A fome é instintiva, mas o modo pelo qual nos relacionamos com a comida não é. O comportamento alimentar é aprendido ao longo da vida e fatores sociais, motivacionais, ambientais e familiares, além das condições de desenvolvimento da própria criança, determinam sua construção.
A partir dos 6 meses de vida, o bebê que só recebia leite materno (e/ou fórmula infantil) começa a ser inserido em sua cultura alimentar, numa jornada de muitas descobertas. A partir dos 12 meses, ele ainda deve receber leite materno, mas os alimentos sólidos ficam cada vez mais relevantes no aporte de energia e de nutrientes.
Mas é por volta dos 2 anos de idade que a criança passa a se expressar mais em relação a suas escolhas. Nessa fase, também há um decréscimo das necessidades nutricionais e, em geral, isso vem acompanhado da diminuição do apetite e do volume consumido. Nessa fase, e até os 5 anos de idade, as queixas relacionadas à alimentação são mais frequentes.
Muitos pais notam que as crianças de 2 a 5 anos têm, sob vários aspectos, algumas predileções. Nesse contexto, podem até achar graça se o filho só quer usar o tênis amarelo, mas, se ele só aceitar comer arroz, feijão e carne, é provável que surja um incômodo.
Pensando num processo que deve ser marcado por experiências agradáveis, vamos elencar aqui dez dicas que podem ser úteis na ampliação do repertório alimentar dos pequenos.
1. Se o comportamento alimentar é aprendido e a família é a grande referência, podemos iniciar esse cuidado revendo as escolhas alimentares de cada membro da casa, para que todos possam ser um bom exemplo.
2. É importante comer junto com a criança. Fazer refeições em família é um hábito que tende a aumentar a exposição a frutas, legumes e verduras, além de favorecer uma relação amigável com a comida.
3. Mesmo se a criança recusar diversos alimentos, vale manter a oferta de uma dieta variada, num clima agradável, sem forçar, ameaçar ou associar o ato de comer a qualquer evento negativo.
4. Também recomendo evitar negociar e premiar. Melhor do que isso é envolver a criança em alguma etapa do processo, da seleção dos alimentos ao preparo — é algo estimulante e que sedimenta boas memórias.
5. Que tal exercitar a persistência, a paciência e a criatividade? Como todos os órgãos do sentido são importantes nas experiências alimentares, podemos interferir no aspecto, na textura e no gosto da comida ao modificar as formas de preparo, a apresentação dos pratos e as combinações dos ingredientes.
6. Para despertar o interesse, é legal planejar um menu que garanta a inclusão de, ao menos, um alimento de boa aceitação, além dos outros três ou quatro que devem compor o prato.
7. Os pequenos também podem palpitar no planejamento do cardápio e na lista de compras, escolhendo os alimentos que gostariam de experimentar. Compartilhar ideias faz com que se sintam parte do processo.
8. A manutenção de uma rotina bem estabelecida favorece a percepção dos sinais de fome e saciedade. Se houver beliscos nos intervalos das refeições, o apetite pode ser prejudicado na refeição seguinte.
9. É interessante avaliar, junto com o pediatra ou com o nutricionista, como está a adequação da dieta de uma maneira geral. Algumas crianças maiorzinhas que mantêm uma alimentação essencialmente láctea terão grande parte do consumo de energia e de nutrientes proveniente do leite e, com isso, a comida sólida perde espaço.
10. Em qualquer circunstância, evite telas na hora da refeição. Ao ligar um dispositivo eletrônico, a distração acaba sendo um artifício para comer mais, mas não soluciona o problema — ao contrário, tende a intensificá-lo. Para o ser humano, comer é um ato social e é necessário partilhar a comida e o momento para o desenvolvimento da autonomia.
Não podemos deixar de lembrar que é fundamental acompanhar o crescimento e o desenvolvimento da criança. Se as refeições se tornarem momentos de tensão, seja por recusa alimentar ou por seletividade, cabe a avaliação de um profissional de saúde.