Para muitos habitantes de grandes metrópoles, enfrentar o trânsito é parte do cotidiano. Em São Paulo, por exemplo, estima-se que a população gasta, em média, três horas por dia no trânsito, de acordo com a pesquisa “Mobilidade Urbana na Cidade”, realizada pela Rede Nossa São Paulo e Ibope, em 2019.
Isso é muito superior à média global, que é de aproximadamente uma hora por dia, segundo dados do TomTom Traffic Index.
Estar preso no trânsito, imerso em um mar de buzinas e cercado por poluentes atmosféricos, pode ser uma experiência mentalmente exaustiva, com uma série de consequências negativas para a saúde mental.
O primeiro grande impacto diz respeito ao estresse. Em 2017, um estudo publicado no American Journal of Preventive Medicine analisou mais de 34 mil trabalhadores canadenses e descobriu que aqueles que percorriam mais de 45 minutos para o trabalho tinham níveis mais elevados de estresse do que aqueles que faziam viagens mais curtas.
Esses trabalhadores também eram mais propensos a ter uma qualidade de sono ruim, o que, por si só, pode levar a uma série de problemas – que vão desde ansiedade e depressão até prejuízos na concentração e na produtividade.
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A poluição sonora é outro componente significativo que merece ser levado em conta.
O ruído constante das buzinas, dos freios e dos motores pode levar a um estado de alerta constante, abalando o sono e aumentando os níveis de estresse.
Uma pesquisa da Universidade de Oxford, publicada em 2020, indicou que a exposição prolongada ao ruído do trânsito está associada a altos níveis de ansiedade e depressão, ressaltando a necessidade de abordar esse tema.
Em terceiro lugar, o trânsito é uma fonte significativa de poluentes atmosféricos, como partículas finas e gases de escape.
Estudos indicam que a exposição a esses poluentes pode ter impactos diretos e indiretos na saúde mental.
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Uma pesquisa de 2019, publicada no JAMA Psychiatry, revelou uma ligação entre a exposição a longo prazo a poluentes do ar e um aumento no risco de desenvolver doenças mentais, incluindo, de novo, depressão e ansiedade.
Além disso, a violência no trânsito, seja na forma de acidentes ou de crimes (como assaltos), é uma realidade capaz de ter efeitos devastadores na saúde mental.
Pesquisas indicam que vítimas de acidentes de trânsito ou de crimes podem desenvolver transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), ansiedade, depressão, entre outros transtornos mentais.
Então, como podemos mitigar o impacto do trânsito na nossa saúde mental? Vou dar algumas dicas:
- Práticas de mindfulness: Uma pesquisa de 2018, publicada no Journal of Applied Psychology, mostrou que o mindfulness, ou atenção plena, pode ajudar a reduzir o estresse relacionado ao trânsito.Mindfulness envolve prestar atenção no momento presente, sem julgamento. Isso é particularmente útil no trânsito, pois ajuda a manter a calma mesmo em situações estressantes.
- Utilização de transportes alternativos: Optar por bicicletas ou caminhadas, por exemplo, é uma boa pedida. Além de evitar o trânsito e a poluição sonora, essa mudança promove a atividade física, que é conhecida por seus benefícios à saúde mental.
- Proteção contra a poluição sonora e do ar: Se o trânsito e a poluição sonora são inevitáveis, algumas medidas se mostram interessantes, como o uso de fones de ouvido com cancelamento de ruído e máscaras antipoluição.
- Flexibilidade no trabalho: Uma rotina mais flexível, com trabalho remoto ou horários de ajustáveis, por exemplo, podem ajudar a reduzir o tempo gasto no trânsito e, consequentemente, os seus efeitos negativos.
- Otimização do tempo de viagem: Utilizar o tempo no trânsito de forma produtiva é uma maneira de evitar o estresse. Isso pode envolver ouvir um podcast, aprender uma nova língua ou simplesmente aproveitar esse momento para relaxar.
- Contato com a natureza: Pesquisas têm demonstrado que o contato com a natureza traz benefícios significativos para a saúde mental. Sempre que possível, visite parques, matas, campos e fazendas. Isso parece ser um antídoto – ao menos parcial – para os efeitos negativos do trânsito sobre a saúde mental.
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É válido destacar que reduzir o tempo de deslocamento nas grandes cidades não é apenas um desafio individual, mas também uma questão de políticas públicas.
Diversos exemplos internacionais mostram que isso é possível e necessário.
A expansão da rede de ciclovias em Bogotá e a implementação do sistema de metrô em Copenhague são exemplos de intervenções que resultaram em uma menor dependência do transporte individual motorizado.
Além disso, a promoção de políticas de trabalho flexíveis e de teletrabalho por parte das organizações também tem papel crucial na redução do tempo gasto no trânsito, com efeitos benéficos para os trabalhadores.
Em face dos inúmeros desafios que o trânsito apresenta, é imprescindível reconhecer a amplitude do seu impacto na saúde mental e procurar estratégias ativas para mitigar esses danos.
Ao reconhecermos a extensão dos malefícios, podemos começar a tomar medidas contra eles.
A chave é encontrar estratégias que se adequem à nossa rotina e nos permitam navegar com o máximo de serenidade possível pelas demandas da vida urbana.
*Elson Asevedo é médico psiquiatra