Saúde mental precisa entrar de verdade na gestão das empresas
O que está realmente em jogo quando se discute a prevenção de transtornos psíquicos no ambiente de trabalho
As empresas ainda enfrentam muitas dificuldades para criar programas de saúde emocional e mental por duas razões: o medo de se expor de quem está com um problema e o preconceito e a falta de informação segura entre funcionários e gestores para saber como lidar com o assunto.
Na prática, a riqueza de uma corporação depende da saúde física e mental dos trabalhadores, e certamente o diagnóstico precoce de um eventual transtorno contribui para preservar o bem-estar do colaborador e o sucesso da companhia. Para isso, as empresas precisam olhar mais para seu capital humano e investir na qualidade de vida e na gestão de saúde dos colaboradores.
As organizações devem buscar diminuir o sentimento de exaustão vivenciado cada vez mais pelas pessoas, tendo escuta ativa e profissionais à disposição para identificar sinais de problemas, fazer diagnósticos e viabilizar tomadas de decisão acertadas.
Realizamos uma pesquisa pelo HUBRH+AAPSA que aponta que 66% das empresas estão preocupadas com a saúde mental hoje. De fato, após a pandemia, esse tema se tornou prioritário.
Nossa associação ouviu profissionais de recursos humanos de grandes empresas (com mais de 500 funcionários) com o intuito de endereçar suas principais necessidades e estabelecer a saúde corporativa como uma ferramenta estratégica. Descobrimos que a gestão do bem-estar mental é o grande desafio do momento.
No início da pandemia, a principal dificuldade era engajar os colaboradores a se manterem saudáveis física e mentalmente em um cenário desconhecido e adverso. Atualmente, essa demanda continua em alta, mesmo com o termo “novo normal” já não fazendo tanto sentido.
Trata-se de uma questão complexa especialmente para os brasileiros. Segundo o Ministério da Saúde, a ansiedade é o transtorno psíquico mais comum na população e 86% dos participantes de um estudo do governo admitiram estar mais ansiosos nos últimos tempos.
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Isso vai de encontro aos achados da pesquisa do HUBRH+AAPSA. A possível volta para o escritório, o luto experimentado por alguns colaboradores que perderam seus familiares, as sequelas da Covid-19, o absenteísmo, a sinistralidade e as incertezas que ainda pairam sobre o controle da doença são pontos que tiram o sono de todos, sobretudo dos responsáveis pela gestão de pessoas nas organizações.
Não há mais dúvidas de que os desgastes emocionais estão no centro do debate de toda a sociedade. E isso passa pelas empresas, onde a área de RH precisa prezar como nunca antes a inteligência emocional e o bem-estar como pilares da experiência do colaborador.
Além de garantir um retorno seguro, eficiente e sem neuras ao ambiente de trabalho, os profissionais de recursos humanos e as lideranças têm de incluir essa preocupação em seu planejamento futuro, tendo em vista a nova realidade e a ressignificação do que é um “alto desempenho”. Foi-se o tempo de priorizar só entregas rápidas e com qualidade e se esquecer da qualidade de vida e do estado emocional de quem as realiza.
A empresa onde você trabalha ou sob a sua responsabilidade tem programas de saúde? Faz gestão de saúde populacional? O que é feito com os dados de saúde dos funcionários? São inúmeras perguntas críticas a que alguns gestores não tem resposta hoje. Isso precisa mudar! Que tal começar com pequenas iniciativas, reavaliadas e reajustadas de tempos em tempos?
Há nove anos criamos um comitê de saúde corporativa que atua no desenvolvimento de processos de gestão integrada e disponibiliza aos profissionais de RH conhecimento técnico para implementar boas práticas na gestão de saúde de suas empresas. Esse cuidado se reflete em toda a cadeia e agrega valor para todo o ecossistema envolvido.
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Ambiente saudável
Para que o ambiente de trabalho seja saudável do ponto de vista mental, ele deve proporcionar oportunidades razoáveis para a autorrealização e a melhoria da autoestima. E não pode negligenciar fatores que circundam a satisfação e o sentimento de realização do funcionário, bem como a noção do bem-estar comum.
O ambiente ideal inclui:
• Cooperação e diálogo entre os trabalhadores e gestores;
• Reconhecimento da contribuição do trabalhador;
• Perspectivas de carreira e desenvolvimento profissional;
• Promoção da saúde física e mental do trabalhador;
• Respeito pela individualidade e moralidade;
• Ausência de discriminação e assédio sexual e moral;
• Respeito, em todos os sentidos.
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Nesse sentido, é preciso superar a ideia de “profissional de alto desempenho”, traduzida nas organizações como a busca incessante do resultado e da produtividade. Muitas vezes, é invisível para a empresa o que é um trabalho realmente bem feito, assim como o processo “mão na massa” por trás dos resultados, os propósitos em jogo e a importância de um time coeso e feliz. Mas só olhando para esses pontos uma empresa consegue realmente se manter lucrativa e sustentável.
Um estilo de supervisão autoritária ou abusiva não só consome mais recursos internos dos funcionários no dia a dia como prejudica a capacidade produtiva, o significado do trabalho, o entusiasmo e a motivação para inovar.
Da mesma forma, ignorar o cuidado com a saúde mental só irá colocar mais peso sobre os colaboradores e onerar as próprias empresas. Há uma década o Ministério da Previdência Social já colocava depressão, ansiedade e outros transtornos como os problemas mentais e comportamentais mais frequentes entre os trabalhadores.
É imprescindível que as companhias, e os psicólogos e gestores que nelas atuam, entendam os fatores ligados ao sofrimento mental e como as crenças e o autocuidado dos colaboradores estão consonantes ou dissonantes da missão e dos valores da organização. O olhar para o bem-estar mental potencializa e promove a integração entre pessoas e empresas, gerando êxitos para ambos os lados.
* Tania Machado é presidente do HUBRH+AAPSA