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CAR-T: a revolução no tratamento de doenças como a leucemia

Terapia celular será aplicada em quatro centros de referência no Brasil. Especialista explica como funciona

Por Phillip Scheinberg, hematologista*
Atualizado em 29 Maio 2023, 13h05 - Publicado em 8 abr 2022, 15h30
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  • A terapia CAR-T está revolucionando o tratamento das doenças onco-hematológicas, alterando de forma significativa o curso natural de doenças como leucemia linfoblástica aguda de células B, linfoma difuso de grandes células B e mieloma múltiplo. Pacientes com esses tipos de câncer no sangue e no sistema linfático que não respondem às terapias convencionais poderão tirar proveito da inovação, recém-aprovada no Brasil pela Anvisa.

    Quatro centros de referência estão aptos a administrar essa terapia que se vale de células geneticamente modificadas no país, entre eles a BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo, onde atuo. Assim que for concluído o processo de precificação junto ao governo, poderemos iniciar os atendimentos para o novo tratamento.

    A terapia com uso de linfócitos (um tipo de célula de defesa) não é exatamente algo novo. Ela vem sendo estudada por décadas por meio de diferentes técnicas e metodologias. A primeira descrição da tecnologia atual, conhecida pela sigla CAR-T, surgiu em 1989 em um artigo publicado em periódico da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos.

    De lá para cá foram feitas várias tentativas de aplicar essa estratégia, e os primeiros resultados positivos foram publicados entre 2011 e 2012 por um grupo da Universidade da Pensilvânia e dos Institutos Nacionais de Saúde dos EUA.

    A técnica do CAR-T utiliza dois tipos de linfócitos, o B e o T. O linfócito B é excelente em reconhecer proteínas na superfície das células, inclusive as dos tumores, mas não possui uma capacidade destrutiva alta. Já o linfócito T também faz o reconhecimento, porém com muito mais dificuldade, mas tem uma capacidade destrutiva superior.

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    Com o CAR-T, transferimos geneticamente o poder de reconhecimento do linfócito B para o linfócito T. Assim conseguimos fazer com que o linfócito T tenha a capacidade de reconhecimento do linfócito B associada ao seu armamentário altamente letal contra as células tumorais.

    + LEIA TAMBÉM: Nova terapia que pode mudar o tratamento de alguns tipos de câncer chega ao país

    Para o novo tratamento, há a coleta dos linfócitos do paciente através de um procedimento chamado aférese, no qual há a separação dos componentes do sangue por centrifugação em um equipamento automatizado. O material biológico rico em linfócitos T é enviado para laboratórios específicos, geralmente nos EUA ou na Europa, é modificado geneticamente e retorna ao Brasil para ser infundido novamente no paciente. Todo esse processo dura em média 30 dias.

    A elegibilidade para a CAR-T depende de uma avaliação médica especializada, mas, em geral, é dirigida a pacientes com uma doença com comportamento mais resistente ou refratário às abordagens tradicionais e que tenham condições de serem submetidos a essa terapia.

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    Um dos aspectos mais importantes é o encaminhamento do paciente no tempo correto para os centros de referência para que não se perca a janela em que podemos avaliá-lo, verificar os critérios de elegibilidade e partir para o tratamento.

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    O CAR-T permite atuar onde a quimioterapia já falhou e resgatar pacientes que não responderam a até sete linhas de tratamento. Ou seja, pode ser uma solução altamente eficaz e até curativa nesses casos. Estudos mostram que, entre pacientes com linfomas refratários a múltiplos tratamentos, as curvas de sobrevida têm se mantido em torno de 40%, possibilitando que pessoas fiquem em remissão da doença por anos.

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    Para a leucemia linfoblástica aguda, os números são ainda melhores, em torno de 50 a 60% de sobrevida livre de eventos. Um exemplo e símbolo disso é a americana Emily, que recebeu, aos 7 anos em 2012, a terapia CAR-T dentro de um protocolo de pesquisa para leucemia linfoblástica aguda refratária e se mantém em remissão até hoje.

    Já para o mieloma múltiplo, os dados ainda são menos maduros, porém temos visto que a capacidade de resposta em pacientes altamente refratários a tratamentos convencionais é alta, em torno de 80 a 90% no primeiro ano. Mas é preciso acompanhar esses estudos em congressos e periódicos para ver como os efeitos se traduzirão em sobrevida ao longo dos anos.

    No Brasil, a Anvisa aprovou a terapia CAR-T para a leucemia linfoblástica aguda, alguns subtipos de linfoma não-Hodgkin como o difuso de grandes células B e o mieloma múltiplo.

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    Enquanto caminhamos para o primeiro tratamento fora de caráter experimental no Brasil, novos protocolos de pesquisa têm sido desenvolvidos para oferecer a CAR-T mais precocemente a pacientes de alto risco, conforme foi apresentado e discutido no último congresso da Sociedade Americana de Hematologia.

    Além disso, há um movimento para que esses estudos clínicos, que englobam formas mais potentes do tratamento e com menos efeitos adversos, possam também ser realizados no Brasil. A revolução, felizmente, já começou!

    * Phillip Scheinberg é hematologista e coordenador da hematologia do Centro de Oncologia e Hematologia da BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo

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