O câncer de ovário é o segundo tumor ginecológico mais comum no Brasil, ficando atrás apenas do cervical. Isso torna ainda mais preocupante o resultado do estudo realizado pelo Observatório de Oncologia, que mostra que 68% das brasileiras atendidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) são diagnosticadas quando a doença já está em estágio avançado.
A pesquisa se baseou em dados do Departamento de Informática do SUS (Datasus) e do Registro Hospitalar de Câncer (RHC) do Instituto Nacional de Câncer (Inca), entre 2014 e 2019.
O levantamento também revela que 37,3% das mulheres atendidas não possuem registros sobre o estadiamento da doença no momento da detecção – esse termo se refere ao processo que determina a localização e o grau de extensão do tumor no organismo.
O tempo médio entre a primeira consulta com o médico especialista e o diagnóstico foi de 45 dias, sendo que 31,2% das pacientes tiveram a confirmação após um mês.
Além disso, elas levam, em média, 44 dias para iniciar o tratamento após a descoberta. Apesar de o prazo estar abaixo do limite definido pela Lei dos 60 dias, que determina o tempo máximo para começar a terapia, cerca de 19% demoraram mais de dois meses nesse processo.
Na visão da especialista em saúde pública Ana Beatriz Machado de Almeida, pesquisadora do Observatório, mesmo com os avanços jurídicos, o SUS tem falhado em proporcionar assistência de saúde à toda a população feminina.
“Por mais que a Lei dos 60 dias tenha sido criada há mais de oito anos, ainda existem registros de pacientes que iniciam o tratamento para diversos tipos de câncer após o período estabelecido por lei”, comenta Ana Beatriz.
“Esses dados evidenciam a necessidade de aprimoramento, na prática, de políticas públicas voltadas aos pacientes oncológicos”, completa.
O desafio do diagnóstico precoce do câncer de ovário
A falta de informação e os problemas na estrutura da saúde pública não são os únicos responsáveis pelo tratamento tardio. Na verdade, a detecção precoce do tumor de ovário é um grande desafio.
A oncologista Juliana Pimenta, integrante do Comitê Científico do Instituto Vencer o Câncer, explica que o diagnóstico começa com a investigação de sintomas, como dor e aumento do volume abdominal, perda de apetite e emagrecimento. “Esses sinais não são específicos de câncer de ovário, mas servem de alerta”, explica a especialista.
O médico pede, então, exames de imagem e, caso encontre lesões suspeitas, solicita a biópsia para confirmar. “Como os sintomas geralmente aparecem quando a doença está numa fase mais avançada, a detecção no estágio inicial é menos comum”, conta a oncologista.
Infelizmente, não é possível implementar um programa de rastreamento, como existe para os tumores de mama e colo do útero. Até hoje, os exames de rastreamento pesquisados não se mostraram efetivos.
“Trata-se de uma enfermidade de crescimento geralmente muito rápido, em especial o subtipo mais comum, o adenocarcinoma seroso de alto grau. Isso acontece com a maior parte dos tumores malignos”, justifica Juliana.
O que fazer para controlar o aumento de casos
O levantamento do Observatório de Oncologia aponta que, segundo dados do Sistema de Informação Ambulatorial (SIA), 49,1% das mulheres atendidas se autodeclaram brancas, 31,7% pardas e 3,9% pretas. A informação está de acordo com o relatado pela Sociedade Americana do Câncer, que diz que esse problema é mais comum em mulheres brancas.
“Entretanto, é importante destacar que os fatores que aumentam o risco desse tumor são idade, questões reprodutivas e hormonais, histórico familiar, genética e excesso de peso corporal”, alerta Ana Beatriz.
A melhor forma de combater o problema é cultivar hábitos saudáveis e ficar de olho nos sintomas. “Assim que o diagnóstico for feito, é necessário começar o tratamento rapidamente, e em centros especializados na terapia multidisciplinar dessa neoplasia”, recomenda Juliana.
“O estudo é uma forma de propagar informações sobre um tipo de câncer que não é muito divulgado. Com isso, podemos levantar dados necessários para apoiar a gestão das políticas de saúde voltadas ao seu controle”, finaliza a pesquisadora do Observatório.