Aline Luiz Oliveira, de 25 anos, foi diagnosticada com leucemia linfoblástica aguda de células B em 2019. Natural de São Lourenço (MG), a estudante de Ciências Contábeis sempre encarou seu tratamento com otimismo. Mas mesmo depois de nove meses de quimioterapia, de um transplante de medula óssea com um doador 100% compatível, o câncer resistiu e voltou em 2021. O sentimento era de derrota, mas Aline conseguiu encontrar um novo caminho com a terapia celular CAR-T – que usou as suas próprias células de defesa para combater a doença.
A estudante recebeu a infusão das células CAR-T em fevereiro deste ano. As fortes dores nas pernas que sentia em decorrência da leucemia, que muitas vezes lhe impediam até de andar, sumiram em questão de 24 horas. Ela teve alta do hospital após 15 dias.
“Depois de uma semana, a gente viu excelentes resultados. Os exames começaram a mostrar que estava dando tudo certo, foi sensacional”, conta. No início, ela fez acompanhamento médico semanal, depois quinzenal, e hoje uma vez por mês. Os feedbacks continuam positivos.
Aline voltou à vida normal e consegue praticar exercícios físicos, um de seus hobbies favoritos. Recuperada, ela se lembra da desilusão em que se encontrava após a recidiva da doença.
“Quando você faz todo o tratamento disponível e acontece uma recaída, você acha que a vida não tem mais sentido, que não tem mais o que fazer. Mas aí veio a CAR-T. No começo não acreditei muito, mas conforme fui pesquisando, vi que em outros países já era um tratamento super avançado, de primeira linha, e comecei a ficar animada.”
O tratamento de Aline foi realizado no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP), a cargo do hematologista Renato Cunha e de sua equipe. A terapia CAR-T vem sendo desenvolvida e aplicada de forma experimental no Brasil há três anos, no Hemocentro de Ribeirão Preto, em pacientes que não responderam aos tratamentos convencionais.
Segundo a estudante, a terapia celular é mais prática e rápida e menos dolorosa. A sua única reação adversa foi febre, que logo foi controlada. Isso porque é comum as células CAR-T induzirem uma “tempestade de citocinas” no organismo, ou seja, uma resposta inflamatória intensa.
“Eu saí do hospital bem mais forte do que quando fiz o transplante. Após o transplante, eu fiquei muito fraca, anêmica. E com a CAR-T não: eu saí cheia de vida”, relata.
Sensação de liberdade
Após descobrir a leucemia, Aline teve que dar uma pausa em sua vida: na faculdade, no trabalho, na academia. Ela também ficou sem viajar, algo que gosta muito de fazer.
Mas aos poucos, após receber a terapia celular, ela foi retomando as suas atividades. Depois de dois anos sem ver o mar, visitou a praia. “Eu me senti livre, como se tivesse a minha liberdade de volta. A partir do momento que você tem restrições, você se sente presa. E aí quando você vê que você pode, é muito bom.”
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Acesso à CAR-T no Brasil
Na terapia celular CAR-T, o sangue do paciente é coletado e as células de interesse são isoladas em laboratório – no caso, os linfócitos T, do sistema imune. Essas células são modificadas geneticamente para se tornarem células CAR-T. Com isso, são capazes de reconhecer as células tumorais e destruí-las. As CAR-T são então reinseridas no paciente a partir de um processo semelhante à transfusão de sangue.
No mês de junho, o Instituto Butantan, a USP e o Hemocentro de Ribeirão Preto inauguraram duas unidades de produção da CAR-T, em uma parceria que ajudará a ampliar o acesso ao tratamento e, futuramente, disponibilizá-lo no Sistema Único de Saúde (SUS). Localizados em São Paulo e em Ribeirão Preto, os Núcleos de Terapia Avançada (Nutera) terão capacidade de tratar de 200 a 300 pacientes por ano – hoje, a aplicação da terapia é experimental e em pequena escala.
Aline participou da inauguração das instalações do Nutera-SP e acredita que muitos outros pacientes poderão acessar e se beneficiar da terapia avançada.
“Estou desde 2019 fazendo tratamento e conheci muitas pessoas que faleceram e não tiveram a mesma oportunidade que eu. Por todas essas pessoas, e pelas outras que estão vindo, é bom saber dessa iniciativa”, conclui.
*Este conteúdo foi produzido originalmente pela equipe de Comunicação do Instituto Butantan