Sentada no sofá da sala, Ana, de 82 anos de idade, aguardava ansiosamente o momento de receber sua neta. Uma das cuidadoras se aproxima dela e pergunta se está pronta. Após um ansioso “sim”, o rosto da neta e do bisneto aparecem na tela da chamada de vídeo.
Elas então conversam, sorriem, fazem planos para quando a pandemia do coronavírus passar e, então, poderão estar juntas novamente. Esperançosas e com saudade, se despedem e, em lugar dos abraços que eram dados ao final de cada visita, um “tchau, até amanhã, nos falamos novamente” encerra a conexão.
Há quase dois meses essa rotina tem se repetido, não apenas na vida de Ana, mas também entre os milhares de outros idosos que moram em Instituições de Longa Permanência (ILPIs). Ainda não há um número preciso em relação a quantas são as pessoas vivendo em ILPIs no país, mas as estimativas sugerem que deva haver mais de 70 mil, conforme indicado pelo IPEA.
Desde março, quando foi recomendado o isolamento social para proteger da Covid-19 as populações consideradas de risco, caso dos idosos, os contatos entre os moradores das também chamadas “casas de repouso” só podem ser feitos assim, a distância.
Telefonemas, chamadas de vídeo e, quando muito, contatos pelo portão das casas… Essas têm sido as saídas para aplacar as saudades e reduzir o sentimento de solidão, evitando que o distanciamento social gere o que podemos chamar de “isolamento emocional”.
Agora, o cancelamento das visitas presenciais é apenas uma das medidas de segurança para garantir a segurança dentro das ILPIs. As equipes de profissionais responsáveis pelos cuidados com os idosos nesses estabelecimentos tiveram de se preparar para adotar procedimentos de desinfecção e prevenção, que incluem o uso dos Equipamentos de Proteção Individuais (EPIs), conforme recomendado pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG), pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), pelo Ministério da Saúde e pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
Com a Covid-19, as ILPIs se tornaram “linha de frente” na batalha pela proteção dos idosos, tanto quanto os hospitais. Com a diferença de, por não serem tecnicamente instituições de saúde, não estarem muitas vezes bem preparadas para lidar com uma situação grave como esta. Portanto, devo dizer que as ILPIs merecem TOTAL atenção, pois assumiram o papel de “guardiãs” dos idosos, nesse cenário de luta contra um vírus silencioso.
E é exatamente por não serem instituições de saúde que muitas ILPIs têm sido impactadas. Ao redor do mundo, em países como Espanha, Portugal e Estados Unidos, temos assistido à infecção se espalhar rapidamente nesses locais, levando a morte a seus moradores.
Como o Sars-CoV-2 é conhecido exatamente por ser altamente contagioso, esse cenário tem se repetido mundo afora. No Brasil, já aparecem os primeiros relatos de ILPIs em que a infecção entrou e vitimou moradores e membros das equipes dos profissionais. Há casos reportados oficialmente em pelo menos sete estados: São Paulo, Espírito Santo, Rio de Janeiro, Acre, Santa Catarina, Paraíba e Mato Grosso do Sul.
A exemplo do que acompanhamos nos outros países que foram atingidos antes de nós, essa situação chocante não aconteceu do dia para a noite. A deterioração se deu dia após dia. E a porta de entrada para o agente infeccioso acaba sendo exatamente quem é vital para a assistência dos idosos: os profissionais que compõem as equipes das ILPIs, como enfermeiros e cuidadores.
Por isso, proteger e apoiar a equipe em casas de repouso é tão fundamental durante a crise. Embora estejam se esforçando ao máximo, muitos funcionários de instituições públicas e privadas carecem de recursos, treinamento e suporte técnico para o enfrentamento da pandemia. Sem falar no amparo do ponto de vista psicológico. Precisamos lembrar que, para os colaboradores das ILPIs, esses idosos são pessoas que eles conhecem e cuidam há anos.
Boa parte das pessoas que mora nas casas de repouso possui alguma dependência e doenças crônicas, assim como precisa do suporte dos cuidadores em suas necessidades básicas. Isso os torna ainda mais vulneráveis às complicações decorrentes da Covid-19.
No guia de Recomendações para Prevenção e Controle de infecções por coronavírus (SARS-Cov-2) em Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPIs), elaborado pela SBGG, há orientações importantes sobre como proceder quando há um caso positivo de Covid-19, seja entre algum membro da equipe, seja entre os residentes.
Nesse contexto, a vacinação contra a gripe, por exemplo, é indicada a todos, moradores e funcionários das ILPIs. Sabemos que não previne a Covid-19, mas reduz o risco de complicações por outras infecções respiratórias.
Hoje, já temos conhecimento de que indivíduos assintomáticos, ou seja, que não manifestam os sintomas da Covid-19, podem ser responsáveis por até dois terços dos casos. Embora seja recomendada a realização da testagem entre profissionais que atuam na linha de frente, no Brasil ainda há escassez de exames.
Diante deste cenário, é preciso que cada um de nós, dentro do seu contexto e possibilidade, possa levar a sério a orientação do isolamento social. É hoje a única medida de que podemos lançar mão para protegermos a nós, os nossos idosos e aqueles que cuidam deles diariamente, como ocorre nas ILPIs.
Precisamos nos conscientizar para que não experimentemos o que os outros países viveram, vendo dezenas de milhares de idosos de uma única vez tendo suas vidas ceifadas, rapidamente, por causa do coronavírus.
Recomendo fortemente que idosos em instituições evitem assistir a reportagens em que há relatos dos casos de mortes em massa nas casas de repouso. Essa é uma medida importante para poupá-los do desgaste emocional. Não é preciso aliená-los, mas, sim, mantê-los informados sobre o vírus, bem como conscientizá-los dos cuidados que precisam tomar para garantir sua segurança. Precisamos resguardar os idosos física e emocionalmente, como indico em uma coluna anterior do Chegue Bem.
Sigamos firmes e certos de que tudo isso irá passar. Até lá fiquemos em casa! Fiquemos bem.