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Comer placenta traz benefícios à saúde?

Por causa do interesse crescente nessa prática, cientistas decidiram investigar se ela oferece vantagens ou riscos às mulheres

Por Thaís Manarini
Atualizado em 2 jun 2017, 17h57 - Publicado em 26 abr 2017, 16h30
Algumas mães reportam diversas vantagens – tanto é que grande parte das adeptas declara a intenção de apostar em pílulas de placenta de novo, em futuras gestações
Algumas mães reportam diversas vantagens – tanto é que grande parte das adeptas declara a intenção de apostar em pílulas de placenta de novo, em futuras gestações (Foto: Dercílio / Ilustração: Anna Cunha/SAÚDE é Vital)
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Nos últimos tempos, cresceu o número de mulheres interessadas em consumir a própria placenta depois do parto – o órgão é responsável, entre outras coisas, por nutrir o bebê durante a gestação. Enquanto há mães que usam alguns pedaços em receitas, como vitaminas, outras preferem usá-los para fazer cápsulas.

A prática, chamada placentofagia, vem sendo considerada vantajosa por motivos como repor as quantidades de ferro no organismo (o que aumentaria a disposição), melhorar a produção de leite e até afastar a depressão pós-parto.

De olho nesses argumentos, os cientistas não demoraram a se interessar pelo assunto, que ganhou popularidade quando celebridades decidiram ingerir o órgão. A psicóloga Cynthia Coyle, da Escola de Medicina Feinberg da Universidade Northwestern, nos Estados Unidos, está entre aqueles que se debruçaram sobre os dados a respeito da placentofagia.

Ela liderou uma análise minuciosa de dez estudos acerca do tema. “Os benefícios são baseados em alegações individuais. Ao revisarmos a literatura científica, não encontramos estudos bem controlados sobre a segurança e as vantagens em seres humanos”, afirma.

Ela lembra, no entanto, que muitos trabalhos são feitos com cobaias e focam apenas no papel da placenta no controle da dor durante o trabalho de parto. “Precisamos de mais pesquisas para determinar se a placentofagia faz bem às mulheres. Nós simplesmente ainda não sabemos os benefícios nem os riscos”, admite.

Durante a revisão, Cynthia notou que as mães realmente reportam diversas vantagens – tanto é que grande parte das adeptas declara a intenção de apostar em pílulas de placenta de novo, em futuras gestações. “Eu acho que isso já é uma bela justificativa para investigarmos mais”, diz.

A pesquisadora Sharon Young, da Universidade de Nevada, nos Estados Unidos, compartilha essa missão. Em 2010, ela e seus colegas entrevistaram 180 mulheres que ingeriram a placenta e descobriram que uma das principais motivações tinha a ver com a promessa de refazer os estoques de ferro no organismo. “E sabemos que baixos níveis desse mineral estão relacionados com a fadiga”, relata.

Por causa desses depoimentos e do fato de que a placenta é mesmo um órgão cheio de ferro, recentemente ela e seus colegas resolveram realizar uma experiência com um pequeno grupo de voluntárias. Enquanto metade das participantes recebeu suplementos feitos com sua placenta desidratada, a outra parte ganhou cápsulas de bife desidratado – a carne vermelha, não é segredo para ninguém, também concentra doses caprichadas do mineral. Cabe ressaltar que nenhuma mulher sabia o que estava consumindo.

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O primeiro dado que saiu do trabalho foi o seguinte: as pílulas de placenta continham aproximadamente sete vezes mais ferro do que as de carne. Mas, apesar disso, ao compararem as taxas do mineral no sangue das mães, os pesquisadores não encontraram diferenças significativas entre os grupos. “E, mesmo em quantidades altas, a cápsula feita com o órgão só ofertou 24% da dose diária de ferro recomendada para quem está amamentando”, revela Sharon.

Nada de conclusões precipitadas

Ao contrário do que parece, os resultados não encerram a discussão, não. “Nosso estudo sugere que, em mulheres saudáveis e com ingestão adequada de ferro, como era o caso das nossas voluntárias, os suplementos de placenta podem não prover uma quantidade do mineral capaz de aumentar seus níveis no organismo”, analisa a estudiosa.

O time não checou o que acontece com mulheres com deficiência do nutriente, por exemplo. Outro aspecto que não foi investigado – e não pode ser descartado – é se hormônios presentes no órgão teriam impacto no bem-estar das defensoras da placentofagia.

Por isso, Sharon – assim como Cynthia – frisa que ainda é difícil cravar se a prática de fato proporciona algum ganho. Afinal, há pouquíssimas pesquisas em seres humanos. “O que os estudos mostram é que as mulheres que comeram a placenta ou tomaram as cápsulas citaram experiências positivas, como melhora no humor, mais disposição e maior produção de leite, entre outras”, conta Sharon.

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Quem faz coro às cientistas é a enfermeira obstetra Ana Cyntia Paulin Baraldi, do consultório Luz do Candeeiro, em Brasília, espaço no qual é possível encapsular a placenta. “É fato que não existe evidência científica suficiente para cravar que essa ingestão é benéfica. Mas as mulheres relatam que se sentem muito bem com a prática”, diz. Não à toa o número de interessadas vem subindo.

E ainda que todo esse sucesso seja obra de um efeito placebo – ou seja, a total crença na melhora acabaria resultando nos benefícios –, Ana não vê motivos para rejeitar a placentofagia. “Se as mulheres ficam satisfeitas e não há efeitos colaterais, já estão no lucro”, acredita.

Fora que, independentemente de os efeitos terem a ver com ferro, hormônios ou outras substâncias, a enfermeira crê que as adeptas da placentofagia acabam tirando proveito do ritual em si. “Elas acreditam no potencial do que vem de dentro, daquela energia que gerou um bebê”, explica.

E a segurança?

Em sua pesquisa, Sharon Young não encontrou riscos associados ao consumo da placenta. Esse é um ponto bem polêmico, inclusive. Ora, estamos falando de um órgão que também funciona como uma espécie de filtro. Sendo assim, especialistas ponderam que existe a possibilidade de ele concentrar toxinas, como mercúrio, cádmio, arsênio e chumbo.

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“Mas nós avaliamos o teor dessas quatro substâncias na placenta desidratada e todas elas estavam bem abaixo dos limites considerados potencialmente perigosos”, tranquiliza a pesquisadora da Universidade de Nevada. Ela frisa, porém, que não chegaram a procurar outros elementos nocivos, a exemplo de pesticidas.

Como é possível que o órgão também apresente bactérias e vírus – resultado de uma infecção ou outros problemas de saúde durante a gravidez –, Cynthia, da Universidade Northwestern, acredita que o consumo da placenta crua possa trazer mais riscos.

Outro ponto que merece cautela: o risco de contaminação por causa da manipulação ou preparação inapropriadas. A enfermeira Ana, de Brasília, informa que essa questão é crucial mesmo.

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Por isso, caso a mulher tenha o desejo de encapsular a placenta, precisa pedir para o pessoal do hospital colocar o órgão em um recipiente limpo e livre de outras substâncias, como formol. “Se ele for usado, a placenta não pode ser consumida”, avisa.

Depois disso, o órgão precisa ficar na geladeira. Se a ideia for guardar por mais de 48 horas, aí tem que congelar – isso é essencial para inibir a proliferação de bactérias. De acordo com Ana, a quantidade de cápsulas depende do tamanho do bebê – a placenta de uma criança de 3 quilos, por exemplo, rende 120 comprimidos.

Embora o tema ainda pareça estranho à maioria da população, a verdade é que merece ser debatido. “Os médicos e os hospitais precisam estar preparados para respeitar qualquer tipo de escolha que diga respeito ao corpo da mulher. E não só em relação à placenta”, opina a enfermeira.

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