O retrocesso na lista de procedimentos obrigatórios dos planos de saúde
Advogada argumenta que novo rol de tratamentos e procedimentos que devem ser cobertos pelos convênios não atende necessidade de muitos pacientes
Os beneficiários de planos de saúde foram surpreendidos com a atualização da lista de coberturas obrigatórias, que entrará em vigor em abril deste ano. Após intervalo de dois anos, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), ampliou o rol com a incorporação de 69 coberturas, sendo 50 relacionadas a medicamentos e 19 a exames, terapias e cirurgias.
Considerando a rápida evolução da medicina e os aumentos exorbitantes nas mensalidades aplicados pelos convênios, a nova lista causou indignação, uma vez que não abarca inúmeros tratamentos já consolidados no exterior.
De acordo com as informações divulgadas pela ANS, a preocupação foi garantir a sustentabilidade da saúde suplementar, o que evidencia o descaso com os pacientes que são impedidos de obter o tratamento mais moderno por conta da garantia da alta lucratividade dos convênios médicos.
É interessante observar que, apesar da sombria perspectiva da autarquia, os dados divulgados no Boletim Covid-19 não apontam desequilíbrio de ordem assistencial ou financeira, mas identificam uma curva descendente do índice de sinistralidade no ano de 2020 e um aumento recente no número de beneficiários. Por essa razão, o Ministério da Economia emitiu recomendação para que a ANS estime a probabilidade do reajuste em 2021 constar resultado negativo.
Não bastasse, os beneficiários da saúde suplementar foram surpreendidos com a redação de um artigo que considera taxativo o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde, e não mais uma listagem mínima obrigatória. Inclusive, o entendimento de que é uma lista exemplificativa já se encontra sedimentado nos Tribunais de Justiça dos Estados e na Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Por causa de divergências no STJ, o tema ainda aguarda a uniformização da tese, por intermédio do julgamento do recurso pelo colegiado de ministros daquela corte.
Outro assunto que causou perplexidade foi a inserção do medicamento off-label no item de exclusão assistencial, sob o argumento de ser experimental, com ressalva apenas para os casos em que a Conitec tenha demonstrado as evidências científicas sobre a eficácia, a acurácia, a efetividade e a segurança do produto, e a Anvisa tenha emitido autorização de uso para fornecimento pelo SUS.
O fármaco off-label é aquele que recebe indicação inicial aprovada no registro da agência para determinada doença, mas pode ser utilizado para outras enfermidades, sendo que a obrigatoriedade de cobertura pelos convênios já se encontra consolidada na Justiça.
Contudo, apesar dos esforços divulgados pela agência para amenizar as polêmicas, as inovações conceituais trazidas pela ANS fogem da sua competência e servem apenas para aumentar a burocracia e a lentidão das etapas de aprovação para que o produto alcance o principal interessado, que é o paciente.
Nesse contexto, a ANS não está cumprindo o seu papel de defender o interesse público na assistência suplementar à saúde e contribuir para o desenvolvimento das ações em prol da saúde, sem afrontar a Lei dos Planos de Saúde, o Código de Defesa do Consumidor e a Constituição Federal. Inclusive, a prevalência do interesse econômico das grandes empresas em detrimento da saúde do consumidor desvirtua a própria natureza do contrato.
* Tatiana Kota é advogada especializada em direito à saúde do escritório Vilhena Silva Advogados, em São Paulo