Do peito aberto à IA: uma breve história da cirurgia cardíaca
A evolução das técnicas tornou esse procedimento extremamente versátil e preciso, garantindo maior sobrevida aos pacientes

Do início do século 20 ao desenrolar deste século 21, poucos procedimentos passaram por tantos progressos como a cirurgia de coração.
Apesar de tentativas mais antigas, que começaram inclusive em animais, os primeiros passos dessa história foram dados pra valer na década de 1940, quando médicos conseguiram operar bebês com cardiopatias — em 1944, Baltimore, nos Estados Unidos, foi a sede de um tratamento inédito para uma condição que matava crianças precocemente.
A seguir, assistimos ao advento da circulação extracorpórea, um aparato que permitia operar com o coração parado, substituído temporariamente por uma máquina. A primeira cirurgia com esse suporte ocorreu em Boston, também nos EUA, em 1953 — data que é considerada por muitos a gênese da cirurgia cardíaca em si.
Alguns anos depois, em 1967, na Clínica Cleveland, um médico argentino, Rene Favaloro, realizou em solo americano a primeira ponte de safena, técnica que, depois de um grande corte no tórax, cria uma via para o sangue fluir melhor até o músculo cardíaco após constatar-se a presença de obstruções nas artérias que o irrigam.
No mesmo período, debutamos a era dos transplantes de coração. Em dezembro de 1967, na África do Sul, houve o primeiro da história, feito que seria repetido um ano depois no Brasil por Euryclides de Jesus Zerbini.
Em paralelo, cientistas americanos passaram a desenvolver os tão sonhados protótipos de um coração artificial.
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O Brasil sempre teve papel imponente na história da cirurgia cardíaca. O trabalho hercúleo de Zerbini, Hugo Felipozzi e Domingos de Moraes, por exemplo, foi fundamental para o progresso das técnicas e a formação de profissionais.
Adib Jatene foi pioneiro na correção de uma cardiopatia congênita potencialmente fatal, enquanto Enio Buffolo esteve à frente das primeiras cirurgias sem uso de circulação extracorpórea.
Da década de 1990 em diante, vimos a ascensão de técnicas minimamente invasivas, que permitem menor taxa de complicações pós-operatórias, e dos procedimentos de instalação de stents.
Com o célere desenvolvimento tecnológico que caracteriza o século 21, agora podemos pisar na sala de cirurgia com o apoio da inteligência artificial: o chamado machine learning, já largamente empregado, melhora a precisão das incisões e a tomada de decisão.
Junto à ciência de dados, conseguimos atestar e reproduzir estratégias bem-sucedidas na otimização dos resultados. No momento da operação, algoritmos validados nos ajudam hoje a mapear áreas do coração, analisar parâmetros em tempo real, visualizar imagens de exames e aperfeiçoar manobras com o uso de videoendoscopia ou robótica de forma remota.
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A cirurgia cardíaca não abandonou totalmente as técnicas de peito aberto, mas tornou-se extremamente versátil e precisa, prestando serviço tanto a recém-nascidos como a idosos. Prova de que as inovações científicas e tecnológicas, junto à dedicação humana, um dia podem fazer a diferença na vida das pessoas.
* Edmo Atique Gabriel é cardiologista e cirurgião cardiovascular, professor e coordenador do curso de medicina da Unilago, em São José do Rio Preto (SP)