Por que o Alzheimer é um problema de todos nós
Em estreia como colunista, médico examina um dos temas mais preocupantes de nossa era: a ascensão da doença de Alzheimer

Você certamente conhece alguém que foi diagnosticado com demência ou com Alzheimer. Menciono isso sem saber exatamente de onde você nos lê, mas levando em consideração que está no Brasil. A ciência nos mostra que um em cada três idosos acima de 85 anos apresenta esse tipo de colapso cerebral.
Ou seja, na realidade que se impõe estamos basicamente falando de três cenários: 1) ter a doença; 2) cuidar de alguém com a doença; 3) conhecer alguém com a doença. Mas por que tem tanta gente sofrendo com a demência hoje? Deixe-me contar uma história.
Em 1906, o médico alemão Alois Alzheimer identificou uma paciente com demência e algumas alterações no cérebro – cientificamente falando, placas amiloides e emaranhados de proteína tau que se grudam e destroem neurônios.
Mais de cem anos depois, em 2018, para ser preciso, a doença que leva o nome do primeiro médico a investigar a condição ainda era uma enfermidade eminentemente clínica. Isso significa que, ao avaliar um paciente com perda de memória progressiva, entre outros sintomas, tínhamos primeiro que buscar outras causas para o quadro. Distúrbio de tireoide? Vitamina B12 baixa? Se nenhuma hipótese se confirmasse como causa clara, culpávamos o Alzheimer.
Mas, nos últimos anos, começamos a falar com mais propriedade, embasados em estudos, de alterações cerebrais que ocorrem silenciosa e consistentemente muito tempo antes de a demência se manifestar – coisa de 20 a 30 anos antes! Aquelas placas que se acumulam no cérebro levam a um complexo processo de inflamação e morte neuronal, culminando em esquecimento, desorientação etc.
Daí eu pergunto: se a paciente do Dr. Alzheimer, de 1906, tivesse sido diagnosticada em 2025, o que seria diferente? Quase nada. Exceto pela data. Já explico melhor.
+ LEIA TAMBÉM: “O Alzheimer também afeta o cérebro do cuidador”, diz autora
Um mergulho no Alzheimer
O Alzheimer é a maior causa de demência no planeta. Não é a única, mas corresponde de 60 a 80% dos casos. Finalmente, graças aos avanços das pesquisas, agora sabemos um pouco mais do que acontece no cérebro no percurso do Alzheimer.
Não apenas sabemos, como também começamos a desenvolver medicações mais efetivas contra essa doença. Chamados de medicamentos anti-amiloide, esses tratamentos estão sendo comercializados em diversos países e miram aquelas placas que se aglutinam na massa cinzenta.
No Brasil, essa história é bem recente. O primeiro remédio da classe foi aprovado no fim de abril deste ano. Foi um sopro de esperança, mas devo ponderar que a medicação se encontra bem longe do ideal. Na verdade, como médicos e cientistas, nos frustramos um tanto, porque imaginávamos um impacto clínico muito maior.
O fato é que os estudos apresentaram resultados positivos, mas com várias ressalvas – incluindo os efeitos colaterais. A discussão dá pano para manga. A minha visão pessoal? É o que temos por enquanto.
+Leia também: Novos remédios para Alzheimer trazem avanços, mas têm limitações
Assim como tivemos medicamentos iniciais para câncer de mama, esclerose múltipla e leucemia com uma série de reações adversas, a história mostra que eles evoluíram, melhorando e salvando pacientes. Hoje, diante da nova droga anti-amiloide disponível, devemos pesar na balança: quem se beneficia? Quais os riscos envolvidos? Que perfil de paciente tira proveito? Estamos atrás das respostas.
Nesta nova coluna de VEJA SAÚDE, quero compartilhar e debater com você descobertas, avanços e reflexões sobre Alzheimer, demência e saúde cerebral. Visões ora otimistas, ora realistas. Questões consensuais e polêmicas… O objetivo é um só: informar com as melhores evidências disponíveis. Da ciência para a sociedade. Você é meu convidado.