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HIV: por que as complicações da aids ainda causam tantas mortes no Brasil?

Mesmo com tantos avanços no tratamento e na prevenção da infecção, cerca de 30 pessoas perderam a vida por dia em decorrência da doença no país em 2022

Por Lucas Rocha
Atualizado em 5 dez 2023, 16h13 - Publicado em 5 dez 2023, 15h56

Desde os primeiros casos de aids registrados no início da década de 1980, o mundo observou uma tremenda evolução no tratamento da infecção pelo HIV.

Dos primeiros remédios, que tinham efeitos colaterais significativos, até hoje, as opções foram evoluindo. O cenário atual inclui medicamentos muito eficientes, fáceis de serem tomados e menos eventos adversos.

Tanto que, atualmente, nem sempre as pessoas precisam de um “coquetel antirretroviral” para conter o HIV. Em muitas situações, a pessoa cuida da doença com um único comprimido por dia, que concentra diferentes princípios ativos.

É o caso do antirretroviral dolutegravir + lamivudina, que deve ser incorporado ao Sistema Único de Saúde (SUS) em breve. Além disso, a chegada da profilaxia pré-exposição (PrEP) e de outras estratégias preventivas tem ajudado a reduzir o contágio.

Mas se a ciência avançou a passos largos, não podemos dizer o mesmo do estigma, que ainda prejudica o acesso à saúde e, consequentemente, à adesão aos remédios ofertados gratuitamente no país.

Os números mostram na prática esse impacto. De acordo com o Ministério da Saúde, cerca de 30 pessoas morreram de complicações associadas à aids por dia em 2022.

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O diagnóstico tardio e a falta de tratamento são os principais fatores que empurram os infectados pelo vírus para o quadro mais grave da infecção, a aids.

“Apesar de tantas conquistas, não conseguimos vencer o preconceito e o medo que muitas pessoas têm da testagem. Além disso, o Brasil é um país enorme e com uma diversidade regional imensa, o que impacta no acesso ao diagnóstico e ao tratamento imediato”, afirma o médico infectologista José Henrique Pilotto, pesquisador do Laboratório de Aids e Imunologia Molecular do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz).

+ Leia também: HIV: 17% das pessoas com o vírus ainda não fazem o tratamento

O cenário brasileiro

Entre 2007 e 2023, foram notificados mais de 489 mil casos de infecção por HIV. Apenas em 2022, foram diagnosticadas mais de 43 mil novas transmissões.

Os dados mais recentes do Ministério da Saúde mostram melhora na mortalidade por causas associadas à aids no Brasil. Nos últimos dez anos, houve uma queda de 25,5% na mortalidade: de 5,5 para 4,1 óbitos por 100 mil habitantes.

Em 2022, foram registradas quase 11 mil óbitos por HIV. O número representa 8,5% menos do que os 12 mil óbitos notificados em 2012. Mas não é pouca coisa: equivale a cerca de 30 mortes diárias, como mencionamos acima.

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E aqui há uma grande desigualdade. Do total de mortes, 61,7% foram entre pessoas negras (47% em pardos e 14,7% em pretos) e 35,6% entre brancos.

“Quem ainda morre nesse contexto são principalmente pessoas pobres, pretas, periféricas e que não têm acesso ao serviço de saúde adequado”, pontua o médico infectologista Álvaro Furtado, do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP) e diretor da Sociedade Paulista de Infectologia (SPI).

Por que o HIV representa um risco?

O HIV ataca o sistema imunológico, que defende o corpo contra doenças. Ele mira especialmente em células chamadas linfócitos T CD4+.

Sem o tratamento, a infecção evolui para a síndrome da imunodeficiência adquirida, a aids. O quadro leva a uma queda da imunidade que deixa o indivíduo vulnerável a problemas oportunistas que podem se tornar fatais, como tuberculose, pneumonia, toxoplasmose, hepatites virais e alguns tipos de câncer.

De 1980 até junho de 2023, foram confirmados 1,1 milhão de casos de aids no Brasil.

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Em dez anos, houve uma queda de 20,8% na taxa de detecção. Apesar da melhora, o ministério destaca o desenvolvimento da doença entre os jovens. Mais de 52 mil pessoas com HIV entre 15 e 24 anos evoluíram para aids entre 2012 e 2022.

“Ainda fazemos diagnóstico tardio de pacientes. Eles chegam com imunodeficiência avançada e diversas infecções oportunistas, principalmente a tuberculose”, afirma Pilotto.

+ Leia tambémHIV: 17% das pessoas com o vírus ainda não fazem o tratamento

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No Brasil, 90% das pessoas que vivem com HIV conhecem seu status, 81% delas estão em terapia antirretroviral (Foto: Rodrigo Nunes/MS/Divulgação)

Barreiras na adesão ao tratamento

O enfrentamento do HIV no mundo considera as chamadas metas globais 95-95-95, estabelecidas pela Organização das Nações Unidas (ONU).

O conceito visa alcançar índices de 95% dos casos existentes diagnosticados, 95% destes casos em tratamento e 95% destes indivíduos com a carga viral suprimida, um ponto essencial para a qualidade de vida e redução da transmissão.

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Até o momento, o objetivo foi atingido por países como Botsuana, Essuatíni, Ruanda, República Unida da Tanzânia e Zimbábue.

No Brasil, 90% das pessoas que vivem com HIV conhecem seu status, 81% delas estão em terapia antirretroviral e 95% atingiram a carga viral indetectável.

De acordo com o Relatório de Monitoramento Clínico do HIV, do Ministério da Saúde, as mulheres apresentam piores desfechos em todas as estatísticas. Enquanto 92% dos homens estão diagnosticados, apenas 86% delas detectaram o HIV. E, se 82% dos homens recebem tratamento antirretroviral, só 79% das mulheres tomam a medicação.

Apesar dos remédios serem ofertados gratuitamente pelo SUS, com uma lista ampla de esquemas terapêuticos, o país ainda enfrenta desafios para a adesão.

Aqui, mais uma vez, o estigma aparece, porque a preocupação com ter a sorologia exposta ainda afasta do tratamento. Nesse contexto, é comum que pacientes retirem os rótulos dos frascos para que ninguém veja, por exemplo.

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O infectologista ainda reflete sobre o atendimento nas unidades de saúde. “É comum que as pessoas não voltem mais por não se identificarem com a abordagem dos profissionais. Em diversos locais existem situações de preconceito e julgamento”, explica.

“Precisamos melhorar as campanhas de educação e conscientização, principalmente dos jovens, para que façam testagem regular e prevenção combinada, além de buscar estratégias para aumentar a adesão ao tratamento. Também é necessária a contínua capacitação dos profissionais nos postos e unidades básicas de saúde”, diz o pesquisador da Fiocruz.

Álvaro Furtado, infectologista do Hospital das Clínicas, destaca que a pandemia de covid-19 levou a um aumento na desistência da terapia.

“Questões de saúde mental como ansiedade e depressão também são associadas ao abandono. Por isso, os serviços precisam se articular para buscar pacientes faltosos”, diz Furtado.

O Ministério da Saúde destaca que, em 2023, aumentou em 5% a quantidade total de pessoas em tratamento em relação a 2022, totalizando 770 mil indivíduos.

Avanços e conquistas

O desenvolvimento científico nas áreas de prevenção e tratamento do HIV avançou bastante nos últimos anos, com resultados implementados em políticas de saúde pública.

É o caso da profilaxia pré-exposição (PrEP), que reúne medicamentos para prevenir o contágio pelo vírus (leia mais aqui).

“Na área de prevenção, as pesquisas evoluem para a possibilidade de disponibilizar PrEP injetável, o que permite uma ação prolongada e favorecendo a adesão”, pontua Pilotto.

No campo do tratamento, os avanços facilitam a obtenção do status de indetectável, quando a pessoa não transmite o vírus e nem adoece por conta dele.

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