Fumar maconha (na forma de um cigarro ou no vaporizador) pode colocar o coração em risco, sugere uma revisão publicada pela Associação Americana de Cardiologia (AAC). Entre as ameaças, o artigo destaca alterações no organismo que abalariam a saúde cardíaca e mesmo possíveis interações negativas com medicamentos.
A busca por evidências científicas na área tem como pano de fundo o aumento no uso da planta nos Estados Unidos. Mais de 2 milhões de pacientes com males cardíacos fumam maconha de forma recreativa ou terapêutica no país, calculam os autores.
“As evidências ainda são modestas, mas há dados suficientes para recomendar cautela no consumo aos pacientes em alto risco cardíaco, como os que já infartaram ou têm arritmias”, comentou à imprensa o cardiologista Muthiah Vaduganathan, um dos autores do levantamento. Ele atua no Brigham and Women’s Hospital, entidade ligada à Universidade Harvard (EUA).
Interação entre remédios e a maconha
Medicamentos famosos para doenças cardíacas entraram na revisão. As estatinas, que baixam o colesterol, podem ter seu nível em circulação aumentado quando usadas junto com a maconha. Isso, por sua vez, eleva o risco de reações adversas.
O problema é parecido com os anticoagulantes, empregados para prevenir infartos e AVCs em certas situações. Esse tipo de informação, além de servir como um alerta, ajudaria os médicos a ajustar a dosagem dos fármacos caso o paciente fume maconha e não deseje parar.
Bloqueadores de canais de cálcio, indicados para hipertensão e outras doenças cardíacas, também seriam afetados pela planta. Mas há poucos dados sobre o assunto.
Os riscos diretos da maconha para o coração
Entre os possíveis malefícios estudados, estão as arritmias cardíacas — quando o peito bate fora do ritmo. Diversos tipos desse quadro, de fibrilação atrial à taquicardia, já foram associados à cannabis.
Suspeita-se que isso ocorra por um estímulo do sistema nervoso adrenérgico, que controla o funcionamento do coração e dos vasos sanguíneos.
Os princípios ativos da maconha parecem ainda superativar as plaquetas (moléculas que, em excesso, formam trombos com potencial de entupir a circulação). Indiretamente, a droga também danificaria as paredes das artérias.
O lado positivo
Paradoxalmente, a ciência está de olho em possíveis benefícios da maconha para a saúde cardiovascular. A própria revisão da AAC menciona estudos epidemiológicos que sugerem efeito protetor contra o ganho de peso e suas subsequentes alterações metabólicas.
Outro achado, de uma pesquisa clínica randomizada do tipo duplo-cego (onde nem o voluntário nem o profissional de saúde sabem se estão aplicando o remédio ou placebo), é de que um de seus compostos, o THC, contribui para a redução dos níveis de glicose em jejum. E taxas menores de glicemia sugerem um risco reduzido de diabetes.
Limitações
Vale dizer que a maior parte dos estudos incluídos na revisão americana é observacional. Essas pesquisas apenas firmam uma associação entre dois fatores, sem estabelecer necessariamente uma relação de causa e efeito. Em outras palavras, talvez um fator escondido esteja por trás dessa ligação entre maconha e problemas cardíacos.
Outro ponto é que os estudos levam em conta a frequência de fumo relatada pelos usuários. Isso aumenta o risco de confusões.
Como há cada vez mais usuários de maconha e sua importância como medicamento cresceu nos últimos anos, será preciso fazer investigações mais aprofundadas sobre seus efeitos colaterais.
Até mesmo porque ninguém sabe exatamente quanto um “baseado” tem de THC ou CBD, os dois princípios ativos mais presentes na planta. E isso faz toda a diferença na hora de calcular seus efeitos no organismo.
Uma pesquisa científica que poderia ultrapassar esses obstáculos ainda esbarra em tabus e regulamentações de certos países que proíbem o uso da planta até para fins acadêmicos.