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Saúde é pop

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Tá na internet, tá na TV, tá nos livros... tá no nosso dia a dia. O jornalista André Bernardo mostra como fenômenos culturais e sociais mexem com a saúde — e vice-versa.
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Médica brasileira é um dos ícones da luta contra a Covid-19

Uma das vozes mais ativas nestes tempos, Margareth Dalcolmo relembra o medo ao contrair o coronavírus e analisa a triste situação da pandemia em nosso país

Por André Bernardo
8 mar 2021, 11h59
foto de Margareth Dalcolmo
Margareth Dalcolmo se divide entre consultas a pacientes, pesquisas contra a Covid e análises da pandemia na imprensa.  (Foto: Peter Ilicciev/Divulgação)
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“Vocês já repararam que se fala mais de Margareth Dalcolmo do que de Neymar?” Quem fez a pergunta, na crônica Viva a Vacina!, publicada no jornal O Globo, foi o jornalista e escritor Zuenir Ventura. Se você acompanha o noticiário da Covid-19 (em sites, jornais, revistas ou pela TV), sabe muito bem de quem se trata.

Desde o início da pandemia no país, em março do ano passado, a pneumologista capixaba Margareth Maria Pretti Dalcolmo, de 66 anos, tornou-se figura marcante, quase onipresente, na mídia brasileira.

A pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), onde dá aula e atende casos graves de tuberculose, já participou de lives e debates virtuais, concedeu entrevistas a programas de rádio e TV e escreveu artigos para jornais e revistas. “Tenho trabalhado uma média de 15 horas por dia e dormido, quando possível, seis a sete horas. É o suficiente para eu descansar”, conta.

Seu envolvimento com a Covid-19 despontou quando, na volta de uma viagem a Brasília, onde prestou consultoria técnica ao então ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, ela gravou uma entrevista com o pneumologista Mauro Gomes para um site médico de São Paulo. Em apenas 24 horas, o número de visualizações ultrapassou a casa de 1,5 milhão.

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No dia seguinte, ela era convidada a participar, virtualmente, de um programa da TV Globo. De lá pra cá, não parou mais. “Muitos de nós, médicos e cientistas, passaram a ocupar um espaço importante na mídia. O reconhecimento da ciência brasileira por parte da sociedade civil foi um dos saldos positivos da epidemia”, avalia.

Nas poucas vezes em que sai de casa, Margareth tem vivenciado esse reconhecimento nas ruas. No hall do elevador, na fila do supermercado ou no balcão da farmácia, já teve sua atuação à frente das câmeras e dos microfones elogiada por incontáveis pessoas.

Houve quem chegasse a pedir autógrafo ou tirar selfie… “Já recebi todo tipo de manifestação e todas são sempre muito afetuosas e espontâneas. Jamais recebi nenhuma manifestação que não fosse de respeito, confiança e admiração”, observa a pesquisadora.

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Um ano e mais de 260 mil mortos depois, a pneumologista diz não ter se surpreendido com a longa duração da pandemia. “Por se tratar de um patógeno de alta capacidade de transmissão, era o prognóstico mais provável”, explica.

O que a surpreendeu mesmo foi o fato de o Brasil, apesar de ter dois grandes institutos de produção de imunizantes, como a Fiocruz, no Rio de Janeiro, e o Instituto Butantan, em São Paulo, ter desperdiçado a oportunidade de negociar com grandes fabricantes de vacinas, como a Pfizer e a Janssen.

“O Brasil só vai controlar a situação se vacinar muita gente e em pouco tempo. Tenho plena convicção disso. Precisamos de muita vacina para termos uma cobertura grande e rápida”, afirma. Além de não investir na produção de imunizantes, o governo brasileiro questionou a eficácia das vacinas, criticou o uso de máscaras e, ainda, propagou tratamentos sem qualquer comprovação científica. “Isso tudo confundiu a opinião pública”, lamenta.

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O momento mais difícil, relata, aconteceu em maio quando testou positivo para o vírus. Foi a própria doutora que desconfiou que estava doente depois de sentir, entre outros sintomas, um gosto desagradável na boca, dor na nuca e um profundo cansaço — na hora das refeições, mal conseguia segurar o garfo. Na manhã seguinte, ao acordar sem olfato e paladar, requisitou o exame, que confirmou o diagnóstico.

“Tenho que confessar: foi assustador. Tive muito medo”, recorda a médica, que não conseguia dormir direito esperando pela tão temida falta de ar. O temor foi tanto que, pelo sim pelo não, conversou com uma de suas irmãs sobre as providências que, caso fosse intubada e não conseguisse se recuperar, gostaria que fossem tomadas.

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Casada com o advogado e imortal da Academia Brasileira de Letras (ABL) Cândido Mendes de Almeida, de 92 anos, Margareth não teve filhos. “A recuperação foi boa. Fui muito bem cuidada pelos meus colegas”, emociona-se a doutora que, no dia 23 de janeiro, recebeu a primeira dose da vacina de Oxford/AstraZeneca e, hoje, sente apenas uma leve dormência nos dedos das mãos.

Preocupação… e esperança nas vacinas

Quando não está atendendo pacientes, em consultas presenciais ou virtuais, ou conduzindo a pesquisa de fase 3 da vacina BCG para Covid-19, Margareth gosta de ficar em casa. Nos momentos de lazer, seu hobbie favorito é ler. De artigos científicos a clássicos da literatura.

Se A Morte de Ivan Ilitch (Editora 34 – clique para comprar), do escritor russo Liev Tolstói (1828-1910), exerceu forte influência em sua opção pela medicina, A Montanha Mágica (Companhia das Letras), do alemão Thomas Mann (1875-1955), foi decisivo na hora de escolher a pneumologia. Até então, seu sonho de adolescência era ser diplomata.

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“Sempre li muito. Muito, muito mesmo. Gostava de ler A Montanha Mágica nos intervalos dos plantões”, recorda. Logo no início da pandemia, Margareth foi convidada pelo jornal O Globo a escrever uma coluna semanal, dividindo o espaço com outros três especialistas: a microbiologista Natalia Pasternak, o virologista Amilcar Tanuri e o neurocientista Roberto Lent.

Em seus textos, adora citar alguns de seus autores prediletos, como o brasileiro Carlos Drummond de Andrade (1902-1987), o franco-argelino Albert Camus (1913-1960), o português José Saramago (1922-2010) e o alemão Friedrich Nietzsche (1844-1900). “Escrever é um ato de sofrimento, eu sei. Mas é também um ato muito prazeroso. Tem sido uma experiência agradável e desafiadora”, relata.

Zuenir Ventura não é o único admirador famoso de Margareth Dalcolmo. O publicitário Washington Olivetto já declarou que “se fosse alemã ou islandesa, doutora Margareth seria ministra de Saúde”. Mas, será que, se fosse convidada, ela aceitaria? “Não tenho qualquer intenção de natureza política. Sou médica e gosto muito do que faço”, responde.

Em relação à atual situação da Covid no Brasil, admite certo ceticismo. E explica as razões: “Começamos atrasados. E estamos em um ritmo que não é o desejado. Mais do que nunca, a opinião pública tem que reivindicar seu direito de ter acesso ao maior número possível de vacinas o mais rapidamente possível”.

Margareth tampouco esconde a preocupação com negacionismos por parte da população. “O que vimos no Carnaval me entristeceu muito. De um lado, pessoas se aglomerando de maneira irresponsável. De outro, pessoas que nunca saíram de casa adoecendo. Tenho confiança de que, com a produção maciça de vacinas, poderemos alcançar um resultado mais promissor”, acredita.

Quanto à pergunta que abre esse texto, é o próprio Zuenir quem se encarrega de respondê-la: “Ainda bem. Está com a bola toda, principalmente depois que foi eleita a ‘mulher do ano’ por seu trabalho. Na pessoa dessa admirável cientista, a homenagem aos profissionais da saúde, os heróis e heroínas dessa batalha”.

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