Apenas uma pequena parcela da população escapa da lombalgia, a conhecida dor nas costas. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 80% das pessoas têm ou terão dor lombar em algum momento da vida.
A grande maioria dos casos está associada a problemas posturais. Isso, por sua vez, tem uma ligação direta com o estilo de vida moderno. Elenquei abaixo alguns fatores típicos dos nossos tempos, e que contribuem para a lombalgia:
- Trabalhar horas a fio à frente do computador sem fazer pausas para se movimentar ou mudar de posição
- Realizar tarefas em condições ergonômicas inadequadas
- Obesidade
- Sedentarismo ou, ao contrário, prática de atividades físicas sem o preparo adequado
Uma minoria das dores nas costas pode estar relacionada a outras causas, como doenças inflamatórias ou hérnias de disco. Mas atenção: muita gente tem hérnia de disco sem qualquer sintoma associado.
Quando procura atendimento com queixa de dor nas costas, o paciente pode até achar estranho se o médico não pedir um raio-X ou uma ressonância magnética. Mas o fato é que, na maioria das vezes, o diagnóstico pode ser feito apenas com base na avaliação física.
Exames de imagem só são necessários mediante sinais ou sintomas que sugiram outras causas, como irradiação da dor para os membros, perda de força, alterações neurológicas (por exemplo, perda de sensibilidade) ou esfincterianas (controle da urina ou das fezes). Nesses casos, o problema pode, sim, estar relacionado a uma hérnia de disco comprimindo algum nervo. E mesmo nesses quadros, apenas 5% a 7% dos pacientes têm indicação cirúrgica. Isso segundo o Dr. Mario Lenza, que é gerente médico da Ortopedia do Einstein e com o qual conversei para escrever este artigo.
Assim, o tratamento conservador é a regra para as dores nas costas. Isso significa fisioterapia, medicamentos e mudanças de comportamento.
A cirurgia é indicada somente quando há:
- Dores não controladas depois de três meses de fisioterapia e medicações
- Progressão de déficit neurológico ou das funções motoras
- Nos raros casos de síndrome da cauda equina, uma hérnia volumosa que comprime o canal vertebral e os nervos da parte mais final da coluna. Essa é uma operação de urgência, pois os nervos afetados podem não voltar mais ao funcionamento normal.
No entanto, a indicação cirúrgica é, na prática, muito mais comum do que deveria, como mostram os dados do Projeto Coluna, criado pelo Einstein em 2011. Trata-se de uma iniciativa que recebe pacientes encaminhados por algumas operadoras de saúde que tiveram indicação cirúrgica e desejam uma segunda opinião. A avaliação é feita por especialistas multidisciplinares (fisioterapeutas, fisiatras, neurocirurgiões, ortopedistas) do Einstein a partir de diretrizes baseadas em evidências científicas.
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Já foram avaliados cerca de 6 mil pacientes, com conclusões surpreendentes: 70% não tinham critérios para indicação de cirurgia e, sim, de tratamento conservador.
Igualmente surpreendente – neste caso de maneira positiva – é o índice de satisfação desses pacientes depois de um ano de tratamento (conservador ou cirúrgico): cerca de 90% estão satisfeitos ou muitos satisfeitos. Os indicadores que avaliam qualidade de vida, dor e função também são semelhantes nos dois grupos ao longo de todo o período de acompanhamento (4 anos). Ambos apresentam níveis igualmente positivos de melhora.
De tudo isso, podemos extrair duas conclusões. A primeira é que, independentemente da causa, a imensa maioria das lombalgias é diagnosticada clinicamente e resolvida com tratamento conservador – certamente uma boa notícia para aqueles 80% da população que têm ou terão dor nas costas. A outra é que pedir exames desnecessários ou indicar cirurgias que não deveriam ser realizadas é onerar o sistema de saúde e pode até causar dano.
Saudável, em todos os sentidos, é seguir as práticas baseadas em evidências científicas para fazer o diagnóstico correto e indicar o tratamento mais adequado para cada caso.