A relação entre burnout e experiências de abuso no trabalho, particularmente por meio de assédio prolongado, merece uma análise cuidadosa. O assédio no trabalho, seja moral ou psicológico, caracteriza-se por comportamentos abusivos sistemáticos que, em geral, se repetem regularmente – como humilhações, condutas passivo-agressivas e sabotagem profissional.
Tais experiências podem não apenas precipitar o burnout, mas também gerar pensamentos delirantes ou conteúdo persecutório em indivíduos vulneráveis, elementos frequentemente associados a transtornos psicóticos como a esquizofrenia.
O mecanismo subjacente a essa conexão pode ser explicado pelo impacto do estresse crônico no eixo hipotálamo-pituitária-adrenal (HPA), e pela resposta inflamatória subsequente que ele desencadear, afetando a função cerebral de maneiras que exacerbam a percepção de ameaça e a sensação de estar sendo perseguido.
Autores como Lysaker & Larocco (2019) apontam que, em cenários de assédio prolongado, onde a vítima se sente constantemente atacada e sem suporte, pode ocorrer uma erosão progressiva do senso de realidade, culminando em uma resposta psicológica que imita sintomas típicos de transtornos mais graves, como a esquizofrenia.
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A importância de identificar e intervir em ambientes de trabalho tóxicos é crucial, não apenas para prevenir o burnout, como para mitigar o risco de condições psicóticas. As intervenções devem incluir principalmente políticas organizacionais eficazes contra o assédio e apoio psicológico adequado às vítimas.
Programas de resiliência ao estresse e ferramentas para lidar com o ambiente de trabalho adverso, embora recomendados pela American Psychiatric Association (2013), tendem a ser inócuos em um ambiente em que os mecanismos de defesas coletivas estão esgotados ou são inexistentes.
Em outras palavras, se o ambiente é tóxico a ponto de as pessoas se sentirem muito sozinhas ou completamente isoladas em seus problemas com a organização, a possibilidade de que técnicas de coping tenham resultados satisfatórios tende a ser baixa.
Embora o burnout e a esquizofrenia apresentem manifestações diferentes, ambos podem exibir formas de distanciamento psicológico que têm suas raízes no estresse. No burnout, a despersonalização manifesta-se como um distanciamento emocional do trabalho e das relações interpessoais no ambiente profissional, o que pode ser visto como um mecanismo de defesa contra a exaustão contínua.
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Na esquizofrenia, a despersonalização inclui experiências de desrealização ou de estar separado de si mesmo, o que pode ser interpretado como uma resposta ao estresse psicótico e ao trauma. Essas experiências compartilhadas de distanciamento sugerem uma resposta psicológica comum ao estresse crônico e à sobrecarga emocional, enfatizando a importância de estratégias de intervenção focadas na redução do estresse e no fortalecimento da resiliência psicológica.
O cinismo, frequentemente observado em indivíduos com burnout, é caracterizado por um distanciamento emocional e uma visão negativa das pessoas e do ambiente de trabalho. Esse cinismo representa uma estratégia de defesa contra a exaustão emocional e pode ser visto como uma tentativa de proteger a integridade pessoal ao reduzir o envolvimento pessoal.
Diferentemente do burnout, a esquizofrenia pode envolver sintomas de desconfiança ou paranoia, que, embora se pareçam superficialmente com o cinismo, são intrinsecamente diferentes em suas raízes e manifestações. Na esquizofrenia, essas desconfianças não são simplesmente um mecanismo de defesa emocional, mas sim delírios de perseguição que refletem distorções profundas no pensamento e na percepção da realidade.
A investigação das interfaces entre burnout e esquizofrenia não apenas amplia nossa compreensão das patologias relacionadas ao estresse, mas também reforça a necessidade de uma abordagem holística. Assim, o manejo efetivo do estresse emerge como um componente crucial tanto na prevenção quanto no tratamento de burnout e na mitigação dos episódios de esquizofrenia.
*Luciana Veloso Baruki é auditora pioneira em fiscalizações de assédio no Ministério do Trabalho, advogada, médica pós-graduanda em Saúde Mental e Psiquiatria, administradora de empresas e fundadora do perfil @assedionet nas redes sociais.