Black Friday: Assine a partir de 1,49/semana

Relações Simplificadas

Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Como anda sua saúde mental? O psicólogo e psicanalista Francisco Nogueira, membro efetivo do Departamento Formação em Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae e cocriador da consultoria Relações Simplificadas, reflete sobre as questões da mente humana para lidarmos melhor com os desafios do mundo de hoje
Continua após publicidade

Seríamos vítimas da Matrix? As redes sociais e a nossa saúde mental

Uma profunda reflexão sobre a dependência e a coevolução das novas gerações frente às mídias sociais e à inteligência artificial

Por Francisco Nogueira
14 jun 2023, 18h16
  • Seguir materia Seguindo materia
  • A queda de qualidade da saúde mental entre as gerações mais jovens, apontada no Relatório Mundial sobre o Estado de Saúde Mental deste ano, pode ser interpretada como um indício dos efeitos da entrada massiva da tecnologia digital em nossas vidas.

    Segundo o documento, esse declínio tem início por volta do ano de 2010, época em que os smartphones eram popularizados e as redes sociais iniciavam um crescimento vertiginoso.

    Ainda que seja muito complicado – e talvez controverso – produzir uma comprovação científica que evidencie a correlação entre a popularização das redes sociais e o aumento do sofrimento psíquico, as observações clínicas que apontam nesse sentido são abundantes e permitem que essa correlação seja presumida.

    No divã, são cada vez mais frequentes as queixas em relação à autoimagem, às dificuldades de socialização, ou direcionadas à infinita impotência das idealizações (de corpo, de consumo, de estilo de vida…) vendidas nas redes sociais, frente aos acachapantes impactos de uma realidade cada vez mais dura e precária para muita gente.

    + Leia também: Redes sociais impulsionam busca por cirurgia plástica

    E não para por aí. Além de sofrimentos como esses, é possível observar outro efeito grave, sutil e profundamente nocivo: o esfacelamento do domínio da linguagem.

    Continua após a publicidade

    Enquanto as redes sociais se especializam na comunicação imagética, através do compartilhamento massivo de fotos e vídeos – cada vez mais curtos, diga-se de passagem –, é possível observar o aumento da dificuldade de expressão verbal e nomeação dos fenômenos do nosso mundo interno, sobretudo entre jovens.

    A capacidade de nomear o que acontece em nossa vida emocional é uma habilidade na busca por sentido naquilo que acontece em nossa vida.

    Com o empobrecimento da linguagem e da nossa capacidade de nomeação do que se passa ao nosso redor e em nosso mundo interno, perdemos ferramentas poderosas que nos auxiliam no árduo trabalho de compreensão da realidade, assim como de elaboração e ressignificação dos nossos afetos e sofrimentos.

    Matrix, o clássico do cinema lançado no fim da década de 1990, retrata um universo em que não éramos nós, seres humanos, que utilizávamos as máquinas para facilitar a nossa vida, mas o contrário, eram elas que faziam de nós objetos de uso para o desenvolvimento de um mundo onde apenas elas prosperavam.

    Continua após a publicidade

    A trama propõe um domínio das máquinas e o aprisionamento das nossas mentes em um simulacro da realidade. Hoje, com a popularização das redes sociais e o surgimento de uma nova geração de inteligência artificial, começam a pulular os temores de que as fronteiras das nossas mentes estariam realmente em risco.

    + LEIA TAMBÉM: Outras colunas do psicólogo Francisco Nogueira

    Entre a realidade e a ficção

    Talvez reine um medo que a ficção científica dos filmes e livros tenha plantado em nosso imaginário. Ou talvez o avanço desses dispositivos e sistemas tenha evidenciado um antigo alerta freudiano: o de que o entendimento do ser humano está sempre atrasado, acontece sempre a posteriori.

    Seguindo tal raciocínio, o esquecimento do alerta de Freud pode nos ter levado a negligenciar o devido cuidado com os rumos que damos no uso e à aplicação das novas tecnologias.

    Será que haveria a mesma virulência das fake news sem as redes sociais como ocorre hoje? Será que haveria tanto fomento aos ataques às escolas se os veículos dos discursos de ódio fossem chamados à responsabilização? Será que as vozes do nazifascismo alcançariam tantos ecos nos empoeirados porões das mentes miúdas dos ressentidos sem a imoralidade dos grupos de mensagens por aplicativo?

    Continua após a publicidade

    Precisamos assumir o protagonismo no debate sobre como queremos que as redes sociais e as inteligências artificiais sejam construídas. Precisamos assumir que criamos um problema quando permitimos que as empresas por trás das redes sociais operem da forma que é exclusivamente melhor para elas.

    Não podemos permitir que o debate sobre o desenvolvimento das tecnologias desconsidere os impactos sobre as novas subjetividades, sobretudo quando já temos o entendimento de que, até aqui, o mundo digital tem contribuído ativamente no surgimento de uma nova humanidade, mais vulnerável e psicologicamente mais sofrida.

    Não precisamos seguir nesse rumo. Ao contrário, podemos deixar de lado o terror da Matrix e utilizar uma outra metáfora para pensar sobre o assunto. Uma metáfora onde a tecnologia é bem-vinda, e sempre será: a dos líquens.

    + LEIA TAMBÉM: O debate em torno do avanço da inteligência artificial

    Como esses organismos compostos formados de algas e bactérias, a humanidade e as máquinas já são duas espécies distintas que se juntaram e se adaptaram para sobreviver.

    Continua após a publicidade

    É importante percebermos que as máquinas já utilizam, há tempos, os seres humanos para a sua evolução. Não que estejam vivas, ou que tenham se tornado conscientes do processo. Longe disso. Nós é que estamos inconscientes demais.

    E, quase que sem nos darmos conta, já estamos servindo de apoio para o desenvolvimento das máquinas e algoritmos. Eles evoluem nas nossas costas muito mais por tudo o que tem sido negligenciado, por tudo aquilo que fica no campo do não dito, que fica inconsciente em nossa sanha de progresso a todo custo.

    Mas não temos motivos para crer que os robôs nos substituirão em uma disputa pela dominação global. Há uma mutualidade aí: as máquinas dependem de nós para a sua evolução, e nós dependemos delas para a nossa sobrevivência. O que está em jogo é como cuidaremos dos efeitos dessa nova espécie que surge a partir da união de duas entidades distintas.

    Considerando que as tecnologias são capazes de moldar a nossa forma de enxergar o mundo e sentir a vida, esse debate é crítico. E é muito mais profundo, e vai muito além da questão da censura ou do cerceamento da liberdade de expressão.

    Continua após a publicidade

    O que está em jogo são as escolhas daquilo que queremos fazer da tarefa histórica que envolve o desenvolvimento das subjetividades do futuro, ou ainda, da nossa humanidade futura. Sob essa ótica, ampliar e aprofundar esses temas é assumir a responsabilidade ética de cuidar das novas tecnologias da mesma forma que deveríamos cuidar das novas gerações.

    Compartilhe essa matéria via:
    Publicidade

    Publicidade

    Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

    Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

    Black Friday

    A melhor notícia da Black Friday

    BLACK
    FRIDAY
    Digital Completo
    Digital Completo

    Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

    Apenas 5,99/mês*

    ou
    BLACK
    FRIDAY

    MELHOR
    OFERTA

    Impressa + Digital
    Impressa + Digital

    Receba Veja Saúde impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

    a partir de 10,99/mês

    ou

    *Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
    *Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

    PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
    Fechar

    Não vá embora sem ler essa matéria!
    Assista um anúncio e leia grátis
    CLIQUE AQUI.