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Coronavírus: o que a suspensão do estudo com a vacina de Oxford significa

A pesquisa com uma das vacinas em estágio mais avançado para a Covid-19 foi suspensa após um possível efeito colateral grave. Quais as repercussões disso?

Por Theo Ruprecht
Atualizado em 10 set 2020, 12h41 - Publicado em 9 set 2020, 12h36

Após iniciar em junho a fase 3 de pesquisas clínicas (a última etapa necessária antes de obter uma aprovação oficial), a vacina da Universidade Oxford e da farmacêutica AstraZeneca contra o coronavírus sofreu um revés. Um possível caso de efeito colateral grave foi registrado no Reino Unido, o que motivou a suspensão do estudo, como mostra VEJA. Mas o que isso significa na prática e quais as consequências da medida?

Começando pela reação adversa: não há um posicionamento oficial sobre exatamente o que teria acontecido com o voluntário. Segundo o NY Times, uma fonte anônima alegou que se trataria de um caso de mielite transversa — uma síndrome inflamatória que afeta a medula espinhal e pode ser provocada por vírus (inclusive pelo coronavírus em si). Cabe destacar que essas interrupções são relativamente comuns em experimentos desse tamanho – e, muitas vezes, não dão em nada. Em comunicado, a Anvisa disse que “o procedimento está previsto”.

No seu perfil do Twitter, a epidemiologista brasileira Denise Garrett, vice-presidente do Sabin Vaccine Institute, afirma: “Não sabemos o tipo de evento adverso detectado. Sabemos que é grave. De acordo com o FDA, um evento adverso é grave se envolve morte, risco de vida, hospitalização, incapacidade significativa, ou se requer intervenção médica para prevenir um desses resultados”.

Ponto importante: não dá pra saber se esse caso está realmente ligado à vacinação, ou se foi apenas uma coincidência. E, mesmo que o imunizante realmente tenha disparado o efeito colateral grave, os cientistas precisam analisar o caso para verificar quão comum ou rara seria uma manifestação dessas — e aí pesar, junto com as autoridades, os potenciais riscos e benefícios.

No Brasil, 5 mil voluntários estão sendo avaliados — boa parte já recebeu as duas doses contra a Covid-19. Até o momento, problemas como esse não foram reportados.

“O episódio mostra que as partes envolvidas na pesquisa com a vacina têm um bom sistema de detecção de possíveis efeitos adversos. Isso tem que ser usado como exemplo. Se outros estudos com outras candidatas à vacina apontarem algo assim, é um dever parar temporariamente o trabalho para entender o que está por trás disso”, afirma o virologista Paulo Eduardo Brandão, da Universidade de São Paulo.

A vacina de Oxford e da AstraZeneca é feita com um tipo de adenovírus modificado. Esse vírus carrega um pedaço do material genético do Sars-CoV-2, o que, no fim das contas, estimularia o organismo a produzir anticorpos e outras formas de defesa contra a Covid-19. “Mas as vacinas não possuem só partículas virais. Há outros componentes químicos que ajudam a reforçar a resposta imune”, conta Brandão.

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De acordo com o especialista, é possível que esses outros itens da receita da vacina tenham disparado o efeito colateral grave, se é que ele foi provocado pela injeção. Se for o caso, uma mudança na fórmula colocaria o imunizante de volta no páreo — com um atraso, é verdade.

A suspensão vai atrasar um eventual lançamento da vacina de Oxford?

Certamente, mas não se sabe quanto. Nenhum voluntário a mais será recrutado até a finalização de uma investigação minuciosa. “Quem já recebeu as doses como parte do estudo segue sendo monitorado. Os pesquisadores agora vão entender mais a fundo o sintoma apresentado, verificar se ele pode ter a ver com a vacina e avaliar outros possíveis casos semelhantes entre os voluntários”, esclarece Brandão.

Ou seja, o experimento não para por completo, mesmo com a suspensão. Alguns dados continuam sendo coletados, o que pode minimizar um pouco o atraso.

Se ficar confirmado que a reação adversa não foi provocada pela vacina de Oxford — ou mesmo se os experts notarem que ela resultou de uma interação com alguma particularidade única da pessoa afetada, que não se repetiria em outras situações —, aí volta-se a selecionar mais voluntários para finalizar a pesquisa.

“Vacinas em fase 3 possuem mais ou menos 80% de chance de serem bem-sucedidas, mas existe o risco de não cruzarem a linha de chegada. Por isso, a fala de Eduardo Pazuello [ministro interino da Saúde] [..] mostra que ele não entende nada sobre produção de vacinas ou que não tem compromisso com a verdade”, critica Denise, de novo via o Twitter.

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No dia 8 de setembro, Pazuello previu que, em janeiro de 2021, “a gente começa a vacinar todo mundo”. Justiça seja feita, o ministro interino da saúde não é o único político a cravar datas para a distribuição de um imunizante. A suspensão do estudo da vacina de Oxford — um procedimento relativamente rotineiro em trabalhos do tipo — ressalta o que muitos especialistas já preconizavam: as pesquisas não têm um prazo exato para serem finalizadas. Em outras palavras, não há dia exato para iniciar uma vacinação em massa, até porque não há certeza de que os produtos em teste sejam eficientes e eficazes.

É verdade que previsões como essas podem ajudar a realizar os preparos de infraestrutura necessários para, caso surja realmente a aprovação de uma vacina, sua distribuição ocorra quanto antes. No entanto, elas não deveriam virar promessas políticas, muito menos campanhas eleitorais.

“A gente está vendo uma pressão para acelerar estudos que não é compatível com uma ciência de boa qualidade. Há um claro interesse político-eleitoral, não só no Brasil. Isso pelo visto não afetou a vacina de Oxford”, aponta Brandão.

Por último, cabe destacar que há outros imunizantes em fase avançada de testes, inclusive no Brasil. A notícia atual preocupa, porém não é motivo para pânico.

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