Apesar de ser a segunda maior causa de morte no mundo, o acidente vascular cerebral (AVC) não tem recebido o merecido cuidado e atenção em tempos de pandemia. Levantamento recente da World Stroke Organization (WSO) aponta queda global de mais de 60% nos atendimentos do problema após o início do isolamento social.
Como vivemos num país continental, por aqui essa redução ficou entre 40 e 50%, dependendo do estado avaliado. Um cenário, de qualquer forma, bem preocupante.
Embora seja compreensível que as pessoas evitem procurar os hospitais por receio de se contaminar com o coronavírus, esse tipo de comportamento é inaceitável em relação a uma condição tão grave como o AVC. Para ter ideia, durante um evento desse tipo, cerca de 1,9 milhões de neurônios morrem por minuto. Daí a importância de procurar diagnóstico e tratamento o mais rápido possível.
Além das mortes causadas pelo AVC, ao redor de 50% dos sobreviventes passam a ter sequelas que levam à dependência parcial ou total de outras pessoas. Até 30% das vítimas desenvolvem algum tipo de demência nos meses seguintes. O atendimento médico precoce é crucial para que essas estatísticas não continuem tão drásticas.
Se o medo tem levado à negligência em relação aos sintomas da doença, fazendo com que as pessoas morram em suas próprias casas, há outro ponto de atenção a ser considerado. É bem possível que esses pacientes também não estejam cuidando da alimentação, que deve ser equilibrada, ou mesmo tenham abandonado a prática regular de atividade física — dois hábitos fundamentais na prevenção do AVC.
Pesquisas também apontam aumento do estresse e do consumo de álcool em razão da pandemia, outros fatores relacionados à condição.
É por tudo isso que criamos e divulgamos o movimento internacional #avcnãofiqueemcasa. O respeito ao isolamento social é fundamental para controlarmos o avanço da Covid-19, mas é preciso ficar atento aos sintomas do AVC e procurar ajuda médica nesse contexto.
Novos protocolos de manejo da doença já estão em prática nos hospitais privados e da rede pública do Brasil. Tais normas priorizam a segurança do paciente e da equipe médica no ambiente hospitalar para reduzir o risco de contágio pelo coronavírus.
De todos os acidentes vasculares cerebrais que ocorrem no mundo, 90% estão ligados aos seguintes fatores de risco: hipertensão, colesterol alto, diabetes, arritmias cardíacas, sedentarismo, obesidade, alimentação não saudável, álcool e drogas, tabagismo e depressão ou ansiedade.
Neste momento desafiador, é preciso redobrar a atenção aos sintomas do AVC, como:
- Perda da força muscular ou formigamento, principalmente nos braços, nas pernas ou de um lado do corpo
- Tontura, associada à falta de equilíbrio e coordenação motora
- Dificuldades de fala ou compreensão
- Perda parcial da visão
- Fortes dores de cabeça
Diante dessas circunstâncias, é necessário agir urgentemente, ligando para o SAMU (192) ou buscando o hospital de referência mais próximo.
Somente com a conscientização de que o AVC tem cura poderemos poupar vidas e todo o sofrimento relacionado às sequelas permanentes da doença. E isso segue valendo durante e após a pandemia.
* Dra. Sheila Martins é neurologista, vice-presidente da World Stroke Organization e fundadora da Rede Brasil AVC