Pesquisa comprova: vape vicia mais do que cigarro convencional
Em cinco anos, número de usuários de cigarro eletrônico cresceu 600% no país. Pesquisa revela quem são eles e qual o nível de dependência

Mais dependência de nicotina na comparação com quem faz uso do cigarro convencional. Esta é uma das conclusões da pesquisa Dependência de Nicotina em um Mercado Proibido: Evidências de Biomarcadores de Usuários de Cigarros Eletrônicos em São Paulo, Brasil.
Apesar de a comercialização dos vapes ser proibida no país desde 2009, o número de adeptos está notoriamente aumentando, principalmente entre os jovens. De acordo com pesquisa Ipec (Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica), o número de fumantes de cigarros eletrônicos cresceu 600% entre 2018 e 2023 no país.
Daí a necessidade de um estudo para traçar o perfil deste público.
Metodologia e perfil dos usuários de vapes no estudo
O trabalho foi realizado pela equipe do Instituto do Coração (Incor) em parceria com a Vigilância Sanitária do Estado de São Paulo, entre abril e setembro de 2024 em seis municípios paulistas.
Todos os 417 participantes eram usuários exclusivos de cigarros eletrônicos, com maioria jovem, predominantemente branca, altamente escolarizada e alto poder aquisitivo.
Dependência de nicotina comprovada
A pesquisa se baseou na aplicação de questionário e na coleta de saliva para os testes de biomarcadores. Os resultados revelaram uma correlação entre a dependência de nicotina, relatada pelos próprios consumidores, e concentrações salivares de nicotina e cotinina.
A cotinina é uma substância química produzida pelo corpo após a exposição à nicotina. O estudo apurou também que, no grupo, os ex-fumantes de cigarros convencionais apresentaram mais nicotina e cotinina do que os demais participantes que nunca haviam feito uso de tabaco até se tornarem usuários de vapes.
A média de nicotina foi de 127,68 ng/mL entre os que não perceberam dependência, comparado a 324,48 ng/mL entre os que admitiram dependência severa. Já 71,3% dos que afirmaram não notar dependência não eram tabagistas antes de provarem o eletrônico.
Além disso, comprovou-se uma “não relação” entre os níveis elevados de nicotina e o período de utilização de eletrônicos, evidenciando riscos de intoxicação mesmo em iniciantes.
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Por que fumam?
Quando questionados sobre o que os levou ao uso, 40,5% responderam “curiosidade” e 54,3% argumentaram ser um caminho para deixar o cigarro convencional. Apesar disso, 25% confirmaram sentir que a saúde piorou.
Mais danos que cigarros convencionais
Diferentemente do que acreditam alguns, os vapes passam longe de ser uma solução para deixar o tabagismo. Estudo anterior do InCor provou que os níveis de nicotina de quem faz uso dos dispositivos podem ser extremamente altos: quem utiliza com regularidade tem até seis vezes mais do que o valor médio de fumantes de 20 cigarros/dia.
A maneira de consumo é uma das explicações para essa diferença. Em um dia, enquanto um tabagista de convencionais traga cerca de 200 vezes, adeptos do vape tragam mais de 1.500.
Exemplo positivo do Brasil
Após muitas discussões e recomendações que envolveram inclusive cardiologistas, em 2024, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) publicou a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 855/2024, atualizando e mantendo a proibição dos vapes no país.
A assertividade da resolução garantiu à agência brasileira o reconhecimento da Organização Mundial da Saúde (OMS), que lhe conferiu o prêmio do Dia Mundial sem Tabaco 2025.
O alto custo do tabagismo para a saúde e para o Estado
Mesmo com as fartas evidências dos males que qualquer modalidade de tabagismo fazem à saúde, a pesquisa com os usuários de eletrônicos apurou que a maioria do grupo de ex-fumantes de cigarros convencionais discorda da lei. Mas estão errados.
Além do custo pessoal para a qualidade de vida e longevidade (o tabaco é responsável por 90% das mortes por câncer de pulmão; 25% dos casos de infarto e 50% dos acidentes vasculares cerebrais), o tabagismo tem um ônus alto para o Estado.
Um levantamento do Instituto Nacional do Câncer (Inca) prova que a cada R$ 1,00 de lucro obtido pela indústria do tabaco, o Brasil gasta 2,3 vezes esse valor com o tratamento de doenças relacionadas ao tabaco e 5,1 vezes com o custo total (direto e indireto) dessas doenças.
Os resultados de todos esses estudos levam em uma única direção: a necessidade de iniciativas da saúde pública e por parte de entidades médicas para expor as verdades sobre o tabaco, provando que a roupagem dele pode até mudar para parecer moderno e inofensivo. Mas são apenas estratégias de marketing para angariar cada vez mais dependentes.
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Dia Nacional de Combate ao Fumo
Em 29 de agosto temos o Dia Nacional de Combate ao Fumo e a Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp), mais uma vez, se mobiliza para alertar a população por meio de publicações informativas voltadas ao público.
Durante o mês de agosto, em seus canais – site e mídias sociais – os interessados terão acesso gratuito a entrevistas com especialistas, orientações e podcasts. São conteúdos fundamentais para sanar dúvidas sobre vapes e qualquer outra forma de tabagismo.
*Jaqueline Scholz é especialista em tratamento do tabagismo e assessora científica da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp)