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Anabolizante e crime hediondo: qual a ligação?

Especialista discute quando a utilização e a distribuição dessas substâncias perigosas para a saúde passam a configurar um crime grave

Por Adib Abdouni, advogado*
Atualizado em 6 nov 2019, 12h12 - Publicado em 5 nov 2019, 12h42

A busca desenfreada pela obtenção do corpo perfeito tem impulsionado impressionante número de frequentadores de academias a consumir anabolizantes como os esteroides. A finalidade? Diminuir o tempo e a disciplina que devem ser obrigatoriamente investidos na rotina diária de treinos que venham a resultar em uma modelação corporal notabilizada pelo aumento acentuado da massa muscular.

Incautos, interessados nesse passe de mágica passam a se valer da orientação desconcertante de curiosos e até mesmo de maus profissionais das áreas de saúde, farmácia e educação física, que, de forma antiética e negligente, prescrevem ou fornecem medicamentos originariamente direcionados a tratamentos de reposição hormonal ou até mesmo de uso veterinário. Tal desvio de finalidade projeta consequências desastrosas na vida e na saúde do indivíduo, causando-lhe, não raras vezes, até a morte.

Contudo, esse comportamento descuidado não está fora do alcance da lei penal, sendo tratado como crime pelo ordenamento jurídico brasileiro, cujo princípio da coerção penal, por si só, já deveria servir ao propósito de desestimular tais condutas.

Observa-se que, em sua ampla maioria, as substâncias utilizadas nesse contexto não têm origem conhecida ou mesmo registro na Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). Muitas ainda se encontram na lista de medicamentos que exigem receita de controle especial ou no rol de drogas de fabricação estrangeira não aprovadas no Brasil — e, portanto, com venda e uso proibidos no país.

Todos aqueles que participam, direta ou indiretamente, desse encadeamento de ações ilícitas — importam, expõem à venda, têm em depósito para vender ou, de qualquer forma, distribuem o produto sem prescrição médica — estão sujeitos às sanções penais decorrentes da prática do delito previstos em nosso Código Penal, capitulado dentre os crimes contra a saúde pública. A punição pode envolver multa e pena de reclusão de dez a 15 anos.

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Delitos dessa natureza são considerados de grave potencial ofensivo no plano jurídico, especialmente porque praticados, em sua maioria, por profissionais graduados, que fazem justamente o oposto do esperado de suas atribuições, ou seja, preservar a saúde de seus clientes. Não à toa a legislação os erigiu à categoria de crimes hediondos.

Repugnados e definidos pela Lei dos Crimes Hediondos, são insuscetíveis de anistia, graça, indulto ou fiança, devendo as penas de segregação corporal ser cumpridas inicialmente em regime fechado, com direito à progressão para regime mais benéfico somente após o cumprimento de dois quintos da pena, em caso de réus primários, e de três quintos, nas hipóteses de reincidência.

O Poder Judiciário se debruçou sobre o tema e passou a considerar que a pena mínima de dez anos imposta — notadamente para os casos que envolvem a comercialização ilícita de anabolizantes e não a falsificação de medicamentos — é demasiado alta para o perfil histórico brasileiro de condenações. E com razão.

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Atentando-se para o princípio da proporcionalidade, vê-se que a aplicação da pena prevista no Código Penal mostra-se justificável somente nas hipóteses em que a conduta possa gerar uma profusão maior de danos à saúde pública. Isso implica no reconhecimento da inconstitucionalidade da Lei nº 9.677/98, que recomenda o emprego da mesma pena prevista para o tráfico de drogas.

É assim que decidiu o Superior Tribunal de Justiça, ao considerar imprescindível a atuação do Judiciário para corrigir o exagero e ajustar a exacerbada pena cominada a esse delito se comparado com o crime de tráfico ilícito de drogas — notoriamente mais grave  —, cuja pena mínima parte de cinco anos, o que vem sendo majoritariamente seguido pelos demais tribunais do país.

Entretanto, esse abrandamento técnico-jurídico a corrigir a distorção legislativa apontada não se mostra suficiente para autorizar a banalização da venda e o uso ilícito dos anabolizantes, posto que a norma penal continua vocacionada a inibir os efeitos prejudiciais decorrentes dessa conduta, que ainda pode ser qualificada como de natureza hedionda. Ao preservar esse poder de intimidação, mantém-se seu caráter de instrumento de prevenção.

É o que se espera.

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*Adib Abdouni é advogado constitucionalista e criminalista e pós-doutor em Direito Constitucional pela Universidade Sorbonne, em Paris, na França

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