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Medicina

Coronavírus: o que esperar da vacina?

Investigamos em que pé estão as candidatas a conter a Covid-19 e como podem fazer a diferença no combate a esta e até às próximas epidemias

por Chloé Pinheiro (texto) e Otávio Silveira e Letícia Raposo (arte) Atualizado em 19 out 2020, 10h19 - Publicado em 16 out 2020 14h39

A busca do século

Em 1789, o médico britânico Edward Jenner notou que ordenhadores de vacas não contraíam varíola caso tivessem sido infectados pela versão animal da doença, que circulava entre os rebanhos. Sete anos de observações depois, em 1796, realizou um experimento no mínimo arrojado. Injetou o vírus bovino em um menino saudável e, em menos de dois meses, inoculou no mesmo garoto o líquido retirado de uma pústula da doença humana. Eureca! A criança não caiu de cama.

Dois anos se passaram até que o imunizante embrionário de Jenner fosse reconhecido pelos pares, um tempo bem mais curto do que virou praxe depois, quando a metodologia moderna entrou em jogo exigindo pesquisas por fases que englobam de culturas de células e cobaias em laboratórios a testes em milhares de seres humanos. A ousada invenção de Jenner abriu caminho à erradicação da varíola, mal que matou no mínimo 300 milhões de pessoas até ser eliminado em 1980, e ao controle de inúmeras outras moléstias. Ele é considerado o pai da vacina — o sonho de paz e consumo de qualquer cidadão na era da Covid-19.

Mas em 2020 o tempo virou um conceito ainda mais relativo. Os cientistas estão tentando fazer o milagre de obter em meses algo que leva anos ou décadas. Infectologistas, virologistas, epidemiologistas e companhia sabem que só um imunizante seguro e eficaz pode vencer de vez esse vírus que já matou mais de 1 milhão de pessoas pelo globo. Paradoxalmente, estamos distantes do século de Jenner, mas um tanto quanto próximos da janela de tempo da sua “rápida” experiência contra a varíola.

A diferença crucial é que há um monte de Jenners espalhados pelo mundo, inclusive no Brasil, pensando e testando formulações para nos livrar da nova praga. Apesar das disputas políticas e econômicas e dos surtos de desinformação que se intrometem na história, o mundo se uniu por essa causa urgente e prioritária.

“Houve uma coalizão de diversos países para levantar recursos rapidamente e financiar grupos de pesquisa”, conta a infectologista Cristiana Toscano, professora da Universidade Federal de Goiás e única brasileira no grupo da Organização Mundial da Saúde (OMS) que acompanha o desenvolvimento de quase 200 candidatas a vacina. “Os centros que saíram na frente já estavam trabalhando em produtos contra outros vírus que são parentes do Sars-CoV-2. Então foi mais fácil adaptar as plataformas”, contextualiza.

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Além de ciência de ponta, essa busca envolve rios de dinheiro. Alguns países já investiram bilhões em doses antecipadas e a OMS pede ao menos 18 bilhões de dólares para garantir que elas cheguem às nações que não têm tanta grana para desembolsar. Processos regulatórios também estão sendo agilizados, mas a corrida tem limites e não pode pular etapas.

Bilhões por um imunizante:

  • Nos Estados Unidos, o governou anunciou mais de 10 bilhões de dólares para encontrar uma vacina contra a Covid-19.
  • A Operação Covax, da OMS, pede 18 bilhões para distribuir o imunizante igualitariamente e contemplar 2 bilhões de doses até o fim de 2021.
  • No Brasil, cerca de 4,5 bilhões de reais anunciados pelo governo: 2,5 bilhões para a OMS; 1,9 bilhão na vacina de Oxford; 145 milhões na versão da Sinovac; e 7,8 milhões na produção de vacinas nacionais.
  • Projeções calculam que o ideal seria assegurar 110 bilhões de dólares para viabilizar a produção e a distribuição mundial das vacinas mais avançadas. Isso geraria ganhos estimados em quase 2 trilhões de dólares pela proteção às populações.

As vacinas mais avançadas

As vacinas na dianteira se encontram na chamada fase 3, que coloca à prova sua resposta imune monitorando nos voluntários a produção de anticorpos e a reação de células de defesa. “Só com essa fase bem feita, o que exige acompanhamento em milhares de pessoas, podemos ver inclusive os eventos adversos”, esclarece o infectologista Julio Croda, da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. É por isso que devemos ser otimistas sem deixar de ponderar os resultados preliminares divulgados por aí.

Mesmo sem ter dados finais em mãos, governos já anunciam acordos de transferência tecnológica com as farmacêuticas e esboçam projeções encorajadoras. Vladimir Putin, presidente da Rússia, assegurou vacinação em massa a partir de outubro. O americano Donald Trump declarou ter um produto aprovado no mesmo mês. O governador de São Paulo, João Doria, disse que a população do estado poderia receber o imunizante chinês avaliado no Instituto Butantan em dezembro.

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São prazos difíceis de cumprir se o rito científico for respeitado. “Supondo que um fabricante anuncie resultados positivos no fim do ano, ainda teremos que passar pela ampliação da escala de produção, controle de qualidade lote a lote, aguardar o registro e resolver outras questões operacionais”, afirma Cristiana. “Estamos trabalhando com a expectativa cautelosa mas animadora de ter uma vacina pronta em março de 2021, com todas as etapas sendo conduzidas com rigor”, diz a consultora da OMS.

“Imagine mover investimentos dessa ordem para, no fim das contas, descobrir que a vacina não protege ou pode ser perigosa”, questiona Croda. O que preocupa os especialistas é justamente a pressão política em torno de quando teremos acesso às picadas. Feito esse recuo às origens e às regras básicas da ciência das vacinas, podemos vislumbrar os bastidores das candidatas a derrotar o coronavírus e o que estará em jogo no futuro.

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Os imunizantes promissores

Como é na conclusão da fase 3 que tudo se revela, é difícil falar em uma vacina favorita. “Nas fases 1 e 2, os modelos geraram algum tipo de resposta imune, mas os parâmetros são diferentes. Não dá para comparar com a última etapa”, diz a bióloga Natalia Pasternak, presidente do Instituto Questão de Ciência (IQC). O momento agora é o teste em vida real, quando o imunizante é aplicado em gente do mundo inteiro e são esmiuçados seus efeitos protetores e a segurança das doses.

Nos estudos, uma parcela recebe a vacina de verdade e outra o placebo, doses sem o princípio ativo. Para conseguir resultados mais rápidos, o recrutamento é feito em massa, de preferência em países onde o coronavírus esteve ou está em patamares de contágio elevados (caso do Brasil).

Duas das vacinas mais avançadas, a britânica de Oxford produzida pela AstraZeneca e a chinesa da Sinovac, ambas testadas por aqui, largaram na frente na fase 3, embora tenham mecanismos de ação distintos. O modelo de Oxford utiliza um vetor viral — no caso, um adenovírus que causa resfriado em chimpanzés modificado para conter em sua estrutura uma proteína do Sars-CoV-2 crucial à invasão às células humanas.

“A vantagem dessa plataforma é que ela pode ser adaptada rapidamente se surgir uma mutação no vírus ou mesmo para um novo agente que começar a circular”, conta a infectologista Sue Ann Clemens, que coordena as pesquisas com o produto no Brasil pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Já a chinesa CoronaVac, investigada pelo Butantan, se baseia em uma tecnologia mais clássica, usando o vírus inativado.

Próximas a essas duas na corrida cronológica estão as vacinas dos laboratórios Pfizer e Moderna. Elas propõem uma técnica inédita: inocular somente um pedaço do material genético do vírus, o RNA, para despertar reação da nossa imunidade. “Não existe nenhum componente biológico nesse caso. Construímos essa molécula de forma sintética”, explica Márjori Dulcine, diretora médica da Pfizer no Brasil.

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Embora sejam inovadores, os imunizantes à base de RNA/DNA nunca foram testados em humanos em larga escala. Mesmo o modelo de vetor viral só foi empregado em massa uma única vez, em uma nova vacina contra o ebola. Criada em tempo recorde (seis anos) pela Janssen, divisão da Johnson&Johnson, ela demonstrou segurança e eficácia e foi aplicada em 100 mil pessoas.

Os resultados favoráveis fizeram a farmacêutica aproveitar a mesma plataforma com um tipo de adenovírus para criar uma versão contra a Covid-19, analisada em milhares de voluntários. É a prova de conceito final em meio a uma pandemia.

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De vírus inativo a RNA

Epidemias têm o efeito colateral de acelerar o progresso científico. Foi assim com a gripe espanhola no início do século 20, com a aids da década de 1980 em diante, e com o coronavírus não é diferente. “A pressão atual agilizou o desenvolvimento de tecnologias que havia anos estudávamos no laboratório”, diz Luis Carlos Ferreira, diretor do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (USP). E elas podem ser úteis hoje e numa futura pandemia.

Uma das principais vantagens das novas técnicas vacinais é não precisar mais manipular o patógeno vivo. “É perigoso trabalhar com um vírus. Isso exige um grau de segurança que nem todos os laboratórios possuem”, afirma o virologista Flávio Guimarães, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que trabalha em uma versão própria de imunizante para Covid-19 — no caso, combinando partes do Sars-CoV-2 com o vírus da gripe.

Em setembro, outras vacinas entraram na aguardada fase 3, incluindo um exemplar de uma quarta tecnologia, batizada de subunidade. Quem chega primeiro com ela é a empresa americana Novavax: o produto utiliza apenas nanopartículas das proteínas em forma de espinho que recobrem o coronavírus. “A vantagem de usar proteínas é que elas já são aprovadas na imunização de outras doenças virais, como o HPV. Isso pode facilitar seu registro”, destaca Natalia.

A categoria abrange outros modelos estudados por pesquisadores brasileiros, como vacinas de peptídeos (pedacinhos de proteínas) e as VLPs (do inglês virus like particle), baseadas na confecção de uma molécula semelhante a um vírus mas contendo só algumas partículas dele. “É como se fôssemos tirando o maior número de partes possíveis do patógeno e deixássemos só as que mais interessam para a geração de anticorpos”, descreve Ferreira.

Todas essas estratégias — adenovírus modificados, uso de RNA e outras pecinhas do agente infeccioso — parecem ostentar um perfil de segurança mais elevado porque não há risco de um vírus nocivo a humanos se multiplicar e causar estragos. Em contrapartida, ainda restam dúvidas sobre o seu potencial de proteção contra a Covid-19. Produzir anticorpos ou estimular células de memória contra um vírus não significa automaticamente que o indivíduo nunca vai contrair a doença.

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E não é só essa resposta que os cientistas estão caçando (na bendita fase 3!). Ainda não está 100% claro como se comporta a imunidade natural ao coronavírus, o que pode ter reflexos no desenvolvimento e funcionamento dos imunizantes. Pegou uma vez, não pega nunca mais? Como e quanto dura essa resposta? Como comparam os experts, estamos trocando o pneu com o carro andando.

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(Ilustração: Otávio Silveira/SAÚDE é Vital)
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(Ilustração: Otávio Silveira/SAÚDE é Vital)
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Ciência e concorrência na Covid-19

Hoje já se sabe que, após o contato com o Sars-CoV-2, nosso organismo produz anticorpos para neutralizar novas invasões. Mas não é só. “Vários estudos mostram que, principalmente em casos leves ou assintomáticos, há uma resposta celular muito grande, isto é, há uma atuação de linfócitos T, células que também induzem memória para proteção”, relata a presidente do IQC. Duas categorias desses guardas são convocadas.

“Temos o linfócito T CD4, que serve de maestro e recruta outras células para combater o patógeno, e o CD8, que reconhece e mata células infectadas pelo vírus”, explica a imunologista Karina Bortoluci, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunologia. Alguns dos estudos com vacinas na fase 2 até mediram a carga de linfócitos T no sangue, mas os anticorpos em si são o padrão mais utilizado nas análises.

Fato é que o corpo guarda alguma memória do encontro com o coronavírus real. Existem pouquíssimos relatos de reinfecções confirmadas num universo de milhões de contaminados. “O que ainda precisamos saber é por quanto tempo as pessoas ficam protegidas da infecção depois do primeiro contato”, diz o imunologista Jorge Kalil, do Instituto do Coração (InCor), em São Paulo, que, além de desenvolver uma vacina contra o Sars-CoV-2, vem averiguando o sangue de pessoas recuperadas para compreender o comportamento do nosso sistema imune nesse contexto.

Essas e outras pesquisas ajudarão a mostrar inclusive se será preciso reaplicar a vacina contra Covid-19 ou tomar reforços de tempos em tempos, como acontece com a gripe anualmente. Cravar a necessidade de revacinação é algo que só poderá ser alcançado no fim de 2021 ou em 2022, segundo os especialistas. Qualquer dado antes disso deve ser tratado com cautela e transparência.

Por falar nessa palavrinha, alguns fabricantes anunciaram a fase final de estudos sem que os resultados de fase 2 estivessem disponíveis para escrutínio público. Rússia e China chegaram a liberar a vacinação em alguns grupos antes mesmo que os testes fossem finalizados. A comunidade científica contestou, e nove farmacêuticas multinacionais se comprometeram a seguir todos os protocolos e só pedir autorização para registro às autoridades quando a segurança e a eficácia estiverem garantidas.

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Essa mobilização também pressupõe divulgar com responsabilidade qualquer dado parcial. “É essencial que a população tenha confiança no processo de desenvolvimento e testagem, e isso depende da percepção de que os fabricantes não estão guardando informações”, afirma a médica Elizabeth Loder, diretora de pesquisa do prestigiado periódico British Medical Journal.

A pressão por transparência levou três farmacêuticas (AstraZeneca, Pfizer e Moderna) a abrirem seus protocolos. Neles, está prevista a chamada análise interina: ao atingir um número predeterminado de infectados, os pesquisadores podem espiar os dados até então sigilosos e verificar em que grupo estão os indivíduos contaminados.

A ideia é que estejam todos (ou quase todos) no grupo placebo. Se os números de proteção forem satisfatórios, já dá para solicitar o registro às autoridades sanitárias antes do término do estudo. “Mas esse processo deve estar previsto no protocolo antes de as pesquisas começarem”, ressalta Márjori. Geralmente, tais informações são confidenciais durante todo o percurso de testes e análises, muito em nome dos interesses estratégicos e mercadológicos das companhias. Agora a história é outra.

“Estamos falando de empresas que se destacam nas bolsas de valores com a especulação de que possuem uma vacina muito boa, mesmo se na verdade ela não for tudo isso”, pondera o epidemiologista Paulo Lotufo, da Faculdade de Medicina da USP. A concorrência é positiva porque aumenta o leque de possíveis opções à disposição da população — e é gente à beça para vacinar!

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Mas é preciso estabelecer com clareza os critérios de sucesso e de comparação entre uma e outra fórmula. Um deles é a eficácia. Espera-se que as vacinas ofereçam uma taxa de pelo menos 50%. Ou seja, o número de infectados tem de ser no mínimo 50% menor entre aqueles que tomaram a vacina na comparação com quem tomou placebo. Não soa espetacular? Saiba que é suficiente para reduzir significativamente a circulação do coronavírus.

Outro ponto de atenção são as reações adversas. O estudo da vacina de Oxford foi interrompido duas vezes para avaliar efeitos colaterais graves em voluntários, mas se descobriu, segundo o fabricante, que eles não tinham nada a ver com o imunizante. É um procedimento normal. Se acontece algo estranho, suspende-se tudo para investigar se há relação ou foi obra do acaso.

Até porque nenhuma vacina é 100% imune a efeitos colaterais. Existem reações mais comuns e esperadas, como dor local e febre, e outras sérias, porém raras, que exigem internação. Natalia dá um exemplo hipotético: “Uma ocorrência ruim em 1 milhão de imunizados seria algo aceitável, porque, se não houvesse aquela vacina, morreriam 100, 200 pessoas”. Ainda não temos um cálculo exato para a Covid-19.

“No estudo de fase 3, reconhecemos eventos adversos não tão incomuns, mas aqueles mais raros só são identificados após vacinar milhões de pessoas. Daí a importância de um sistema de vigilância constante, como temos no Brasil”, diz o epidemiologista Eliseu Alves Waldman, também da USP.

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(Ilustração: Otávio Silveira/SAÚDE é Vital)
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A desinformação que assombra as vacinas

Faremos agora um exercício de futurologia. Se uma ou mais vacinas se provarem seguras e obtiverem taxas de eficácia na casa dos 50%, podemos demorar um pouco mais para atingir a tal imunidade de rebanho (ou coletiva), quando um número suficiente de pessoas está imunizada e o agente infeccioso vai deixando de circular. Se essa taxa for de 60 ou 70%, as coisas melhoram bem (e mais rápido!).

Só que as doses necessárias a milhões de cidadãos não vão ficar prontas de uma vez. Por isso, uso de máscara e distanciamento social seguirão recomendados por um bom tempo. A aprovação da primeira vacina no país tampouco significa que a corrida acabou e outras não virão. É de imaginar um cenário de inclusões e substituições, inclusive porque as fórmulas estarão em contínuo aperfeiçoamento.

Para Isabela Ballalai, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), a primeira geração de imunizantes deve começar a ser aplicada em solo nacional no segundo semestre de 2021. Isso se interesses políticos não prevalecerem. “Provavelmente, a vacinação vai começar com grupos prioritários, como os maiores de 60 anos e portadores de doenças crônicas, mas ainda precisamos ver mais dados sobre os efeitos nesse público”, explica a médica.

O Ministério da Saúde já discute o assunto e encomendou 300 milhões de seringas e agulhas. Um ponto a tranquilizar é que o Brasil tem expertise na produção e distribuição de insumos para vacinas. Mas a demanda extra contra a Covid-19 vai ser um desafio e tanto. Num horizonte em que nem todos conseguirão receber sua dose no prazo adequado, uma alternativa (ao menos parcial) pode vir da vacina BCG, usada contra a tuberculose. Pesquisadores da Fiocruz e de outros centros especulam que ela ofereça uma proteção cruzada contra o coronavírus e realizam estudos para confirmar esse efeito.

O que irá facilitar o acesso daqui a alguns meses são os acordos já firmados de transferência de tecnologia para envasar e fabricar a vacina da Covid-19 no país. A Fiocruz garantiu acesso a 100 milhões de doses do modelo de Oxford, caso aprovado, para processamento final (envase, controle de qualidade…). E poderá começar a produzir tudo até a segunda metade de 2021.

O Butantan tem contrato com a Coronavac e um parque fabril que sabe trabalhar com vírus inativados. Em paralelo, outras quatro candidatas estrangeiras já receberam autorização para conduzir estudos de fase 3 no Brasil, envolvendo 30 mil voluntários.

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E mais duas vêm aí. Primeiro, a Sputnik V, vacina russa que combina dois adenovírus e pode ser armazenada em pó. Jorge Callado, diretor-presidente do Instituto de Tecnologia do Paraná (Tecpar), que firmou parceria com a fabricante, afirma que os testes no estado devem começar este ano. Depois, chega a Covaxx, uma vacina americana de subunidades, cujos testes nacionais estão a cargo da Dasa.

Pensando na produção local, é pouco provável que as fórmulas mais modernas, como as baseadas em RNA, possam ser totalmente fabricadas nestas terras. Elas dependem de centros de desenvolvimento com temperaturas muito baixas, algo inexistente no Brasil. “Para contornar isso, criamos uma tecnologia que permite à nossa vacina passar até dez dias em um freezer normal”, revela a diretora da Pfizer. A empresa declarou, assim como a Janssen, que pretende seguir fabricando o princípio ativo em suas próprias unidades e vendendo às demais nações.

Mas há quem defenda que o ideal seria ter uma vacina 100% brasileira. “O investimento nas vacinas nacionais foi ínfimo comparado ao de outros países”, critica Ferreira. O que preocupa o virologista e outros especialistas é que a competição global pelos imunizantes será ferrenha. Uma análise do Deutsche Bank mostra que, enquanto Estados Unidos e Inglaterra reservaram mais de cinco doses per capita, o Brasil fica abaixo de uma por cidadão.

A espera pela vacina contra a Covid-19 ainda grassa num cenário em que nosso país, outrora referência em vacinação, amarga os piores índices de cobertura da história. Sabemos que os imunizantes são vítimas do próprio sucesso: quando uma doença míngua, ela não assusta e não cobra atitudes como antes.

Mas fake news e boatos antes restritos a grupos radicais começaram a se alastrar, com direito a gente questionando a obrigatoriedade da vacinação, um pacto coletivo pela saúde de todos. “Com a intensa polarização política, certas redes aproveitam as vacinas para alimentar teorias da conspiração, e estamos a um passo de ver isso tomar outra proporção”, alerta João Henrique Rafael Júnior, um dos idealizadores da União Pró-Vacina, que analisa a desinformação sobre o tema.

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E mesmo o imunizante contra a Covid-19, que nem chegou, já sofre com rejeição e preconceito por aí. “Tem gente se referindo à vacina inglesa como algo bom e de prestígio, enquanto a chinesa seria ‘xing-ling’, de qualidade inferior”, nota o físico Leandro Tessler, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), que mapeia fake news sobre Covid-19 no WhatsApp.

Sim, até as vacinas podem ser reféns de rivalidades, questões econômicas e jogo político. Mas devemos nos conscientizar e valorizá-las pelo que elas são — sempre à luz da ciência. Do contrário, não só a esperança contra o coronavírus pode desandar como outras doenças infecciosas voltarão à cena. Eis uma viagem no tempo que ninguém quer fazer.

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