhada, musculação e afins na rotina são os maus hábitos adquiridos ao longo da vida adulta. “De forma geral, a maior parte da população sabe que praticar atividade física faz bem à saúde. Não é essa a informação que falta”, acredita Telles da Rosa. O dilema, observa o fisioterapeuta, é a forma como o exercício é encarado.

Mesmo quando o indivíduo está aposentado, mexer o corpo é considerado algo secundário, que pode ser adiado em razão de outros afazeres mais imediatos — numa procrastinação sem fim. É esse raciocínio que deve ser abolido. Em qualquer fase da vida, estar em movimento é um dos compromissos mais cruciais a cumprir.

Orientações importantes a quem já passou da sexta década de vida

Frequência: comece três vezes por semana. Após três meses de adaptação, busque se exercitar todos os dias.

Duração: invista em sessões de aproximadamente 30 minutos. Mais do que isso, só para quem pratica regularmente.

Intensidade: no início, vá devagar e pegue leve. Evite carga de peso ou velocidade desconfortáveis para não desistir no meio.

Modalidade: o ideal é conjugar ou alternar atividades aeróbicas, de força e equilíbrio. Se for em grupo, maior a motivação.

Alimentação: procure fazer um lanche entre uma e três horas antes dos treinos. Não se esqueça de manter a hidratação.

Máscara: é essencial em práticas ao ar livre e nas academias — e será assim por um tempo.

Companhia: exercitar-se com um amigo faz o tempo passar voando.

Alongamento: o estica-e-puxa auxilia na prevenção de lesões e dores no pós-treino.

Conforto: as roupas e o tênis não podem gerar incômodo durante os movimentos.

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