Numa conferência recente a estudantes, um dos participantes perguntou a Jorge Paulo Lemann se ele pensava em se aposentar. O empreendedor não titubeou: para ele, a resposta será sempre um “não”. Descansar é algo que nem passa por sua cabeça. Aos 80 anos, comemorados no último dia 26 de agosto, tudo o que ele quer é continuar fazendo o que sempre fez: falar sobre educação, seu tema preferido, estudar, trabalhar e, por último, mas não menos importante, jogar tênis.
O esporte é sua grande paixão desde a infância. Começou a jogar aos 7 anos, em 1946, e, ao longo da juventude, foi tenista profissional, disputando torneios mundiais como o de Wimbledon e a Copa Davis.
Para poder continuar jogando de maneira competitiva, Lemann se impõe uma vida espartana em prol da saúde e do bem-estar. O peso, por exemplo, está estacionado nos 66 quilos desde os 18 anos. O empresário nunca fumou. Quanto à bebida alcoólica, “nem pensar”, revela o acionista de uma das maiores cervejarias do mundo. Prefere mesmo um chá de camomila adoçado com mel.
Os anos de quadra e o intuito de continuar na ativa levaram o empreendedor suíço-brasileiro a passar recentemente por um lance mais radical. Na tarde de uma segunda-feira de agosto, ele, que costuma ser avesso a entrevistas, falou sobre a cirurgia complexa à qual foi submetido a fim de substituir as articulações do joelho (comprometidas pelo esporte) por próteses metálicas e personalizadas.
No dia 14 de fevereiro de 2019, Lemann fez uma artroplastia total de joelhos, procedimento em que estruturas articulares do fêmur e da tíbia são substituídos por um implante de metal feito com liga de titânio.
“Eu tive medo, claro, mas conversei com pessoas que haviam feito essa cirurgia antes e estavam muito bem”, conta Lemann. “Tinha fortes dores nos joelhos e não conseguia passar mais de 10 minutos em quadra. Era necessário”, lembra.
O empreendedor, que há 40 anos operou os meniscos (tecido responsável por absorver os impactos nos joelhos), foi o primeiro brasileiro a implantar tais próteses sob medida, com técnica inovadora, minimamente invasiva. O procedimento foi realizado na Suíça.
Por dentro da operação
Desenhadas especialmente para ele, as próteses foram o grande diferencial da operação. Ao contrário das convencionais, padronizadas de fábrica, escolhidas e encaixadas conforme a característica do joelho de cada um, as personalizadas visam restaurar ao máximo a biomecânica natural do paciente.
Depois de enviados exames e tomografia computadorizada à única empresa no mundo que as fabrica, em Boston, nos Estados Unidos, as próteses demoram cerca de 20 dias para ficar prontas. As partes metálicas são feitas por fusão de metal em moldes específicos para cada paciente, e os instrumentos necessários para a cirurgia (também produzidos com exclusividade) são feitos em impressoras 3D.
Feita com uma técnica inovadora e minimamente invasiva, com incisão de cerca de 12 centímetros, a cirurgia em cada joelho durou 75 minutos, em média. O método tem a vantagem de minimizar a agressividade cirúrgica e facilitar a reabilitação pós-operatória. “Essa abordagem ainda não é muito popular no Brasil”, contextualiza Leonardo Metsavaht, cirurgião ortopédico convidado a realizar a cirurgia junto ao médico suíço Sando Khol.
No caso de Lemann, as duas cirurgias foram realizadas com intervalo de quatro dias. No dia seguinte à primeira, o paciente obstinado já estava andando pelo corredor do hospital. “Ele é muito determinado, com excelente condicionamento físico e muito sensato. Isso ajuda bastante na recuperação”, diz Metsavaht, que é amigo do empresário há 12 anos.
A artroplastia de joelho clássica foi realizada pela primeira vez em 1968. Desde então, melhorias na técnica e nos materiais cirúrgicos aumentaram a segurança e a eficácia da operação. De acordo com dados da Agência Americana para Pesquisa e Qualidade em Saúde, mais de 600 mil artroplastias de joelho são realizadas por ano só nos Estados Unidos.
Pelo fato de as próteses, cujo valor estimado é de 30 mil reais, ainda não serem aprovadas pela Anvisa (Agência de Vigilância Sanitária) para comercialização no Brasil, o empresário passou pela cirurgia na Suíça. É lá, nos arredores de Zurique, que vive desde 1999 com a esposa Susanna e o três filhos mais novos (é pai de outros três).
Assim que saiu do hospital, Lemann ganhou de amigos tenistas um par de muletas em formato de raquetes de tênis. “Achei o maior barato”, conta. Pouco depois, já havia trocado a muleta estilizada por raquetes de verdade. “Com 60 dias eu já estava em quadra, e com 90 já completava algumas partidas.”
“Estou ótimo”, avalia, como quem desafia o adversário para um set.