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Numa parceria com o CDD (Crônicos do Dia a Dia), esse espaço dá voz a pessoas que vivem ou viveram, na própria pele, desafios e vitórias diante de uma doença crônica, das mais prevalentes às mais raras
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“É um malabarismo”: a jornada com o Alzheimer do meu pai

Setembro Lilás é o mês de conscientização sobre a doença. Para marcar a data, leia um relato de quem convive de perto com suas consequências

Por Natalia Duarte*
29 set 2024, 07h00
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    Alzheimer e Parkinson, os dois principais tipos de demência, não têm cura nem são reversíveis (atlascompany/Freepik)

    A doença de Alzheimer é uma condição que impacta profundamente a vida de muitas famílias e eu vivi essa transformação de perto com meu pai. Ele sempre foi uma pessoa muito independente, um homem ativo que, mesmo após a aposentadoria, seguiu trabalhando até os 84 anos.

    Hoje, percebo que os sinais estavam presentes há mais de uma década. Rigidez em suas opiniões, conversas repetitivas, lapsos de memória e palavras que se perdiam. Quando recebemos o diagnóstico, não foi uma surpresa completa, pois já estávamos atentos a estes e outros comportamentos.

    Entretanto, o impacto foi imenso em nossas vidas. Enfrentamos a necessidade de ajustar nossas rotinas, o que trouxe desafios pessoais e, por vezes, afetou minha própria saúde. Chegou um momento em que precisei de uma rede de apoio para não adoecer de vez.

    O papel de cuidadora de um idoso, especialmente de um pai, trouxe lições inesperadas. A transição de filha para cuidadora não é fácil.

    O emocional pesa, mas espaços em rede me ajudaram a encontrar informações valiosas sobre Alzheimer e, sobretudo, suporte emocional. Foi assim que entendi melhor os sinais da doença e aprendi sobre os tratamentos e formas de desacelerar seu avanço, além de conhecer outras pessoas que vivem a mesma experiência.

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    +Leia também: Novo estudo acende alerta para bem-estar dos cuidadores de pessoas doentes

    O maior desafio no cuidado diário do meu pai tem sido equilibrar as demandas crescentes de sua condição com a minha própria vida. O Alzheimer é progressivo e exige, aos poucos, mais tempo e atenção.

    Atualmente, meu pai precisa de cuidados 24 horas por dia. Como meus pais eram funcionários públicos e fizeram economias para a velhice, recursos financeiros não são um problema, mas a administração de cuidados cada vez mais complexos gera um grande desgaste emocional e físico.

    Um dia na vida de alguém com Alzheimer

    Em um dia típico, eu acordo meu pai e tomamos café conversando. Sempre converso sobre a família e eventos, então a casa é repleta de fotografias e álbuns que vou mostrando.

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    Durante a manhã, ele faz fisioterapia ou fonoterapia de deglutição. As duas profissionais o atendem já há alguns anos, então é também uma visita social para o meu pai. Geralmente, almoçamos juntos e voltamos a conversar, lembrar e rir.

    De vez em quando, uma cuidadora leva a filha de 1 ano. Meu pai vibra! Chama ela de minha garota, como me chamava também.

    É um aprendizado, como tudo na vida. No começo, não consegui equilibrar, pedi aposentadoria, abri mão da minha vida. Por isso, adoeci. Mas fui aprendendo, ouvindo cuidadoras mais experientes, buscando informações, identificando bons profissionais e consegui retornar ao mercado de trabalho em tempo parcial e retomar o autocuidado.

    Não renuncio ao meu lazer, a estar com a família, andar de bicicleta, nadar, ir à academia. É um malabarismo, vez ou outra não consigo cumprir uma agenda, mas estou aprendendo.

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    +Leia também: “O diagnóstico do Alzheimer não é uma sentença de morte”

    Setembro Lilás

    Algo que me preocupa bastante é a falta de visibilidade e compreensão sobre o cuidado com os idosos, especialmente os que vivem com demência. Ainda existe um silêncio que precisa ser rompido. Muitas famílias não falam abertamente sobre a necessidade de dividir as responsabilidades e os cuidados.

    Isso gera sobrecarga em uma única pessoa, muitas vezes uma mulher, o que pode levar ao esgotamento. O cuidado deve ser uma responsabilidade compartilhada por todos os membros da família.

    Lidar com Alzheimer nos ensina a enxergar a vida por uma nova perspectiva. Assim, aprendi a valorizar ainda mais meu próprio bem-estar e saúde. Busquei informações e apoio em diversos lugares, mas, no Brasil, ainda faltam políticas públicas que atendam às pessoas idosas e aos cuidadores familiares, como centros-dia públicos e atividades culturais para esse público.

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    Também seria fundamental haver uma regulamentação para a profissão de cuidador e incentivos que garantam proteção para quem assume esse papel por anos.

    Para quem está começando a trilhar este caminho, o conselho que eu dou é: procure apoio. Não tente fazer tudo sozinha. Partilhar os cuidados com outros membros da família e buscar ajuda de grupos como o nosso pode fazer toda a diferença.

    Cuidar de alguém com Alzheimer é desafiador, mas também pode ser uma experiência de muito afeto. Dá para encontrar momentos de felicidade e conexão nesse processo, tanto para quem cuida quanto para quem é cuidado. É possível ser feliz sendo cuidadora e também tendo Alzheimer.

    Precisamos de informação de qualidade, de mais campanhas como o Setembro Lilás – Alzheimer: É Hora de Agir, campanha do Mês Mundial de Conscientização Sobre Alzheimer realizada pela Febraz – Federação Brasileira das Associações de Alzheimer, ADI – Alzheimer’s Disease International, CDD – Associação Crônicos do Dia a Dia e ABRAz São Paulo – Associação Brasileira de Alzheimer.

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    É indispensável que a Política Nacional de Cuidados contemple auxílio para quem deixou de trabalhar e/ou estudar para cuidar, além de contagem do tempo que cuidou como contribuição previdenciária.

    O Setembro Lilás é fundamental para conscientizar a sociedade sobre essa condição. Mais do que nunca, o Brasil tem de reconhecer e apoiar as pessoas que vivem com demência e seus familiares cuidadores, garantindo direitos e proteção para todos.

    *Natalia de Souza Duarte é cuidadora do pai, Ítalo Duarte, de 90 anos e que vive com Alzheimer. Ela é graduada em Educação Física e Pedagogia (UnB), especialista em Aprendizagens (GEEMPA), mestre em Educação (UnB), doutora e pós-doutora em Política Social (UnB). Ela tem 58 anos e mora em Brasília.

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