Uma das maiores felicidades que vivenciamos em um consultório que trata pessoas com obesidade é quando elas saem dos três dígitos, ou seja, já não pesam mais de 100 quilos. Nestes tempos difíceis, a expectativa agora ronda outro número três, o da terceira dose da vacina para Covid-19 nessa população.
Ao longo de quase dois anos diante da nova doença, diversos foram os estudos científicos que demonstraram a suscetibilidade maior do portador de obesidade em se contaminar bem como ter um quadro mais grave em comparação com quem tem o peso dito normal. Assim, a obesidade é uma doença crônica associada ao maior risco de contaminação, progressão e morte pelo coronavírus.
Observamos que adultos obesos e com menos de 60 anos apresentam um percentual bem maior de internação em unidades de tratamento intensivo (UTI), intubação e utilização de ventiladores mecânicos (respiradores) em relação à população que está dentro do peso adequado.
As consequências para o sistema de saúde são óbvias: maior número de pacientes com evolução grave, internações e tratamentos mais complexos e enorme custo para o sistema.
A grande discussão do momento é sobre a efetividade da vacina, seu tempo de proteção e o número de doses necessárias. Quanto à efetividade em si, até o momento não temos pesquisas suficientes mostrando que o imunizante para Covid-19 seja menos efetivo em pessoas com obesidade, embora saibamos que vacinas para gripe e hepatite, por exemplo, sejam menos eficientes nesse grupo.
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Em fevereiro deste ano, saiu um dos primeiros estudos, publicado no periódico médico The New England Journal of Medicine, sinalizando, após análise de quase 600 mil pessoas vacinas contra o coronavírus, uma provável menor efetividade entre obesos com comorbidades (diabetes, hipertensão, etc).
A Associação Europeia para Estudo da Obesidade (EASO), a Coalizão Europeia de Pessoas que Vivem com Obesidade (ECPO) e a Sociedade Americana de Obesidade publicaram seus posicionamentos defendendo, de modo unânime, a recomendação de que todo obeso seja vacinado prioritariamente, devido à maior propensão a contaminação e piora pela doença. Também postulam a necessidade de estudos de eficiência da vacina especialmente voltados a essa população.
O tempo de proteção ainda é objeto de discussão. Em entrevista recente, o CEO da Pfizer, Albert Boula, deixou clara sua preocupação da provável necessidade de uma terceira dose. Da mesma forma, o CEO da Johnson & Johnson, Alex Gorsky, chegou a mencionar uma possível vacinação anual, como acontece com a gripe.
O prazo de mutação do vírus tem sido mais rápido do que o esperado e esse é um dos fatores que mais preocupam em relação à formação e à manutenção da imunidade após a vacina. A cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, já tem visto seus casos crescerem de forma alarmante com a nova variante delta.
E é nesse ponto que entra uma questão extremamente importante: pessoas com obesidade têm uma resposta imunológica mais fraca, possuem menos reserva pulmonar e correm maior risco de parar num leito de UTI e morrer pela Covid-19, com todas as repercussões para o sistema de saúde. Então não seriam elas um grupo prioritário para uma terceira dose da vacina?
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A FDA, agência que regula os medicamentos nos Estados Unidos, divulgou, em agosto, resolução que autoriza pacientes com baixa imunidade, como transplantados e portadores de certas doenças, a tomarem uma terceira dose, partindo do pressuposto de que, pelos dados atuais, há uma boa chance de que imunodeprimidos em geral necessitem de um reforço.
Nosso Senado começou a discussão sobre a terceira dose, demonstrando preocupação com o assunto. Sabemos da necessidade de o mais rápido possível vacinarmos o maior número de brasileiros, mas não podemos nos esquecer daqueles que precisarão de uma picada extra para ficar realmente mais protegidos. Está mais do que na hora de superarmos o dilema entre o custo de tratar e enterrar cidadãos com obesidade e poder prevenir situações assim com a vacinação.
* Cid Pitombo é médico PhD em obesidade e cirurgia bariátrica