As farmacêuticas Abbott e Roche e a empresa Siemens Healthineers estão trazendo para o Brasil exames sorológicos mais eficazes no combate à Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus (Sars-CoV-2). Estudos revelam que eles são consideravelmente mais precisos do que as outras versões disponíveis até então e do que os chamados testes rápidos. Essa segunda geração alcançaria até 100% de sensibilidade, se indicada no intervalo de tempo correto.
Mas o que são testes sorológicos e quando você deveria realizá-los pensando na pandemia? De acordo com o microbiologista Maurício Lacerda Nogueira, da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (Famerp), estamos falando de exames que, em geral, recorrem a amostras de sangue para detectar a presença de anticorpos produzido pelo organismo contra vírus, bactérias, fungos…
Para simplificar, existem dois grandes grupos anticorpos: as imunoglobulinas das classes M (IgM) e G (IgG). Essas proteínas, fabricadas quando um agente infeccioso invade o corpo pela primeira vez, são uma forma de proteção natural.
A maior concentração do anticorpo IgM acontece entre cinco e sete dias da infecção por coronavírus. Já o IgG demora mais para ser produzido — ele atinge seu pico no 14º dia da doença e permanece no corpo por um longo período. “Sua presença significa que você foi vacinado ou que já entrou em contato com o vírus há algum tempo”, conclui Nogueira.
Trocando em miúdos, os exames sorológicos não são muito úteis para firmar um diagnóstico precoce do coronavírus, uma vez que apresentamos poucos anticorpos contra ele nos primeiros dias após sua invasão. O exame ideal para realizar assim que os sintomas surgirem é o RT-PCR. Através de uma amostra retirada da cavidade nasal ou da garganta, o método identifica a presença do Sars-CoV-2 em si — ou melhor, do RNA viral dele (seu código genético, assim por dizer).
Os testes sorológicos, além de servirem como complemento para o RT-PCR, são úteis para verificar se uma pessoa contraiu o vírus no passado e desenvolveu anticorpos contra ele, o que sugere algum grau de proteção contra uma possível reinfecção. Também são empregados em pesquisas epidemiológicas que quantificam a incidência do coronavírus em determinada população.
Tanto o produto da Siemens como o da Roche medem os anticorpos IgM e IgG, mas não discriminam qual deles foi detectado na amostra. “Gostaríamos de ter um com essa habilidade”, comenta o Nogueira.
O da Abbott, por outro lado, concentra-se na presença da IgG. “É um avanço, porque conseguimos saber a reação imunológica do indivíduo”, afirma o microbiologista. Por outro lado, em tese ele seria menos eficaz nos primeiros momentos da infecção.
Os três são realizados em laboratório ou hospitais. Eles atingem o máximo de sensibilidade, ou seja, praticamente 100% de capacidade de evitar um resultado falso-negativo, por volta do 14º dia após o contato com o coronavírus.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou o lançamento do modelo da Abbott recentemente. Segundo informações da assessoria de imprensa, os kits já estão nos laboratórios Hermes Pardini e serão oferecidos para hospitais de todo o Brasil.
O teste da Roche também está liberado por aqui. Gabriel Laurentis, gerente de Produtos de Doenças Infecciosas do laboratório, contou para Veja SAÚDE que os primeiros lotes devem chegar ao país nesta semana (a última de maio). “Pretendemos disponibilizá-los já na primeira semana de junho”, completa.
Já os da Siemens aguardam a aprovação da Anvisa. De acordo com a assessoria da empresa, isso está previsto para o começo de junho. O Brasil receberá, inicialmente, mais de 1 milhão de unidades no mesmo mês.
Em paralelo, espera-se que outros exemplares de segunda geração surjam pelo mundo em breve.
Como os novos testes sorológicos ajudarão a enfrentar a Covid-19
Nogueira conta que essa recente onda de exames chega para substituir os anteriores, com precisão consideravelmente menor. “A sensibilidade dos novos testes dá uma certeza maior sobre quem foi exposto. É uma notícia esperávamos ansiosamente”, aponta Nogueira.
Isso significa que dará para confiar mais nos resultados dos novos testes sorológicos. Outra vantagem: eles podem ser fabricados em larga escala. Portanto, há uma expectativa de serem oferecidos a um custo menor.
“Acho que eles vão ajudar a entender a situação brasileira. Mas a análise dos pacientes por si só não resolve. Os exames precisam vir junto com o distanciamento social”, dá o recado o microbiologista da Famerp.
Mais um tipo de exame para auxiliar na pandemia
O Grupo Fleury anunciou a criação de um método diferente para detectar o coronavírus. Ele se vale do uso da proteômica. Calma que vamos explicar.
Assim como RT-PCR, essa técnica identifica a presença do vírus em si (e não de seus anticorpos, como fazem os testes sorológicos). Ela também se vale de amostras obtidas da mucosa do fundo do nariz ou da garganta e é indicado para fechar um diagnóstico precoce, assim que os sintomas começam a aparecer.
Só que, em vez de identificar o Sars-CoV-2 pelo RNA viral, esse exame acusa proteínas presentes em sua superfície. “A tecnologia abre perspectiva para uma alternativa de testagem em massa com alto rendimento”, argumenta o infectologista Celso Granato, diretor clínico do Grupo Fleury, em comunicado à imprensa.
Entre os pontos positivos dessa inovação, está a de poder transportar o material coletado dos pacientes em temperatura ambiente, o que amplia o acesso a lugares distantes. E ela não depende dos mesmos insumos do RT-PCR — o que é ótimo em tempos de escassez de recursos.
O teste por proteômica já está disponível em certos hospitais e laboratórios brasileiros.