“Apaguei ao volante e bati o carro em consequência do burnout”
Mesmo sendo um profissional da saúde mental, o psicólogo Lucas Franco Freire não identificou os sintomas do esgotamento profissional a tempo
Quando abri os olhos, me vi cercado de pessoas estranhas. Minha visão estava turva, como se estivesse tentando enxergar através de um vidro embaçado, mas reparei que o volante do carro estava solto no meu colo.
Com o coração acelerado, tentava juntar as peças e entender o quebra-cabeça da situação. Foi então que ouvi o choro da minha namorada, hoje minha esposa. Do lado de fora uma voz gritou: “Fique calmo! O Samu já está chegando!”.
Aquele acidente foi a gota d’água, a clara manifestação de que meu corpo e minha mente já estavam sobrecarregados, desgastados, exauridos.
Mesmo sendo psicólogo, negligenciei todos os sinais de alerta. A queda de cabelo e barba, uma gastrite que não passava, o cansaço extremo, a irritabilidade constante, a sensação de estar em um abismo sem fim, as noites mal dormidas… O estresse era crônico. Dormir ao volante e bater o carro foi a consequência final.
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Naquela época, trabalhava como coordenador de RH na indústria, em um ambiente altamente tóxico, onde as pressões eram constantes e as expectativas, muitas vezes, inalcançáveis.
No mesmo período, fui convidado para ser professor universitário, algo que sempre sonhei, mas cuja remuneração era ingrata. Todas as noites, após um dia exaustivo na fábrica, me dirigia à universidade para dar aulas.
Eu amava ensinar, mas a tentativa de equilibrar ambas responsabilidades esgotaram todos os meus recursos pessoais. Naquela noite, ao bater em um poste faltando muito pouco para chegar em casa, atingi o meu limite.
Sou a prova de que o burnout não é apenas uma síndrome do esgotamento profissional: é um grito da alma, um pedido desesperado de pausa.
A negligência com minha saúde mental quase me custou a vida. Por sorte, o impacto, embora forte, só destruiu o carro.
Esse episódio tornou-se o marco de um novo começo para mim. A recuperação desse burnout me fez aprofundar os estudos sobre como evitá-lo. Foi aí que me encontrei no universo da ciência do play!
O “play” (que vem de diversão, ou brincadeira) pode ser definido como atividades espontâneas e prazerosas, que nos permitem explorar, criar e experimentar a vida de maneiras únicas.
O play promove bem-estar físico e mental. Quando temos mais tempo para o lúdico, somos capazes de liberar a tensão acumulada, reduzir a ansiedade e desenvolver a resiliência.
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Com a missão de oferecer caminhos para aliviar as tensões e o sofrimento causado pelo estresse profissional, compilei conhecimentos no livro “Playfulness! Trilhas para uma vida resiliente e criativa”.
Nesse livro, eu conto como o play está ancorado em quatro pilares. São eles:
- Tensão criativa: quando o conflito se torna positivo e passa a nos mover
- Resiliência estoica: a capacidade de enfrentamento e de exercitar o controle sobre o que pode ser transformado
- Flow: experiências positivas que dão força de resistência em nome do movimento
- Ludicidade: quando a vida ganha mais alegria e não perde a leveza
Hoje, sei que saúde e bem-estar não são negociáveis. Não sacrifico minha essência por demandas profissionais. Aprendi que cuidar de mim é o primeiro passo para cuidar dos outros e realizar meus sonhos.
Não espere um choque de realidade para acordar. A vida é para ser vivida, não apenas sobrevivida. Peça ajuda se necessário e, acima de tudo, escute-se. Explore, descubra e viva o seu Play!
*Lucas Franco Freire é psicólogo, professor, escritor e palestrante, com 20 anos de experiência. Especialista em Psicologia Positiva e do Trabalho. É autor do livro “Playfulness! Trilhas para uma vida resiliente e criativa”.