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Síndrome pós-Covid: como detectar e tratar os sintomas mais persistentes

As sequelas do coronavírus podem afetar a qualidade de vida e até ameaçar a vida. Entenda por que, mesmo após a cura, nenhum mal-estar deve ser menosprezado

Por Chloé Pinheiro
Atualizado em 10 jun 2021, 17h20 - Publicado em 6 abr 2021, 14h34
Desenho de uma cabeça com rabiscos na região do cérebro
Cérebro é um dos órgãos mais cometidos no pós-Covid, apontam estudos. (Ilustração: Eduardo Pignata/SAÚDE é Vital)
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Com mais de 11 milhões de indivíduos curados da Covid-19 no Brasil até o momento, é justo se preocupar com uma possível epidemia subjacente e mais silenciosa. Estamos falando da síndrome pós-Covid. Em estudos, até 80% dos recuperados sentem ao menos um sintoma até quatro meses depois do fim da infecção.

Casos graves da doença, que exigiram internação e UTI, tendem a abalar mais o organismo no longo prazo. Mas a verdade é que os episódios leves também podem deixar marcas prolongadas.

Uma revisão sistemática e meta-análise, divulgada em janeiro por pesquisadores norte-americanos (ainda em revisão por outros cientistas), lista 50 queixas das mais variadas. Na mesma linha, uma revisão de literatura publicada na Nature dá a dimensão do problema em oito âmbitos, da pele ao cérebro.

“Temos certeza que a infecção está longe de ser apenas uma questão localizada e passageira. Há repercussões prolongadas em vários órgãos”, comenta a fisiatra Linamara Rizzo Battistella, professora da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).

De maneira geral, as principais manifestações do pós-Covid relatados até agora são:

Mal-estar e queixas como dores de cabeça e perda de olfato tendem a se resolver sozinhos. Agora, se o incômodo é intenso, o ideal é procurar atendimento médico. Sim, dá para conter os danos e intervir antes que algo pior aconteça.

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Para ter ideia, um dos braços da iniciativa Coalizão Covid-19 Brasil acompanhou cerca de mil indivíduos internados e concluiu que até 17% tiveram que ser hospitalizados novamente tempos depois – e 7% morreram até seis meses depois da alta. Os dados são preliminares, e ainda não foram publicados em periódicos científicos.

A ressaca pós-combate

Para se livrar do coronavírus, o sistema imunológico desencadeia um processo inflamatório, que se torna exacerbado demais em uma parcela de pessoas. São as vítimas da chamada tempestade inflamatória, fenômeno que envolve a liberação de substâncias, como citocinas, com potencial para lesionar órgãos e tecidos.

Nos pulmões, onde a batalha contra o Sars-CoV-2 é mais intensa, restam fibroses (uma espécie de cicatriz) que atrapalham a respiração. “Vem daí parte do cansaço. Alguns pacientes não conseguem realizar tarefas simples, como escovar os dentes ou tomar um copo d’água”, conta Marisa Regenga, fisioterapeuta e gerente de reabilitação do Hospital do Coração (HCor), em São Paulo/SP.

A fadiga e a dificuldade de fazer movimentos simples são alguns dos problemas mais comuns nos estudos. E não é só do pulmão a culpa. “As citocinas atacam os músculos, gerando dores e a sensação de fraqueza”, continua Marisa. O próprio sistema nervoso, que comanda o tecido muscular, pode ser afetado pela inflamação ou pelo próprio vírus, o que só piora a situação.

Para os internados, que tendem a sofrer uma perda muscular significativa, surgem desafios maiores. A diminuição da massa magra afeta a mobilidade e, ainda por cima, atrapalha o retorno do sangue dos membros inferiores para o coração – ora, são os músculos que o bombeiam para cima. Isso potencializa o cansaço e eleva a probabilidade de trombose, entre outras coisas.

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Falando em circulação, os vasos sanguíneos ficam abalados após a tempestade inflamatória. Até por isso, o risco de entupimentos que levam ao infarto e ao AVC aumenta. Não à toa, os profissionais às vezes receitam anticoagulantes por algum tempo.

Como recuperar o fôlego

O ideal é retomar as atividades aos poucos e, de preferência, com acompanhamento. Se sentir cansado faz parte da recuperação da Covid-19, mas o alerta deve soar se o desconforto for muito intenso. Queixas como náusea, palpitações, desmaios e tontura indicam que o pulmão não está funcionando adequadamente.

Programas de reabilitação cardiovascular são os mais adequados para atender os sobreviventes da Covid-19, pois treinam os músculos ao mesmo tempo em que renovam a capacidade respiratória. O olhar do expert em pulmão e coração é importante porque, não raro, há pequenos déficits que passam despercebidos aos olhos destreinados.

“Limitações podem ser subvalorizadas por profissionais não especializados, porque o indivíduo parece responder ao exercício, já que sua capacidade motora nem sempre foi afetada”, aponta Marisa.

A fisioterapeuta alerta para o perigo de uma situação desse tipo, que sobrecarrega o organismo: “Ele pode apresentar de cara um quadro grave, como uma arritmia por baixa oxigenação”.

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Além da reabilitação específica, outras medidas podem ser necessárias. “Às vezes, a pessoa fica dependente de oxigênio por semanas ou meses para compensar o comprometimento pulmonar”, aponta o intensivista Luciano Cesar Azevedo, do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo.

Cuide da mente depois da Covid-19 (em todos os sentidos)

O cérebro é um dos órgãos mais sensíveis ao excesso de inflamações pelo corpo e à queda da oxigenação. Um trabalho feito no Incor com 185 pessoas que contraíram o coronavírus mostrou que 80% manifestavam algum comprometimento cognitivo, como dificuldade de atenção e raciocínio, perda de memória e por aí vai.

Linamara vê esse o quadro em ao menos um terço dos sobreviventes que atende no Hospital das Clínicas da USP. De novo, a recomendação é procurar orientação.

“Se, depois da doença, você ficar com sonolência excessiva, deve passar por uma avaliação. O mesmo vale se ficar muito desatento, esquecendo as coisas ou trocando palavras”, aponta a neuropsicóloga Lívia Stocco Sanches Valentin, do Incor, autora do trabalho e criadora do MentalPlus, aplicativo que faz essa análise de maneira rápida e promove a reabilitação por meio de jogos.

O app já existia, mas está passando por uma repaginação para incluir um programa exclusivo para a síndrome pós-Covid, com o apoio da Organização Mundial de Saúde (OMS). Enquanto a solução tecnológica não chega, uma alternativa seria fazer o exame neuropsicológico, ou seja, uma bateria de questionários e testes físicos.

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Tendo em vista que ele não é tão acessível (raros centros públicos oferecem e nem todo convênio cobre), é possível recorrer a táticas para treinar a mente em casa mesmo. “Ler, escrever, fazer palavras cruzadas e manter a prática de exercícios físicos ajudam bastante”, elenca Lívia. Hobbies repetitivos e detalhistas, na linha do crochê e do tricô, também treinam a concentração e colaboram para a melhora.

Fora o déficit nas funções executivas do cérebro, sintomas psiquiátricos estão sendo relatados numa frequência razoável entre quem pegou o coronavírus. Aquela revisão publicada na Nature aponta que, em geral, ao menos 30% dos acometidos podem sofrer com depressão e ansiedade. Outros trabalhos apontam até para o risco de estresse pós-traumático.

“Todo o quadro é acompanhado de um processo emocional intenso, que interfere na recuperação do paciente e, por isso, não deve ser menosprezado”, destaca Linamara.

De volta ao eixo

Em centros de referência como o HCor e o Hospital das Clínicas, existem programas de reabilitação próprios para a síndrome pós-Covid. Neles, o indivíduo é acompanhado de perto por fisioterapeutas, fonoaudiólogos, psicólogos, médicos etc.

“Precisamos avaliar e tratar esses três domínios de distúrbios: cardiorrespiratórios, motores e cognitivos. Cada pessoa apresenta um conjunto de manifestações diferente”, destaca Linamara, que cuida dos indivíduos que passam pelo HC.

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Idosos e portadores de doenças de base merecem atenção especial, porque o organismo já debilitado sofre mais com as sequelas.

Se for pra ficar com uma mensagem na cabeça, guarde esta: não é normal não estar bem. Cientistas ainda estão verificando se certas sequelas podem ser permanente, porém a maior parte dos quadros tem se resolvido. Agir rápido e receber a assistência correta faz a diferença.

“Notamos que os mais velhos tendem a ignorar pequenos comprometimentos. Isso pode ter outras consequências lá na frente, então temos insistido para que as pessoas façam esse acompanhamento”, ressalta Linamara.

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