“Após 45 ressonâncias e outros exames, me sinto torturado e sem respostas”
Um rapaz da Grande São Paulo relata sua rotina de atendimentos precários em um plano de saúde e a busca para saber o que compromete sua qualidade de vida
Foram 45 ressonâncias magnéticas. Não só! Tomei agulhadas e levei choque no corpo inteiro cinco vezes. Em outras duas, enfiaram uma agulha enorme na minha coluna para extrair um líquido para análise.
Arrancaram também um pedaço do meu músculo para biópsia, dilataram minha pupila várias vezes, pingaram colírios dolorosos, fiz duas colonoscopias e inúmeros exames de sangue.
Tudo isso durante três anos e meio em que peregrinei em consultas, clínicas e laboratórios de um plano privado popular para saber qual era a causa dos meus sintomas. Eles começaram com uma ardência nos olhos e dor crônica na perna esquerda. Evoluíram para alterações neurológicas e dores em várias articulações.
A ressonância faz barulhos que até hoje invadem meu sono: você fica uma hora na mesma posição desconfortável ouvindo um barulho de maquinário alto. No meu caso, desenvolvi uma sensibilidade aos sons e ruídos para piorar a situação.
Como fiz esse tipo de exame de quase o corpo todo, as posições e preparos foram bem desconfortáveis. Eu vivi isso 45 vezes, em três anos e meio, o que dá mais do que uma vez por mês. Houve ocasiões em que fiz uma ressonância por semana.
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Quando eu chegava na sala dos médicos com quatro ressonâncias recentes de crânio, por exemplo, eles mandavam eu fazer novamente a mesma ressonância. O problema não é só repetir exames. O problema está nessas consultas sem fim.
Eu ainda não sei o que tenho. Mesmo depois de uma centena de exames, alguns muito invasivos e que me deixaram sequelas, eu não sei qual é a causa das dores que me impedem de andar, ficar em pé, trabalhar, e principalmente, de ser feliz.
Já fui diagnosticado com esclerose lateral amiotrófica por causa de uma eletroneuromiografia que estava errada. Fui também quase operado de um joelho devido a um laudo mal feito de uma ressonância. Fiquei um ano e meio em um departamento do meu plano para casos complexos – e nada.
Nesse setor para casos complexos, o reumatologista e o psiquiatra me diagnosticaram com transtorno somatoforme, um distúrbio mental presente em pessoas que não encontram um diagnóstico, como eu, mas que têm sintomas agravados pela crença de que estão doentes.
Ou seja, para eles, minhas dores, fraqueza muscular, úlceras anais, lesão intranasal e doenças de pele são de origem emocional.
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Sem respostas, vasculhei artigos na internet para ver o que batia com o que eu sinto. A hipótese diagnóstica que mais faz sentido é uma doença grave autoimune chamada síndrome de Behçet.
Tive um exame positivo para o HLA B57, um marcador genético associado a essa condição. Mas os médicos que me atenderam nesse programa não concordavam com o diagnóstico.
A última reumato disse que não era possível me diagnosticar e que meu tratamento só poderia ser o controle da dor. Virei dependente de um opioide.
Tive de ir para o SUS. Sim, largar o plano e ir para o SUS. Na rede pública, os médicos estão investigando a síndrome de Behçet, vasculites e até câncer.
Por que é tão difícil descobrir a causa dos meus problemas? Por que tantos exames? Por que não prestam atenção nos meus sintomas? Ainda busco uma resposta.
*Lucas Santos tem 29 anos e é morador de Carapicuíba (SP)