Imigrantes e refugiados também têm direito à saúde
Esta população tem necessidades específicas e encara hoje dificuldades no acesso à assistência médica

Durante as Olimpíadas de Paris 2024, o mundo testemunhou os esforços de competição da Equipe Olímpica de Refugiados.
Esta equipe, formada por atletas forçados a abandonar seus lares, entes queridos e parte de suas identidades em seus países de origem, é uma das formas de utilizar uma plataforma de alcance global para lançar luz sobre a força e resiliência de indivíduos que enfrentam graves crises humanitárias para restabelecer suas vidas em novos territórios.
No entanto, o conhecimento público sobre os sofrimentos e lutas de imigrantes e refugiados ainda está muito aquém do necessário para construção de condições dignas de vida para essas pessoas.
Entre esses obstáculos, o acesso à saúde pública de qualidade é um dos mais críticos e frequentemente negligenciados. Apesar de avanços legislativos, as barreiras enfrentadas na tentativa de obter cuidados adequados ainda são significativas.
O imigrante-refugiado sofre com a falta de familiaridade com o sistema, o medo da deportação ao entrar em contato com instituições estatais, condições de vida precária, barreiras linguísticas e culturais ao lidar com os profissionais de saúde, além da perda de documentação e registros médicos prévios, como prontuários, exames complementares, carteiras de vacinação entre outros.
Além disso, muitas vezes essa população é vítima de estigmatização e discriminação. A soma de todos esses fatores resulta em uma grande diferença na qualidade dos cuidados que ela recebe quando comparada à população local.
É fundamental evidenciar algumas das principais barreiras encontradas, para que a sociedade seja capaz de perceber e, principalmente, agir. Assim, a disparidade no atendimento será cada vez menor, e as particularidades de um povo em fuga da violência serão compreendidas pelos profissionais responsáveis por atendê-los.
Quem são os refugiados?
O Estado brasileiro considera hoje principalmente duas categorias para indivíduos estrangeiros que adentram o território brasileiro: migrantes e refugiados.
Refugiados são aqueles que saem de seu país de origem devido a fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas, e não possam ou não queiram acolher-se à proteção de tal país ou regressar a ele.
Dados estatísticos levantados pelo Observatório das Migrações Internacionais em 2023, apontam que o Brasil examinou um total de 138.359 solicitações de reconhecimento da condição de refugiado, com destaque para os solicitantes venezuelanos, que somaram 112.644 pedidos, correspondendo a 81,4% do total analisado pelo Comitê Nacional para os Refugiados (Conare).
Além dos venezuelanos, outros grupos relevantes foram os haitianos (5,6%), cubanos (2,9%), angolanos (1,7%) e bengalis (1,2%).A análise regional mostra que a Região Norte do Brasil foi a região mais relevante no acolhimento de refugiados, concentrando 72,0% das solicitações.
Os dados mostram que a maioria dos migrantes são jovens, muitos com menos de 15 anos, reforçando a urgência de oferecer cuidados de saúde adequados, evitando o surgimento de agravos e complicações de doenças crônicas. É interessante também abordar a questão com uma visão nacional e regional, adaptando políticas de saúde para realidades locais.
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Desafios próprios
Além de ter que lidar com a questão psicossocial por deixar seu local de origem de modo forçado, o refugiado precisa aprender a se adaptar a sua nova realidade diária. Novo idioma, novo círculo social.
Esta população apresenta dificuldades no acesso a diversos serviços públicos. Além disso, tais pessoas perderam o acesso a serviços de saúde em seus países de origem e seus documentos médicos.
Também atrapalham as barreiras de idioma, de documentação e de conhecimento por parte dessa população ao seu direito de serem atendidos nos serviços públicos de saúde brasileiro.
Com tudo isso, o acompanhamento de condições crônicas ou até mesmo o tratamento de condições agudas torna-se muito difícil, o que constitui um problema importante, que exige intervenção por meio do sistema público de saúde, a fim de garantir a equidade, universalidade e integralidade em nosso sistema público.
Ao dar voz e visibilidade a essa causa, fica evidente o quanto ainda se sabe pouco sobre as questões básicas que afetam a vida diária dessas pessoa, que vivem um cenário de exclusão e isolamento.
Dessa forma, podemos refletir que, mesmo com histórias inspiradoras e os avanços legislativos, ainda há um longo caminho a ser percorrido para compreendermos toda a complexidade da experiência enfrentada por eles e também para garantir que tenham acesso a condições de vida dignas.
O crescente número de refugiados e migrantes que chegam em território nacional evidencia a necessidade de uma ação mais eficaz e humanizada para a sua inclusão.
*Paula Yuri Sugishita Kanikadan e Lisiane Maria Teixeira Bezerra Anton, docentes do Centro Universitário São Camilo, com apoio dos estudantes de medicina Christian Neves Vasconcelos, Isabella Kassamanian Afonso, Maria Luiza Reis Funchal, Pedro Lucas Pesseti, Rafaela Sgai Morel, Camila Naomi Cheruti, Giovana De Mattos Boscolo, Juliana Ruibal Garcia De Mori Lopes, Pauline Morón Rojas, Pedro Henrique Gonçalves Dilguerian, Sofia Cardoso De Paula, Carolina Boretti Nicolau Ferreira, Daniel Miotto Santos, Gustavo De Salvo Teixeira, Júlia Castelo Branco Vilar Silva, Lucas De Oliveira Santos, Marina De Matos Castro Rego, Gabriela Antunes De Jesus, Gabriela Zaffane Zambelo, Isabela Chicchi Ottolini, Jullia Almeida Menezes, Luiz Felipe De Melo E Silva Dias De Abreu, Maysa Oliveira Cesar.