O diabetes é uma doença que acomete cerca de 422 milhões de pessoas no mundo todo e é responsável diretamente por ao redor de 1,6 milhões de mortes por ano, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS). No Brasil, segundo a pesquisa Vigitel 2019 do Ministério da Saúde, a prevalência da doença na população é de 7,4%. Na visão da OMS, o número de pessoas com diabetes tipo 2 aumentou dramaticamente nas últimas décadas e há uma meta global acordada para conter o crescimento do problema até 2025.
O diabetes é uma condição crônica que acarreta níveis elevados de glicose no sangue. No decorrer do tempo, isso impacta severamente o coração, os vasos sanguíneos, os olhos, os rins e os nervos. O tipo 2 é o mais comum e atinge a população adulta quando a produção de insulina se torna insuficiente ou o corpo se torna resistente à sua ação. Já o tipo 1, que afeta mais crianças e adolescentes, está relacionado a baixa ou nenhuma produção de insulina pelo pâncreas, tornando obrigatória a reposição do hormônio.
O relatório “Global Report On Diabetes”, publicado pela OMS em 2016, destaca que as maiores causas de diabetes tipo 2 são sobrepeso, obesidade e inatividade física. De acordo com a Vigitel 2019, cerca de 55,4% da população brasileira apresenta sobrepeso e 20,3% dos brasileiros estão obesos. A mesma pesquisa aponta que 44,8% dos adultos em nosso país apresentam nível de atividade física insuficiente.
A má alimentação também ocupa um papel nessa história. A OMS reconhece que ela é um dos principais fatores por trás da obesidade e suas consequências. Nesse sentido, gera preocupação o elevado consumo de açúcar pela população, tanto é que a entidade internacional recomenda fortemente que a ingestão por crianças e adultos seja reduzida e corresponda a menos de 10% (preferencialmente 5%) do total de calorias da dieta.
Visando diminuir esse consumo, a OMS publicou em 2017 algumas propostas, tais como a realização de campanhas educativas, a taxação de bebidas contendo açúcares adicionados, a restrição de propaganda de certos alimentos e a reformulação de alguns produtos pela indústria. No Brasil, em 2018 foi assinado o primeiro acordo para redução do ingrediente nos alimentos entre o Ministério da Saúde e entidades do setor como a Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação (Abia). O acordo tem como meta a redução de 144 mil toneladas de açúcares dos alimentos e bebidas até 2022.
Onde entram os adoçantes
Uma alternativa ao açúcar é o uso de edulcorantes, aditivos alimentares definidos pela Anvisa como substâncias diferentes dos açúcares que conferem sabor doce ao alimento. São popularmente conhecidos como adoçantes. E podem ser considerados uma ferramenta útil na redução de açúcares e calorias nos alimentos e na dieta.
Ainda em 2015, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento publicou um decreto autorizando a fabricação de bebidas, caso de refrigerantes, refrescos e xaropes, com mistura de açúcar e edulcorantes, como uma ação emergencial visando à redução parcial do conteúdo de açúcar desses produtos. Isso faz parte de um esforço, contemplado nas propostas da OMS, de ajudar a população a ter opções com menos açúcar nas prateleiras — estratégia que passa por desafios dentro da indústria e pela aceitação dos consumidores.
O fato é que, pensando na redução de calorias, muitas pessoas fazem uso dos edulcorantes para minimizar a ingestão de açúcar e controlar o peso. Mas não é só. Eles também têm um papel no manejo do diabetes. E, nesse sentido, vale elencar alguns pontos reunidos pela International Sweeteners Association (ISA), organização internacional sem fins lucrativos que dissemina atualizações científicas sobre o assunto:
- Os adoçantes sem ou de baixas calorias demonstram ser seguros e podem ser usados como parte de uma estratégia para adultos e crianças gerenciarem o peso e o diabetes, como se posiciona a Associação de Diabetes do Reino Unido.
- Na mesma linha, o consenso da Associação Latino-Americana de Diabetes afirma que o consumo de adoçantes sem ou de baixas calorias é seguro dentro dos níveis de IDA (ingestão diária aceitável) e eles podem ser empregados como substitutos do açúcar na dieta para controle do peso e da glicose.
- Por fim, a Associação Americana de Diabetes conclui que o uso dos adoçantes promove redução na ingesta de calorias e carboidratos, proporcionando melhor controle glicêmico e do peso.
Além do posicionamento dessas entidades, é imprescindível destacar o rigoroso processo de avaliação dos adoçantes para confirmar sua segurança, que passa por estudos toxicológicos que apuram efeitos adversos no organismo. Diante de qualquer novo achado científico nessa área, os edulcorantes são submetidos à reavaliação. Tais produtos passam pelo aval de instituições do porte da FAO, o braço da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, e da OMS, responsável pela segurança dos edulcorantes e estabelecimento da IDA.
O processo para aprovar e manter o uso dos adoçantes em alimentos e bebidas baseia-se justamente nesse índice de ingestão diária aceitável. E eles estão entre os ingredientes mais amplamente avaliados pelas autoridades sanitárias, sendo autorizados em mais de 100 países, entre eles o Brasil.
Apesar de ter sua segurança aprovada por inúmeras pesquisas e agências ao redor do mundo, os edulcorantes constantemente são alvo de publicações na mídia e nas redes sociais relacionando seu consumo a doenças e eventos adversos à saúde. No entanto, tais apontamentos não têm alterado o status regulatório dessas substâncias. Os comitês internacionais que são referência consideram os adoçantes seguros nas condições previstas de uso. Portanto, são uma ferramenta para substituição do açúcar capaz de ajudar a controlar o peso e o diabetes.
O diabetes é um assunto sério e o alcance da meta global de contenção dos seus números depende de ações que mitiguem os fatores por trás da doença. Isso passa pelo estímulo à atividade física e pela adesão a uma alimentação saudável, com destaque para a redução no consumo de açúcar. Os adoçantes aparecem, assim, como um recurso de saúde pública. E a ciência e a tecnologia de alimentos têm colocado suas contribuições à mesa, oferecendo opções de edulcorantes cada vez mais diversas, seguras e acessíveis.
* Talita Fernanda dos Santos Andrade é engenheira de alimentos, mestranda em ciência de alimentos pela Faculdade de Engenharia de Alimentos da Unicamp (FEA-Unicamp), responsável pela área de assuntos regulatórios da FrieslandCampina Ingredients Latam e colunista do Blog Food Safety Brazil
Adriana Pavesi Arisseto Bragotto é engenheira de alimentos, mestre e doutora pela FEA-Unicamp, onde atua como professora na área de toxicologia de alimentos. É também coordenadora científica da Força Tarefa de Food Safety no International Life Sciences Institute (ILSI Brasil)