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Comer é muito mais do que ingerir nutrientes. Na receita de uma alimentação equilibrada, também há ingredientes comportamentais, emocionais, culturais e ambientais, como mostra a nutricionista Lara Natacci
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Uma nova visão sobre o guia alimentar brasileiro

Em meio a pedidos de revisão e defesas do documento do Ministério da Saúde, nossa colunista expõe seu ponto de vista sobre essa questão polêmica

Por Lara Natacci
Atualizado em 28 mar 2021, 19h04 - Publicado em 19 out 2020, 15h34
guia alimentar brasileiro
Guia alimentar brasileiro defende mais alimentos naturais como frutas e menos ultraprocessados.  (Foto: GI/Getty Images)
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A primeira versão do Guia Alimentar para a População Brasileira, publicada em 2006, apresentou propostas para estabelecermos uma dieta mais saudável para nossa população. Em 2014, as diretrizes foram revisadas, o que culminou na elaboração da segunda edição do documento, com o objetivo de expandir o conhecimento sobre alimentação entre os brasileiros.

Qualquer recomendação nutricional hoje tem de ser baseada em evidência científica e precisamos ter em mente que a nutrição é uma ciência dinâmica, com pesquisas e achados evoluindo constantemente. Isso se soma ao fato de que, com o passar dos anos, a população muda alguns hábitos alimentares, assim como mudam condições ambientais e sanitárias que podem repercutir em seu estilo de vida.

Dessa forma, as recomendações nutricionais devem se atualizar de tempos em tempos. Tanto é que, na maioria dos países, os guias alimentares passam por reavaliações a cada cinco anos. Assim, acredito que é válida uma revisão de conteúdo do nosso guia para que ele seja ainda mais efetivo na orientação nutricional dos brasileiros.

Um possível aprimoramento no documento atual é, de acordo com a revisão científica e a adequação às necessidades da nossa população, elaborar recomendações mais práticas e factíveis, alinhadas com a sustentabilidade e as demandas ecológicas. Essas recomendações, que miram também a prevenção de doenças, devem ser expostas de forma ilustrativa e lúdica, de fácil entendimento e aplicação no dia a dia.

Observando os guias alimentares de outros países, nota-se uma tendência de se voltar à educação nutricional considerando os grupos de alimentos e seu valor nutricional, forma já abordada no guia brasileiro de 2006 com a utilização da pirâmide alimentar. Alguns guias internacionais usam ainda a roda de alimentos para elucidar os componentes de um cardápio saudável.

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Uma boa iniciativa do guia alimentar de 2014 foi utilizar exemplos de refeições e lanches com fotos de pratos. Esse ponto pode ser ainda mais explorado, mostrando os grupos de alimentos para facilitar a compreensão sobre as suas diferenças e a proporção adequada a um prato equilibrado (no café da manhã, no almoço, no jantar e nos lanches intermediários).

Um exemplo prático seria: para o almoço e o jantar, divida seu prato em dois. Preencha metade dele com verduras e legumes, de pelo menos três cores diferentes. Para a outra metade, divida novamente em 2 e deixe 1/4 para as fontes de carboidratos e 1/4 para as proteínas, de origem animal e/ou vegetal.

No café da manhã e nos lanches, inclua sempre uma fruta (opte por frutas diferentes ao longo da semana) mais um alimento do grupo dos carboidratos e outro representante das proteínas. Com essas indicações e exemplos, fica mais fácil demonstrar a importância e viabilizar o consumo de verduras, legumes e frutas, algo que precisa se ampliar em nossa população, como defende o próprio guia.

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Processamento X valor nutricional

A classificação atual dos alimentos mantida pelo documento os divide de acordo com seu grau de processamento — divisão que encontra bastante controvérsia no meio científico — e não a partir do seu valor nutricional. Isso pode gerar algumas dúvidas na população. Às vezes, até os profissionais de saúde têm dificuldades com essa classificação.

De acordo com o European Food Information Council (EUFIC), o processamento consiste em qualquer método empregado para transformar o alimento fresco em um produto alimentício, envolvendo uma ou mais etapas, como a adição de componentes para estender a vida de prateleira ou a incorporação de vitaminas e minerais para incrementar a qualidade nutricional. Nesse sentido, a educação nutricional poderia se pautar mais pelo valor nutricional do que pelo grau de processamento.

Também é importante considerarmos que os alimentos industrializados vêm passando por processos técnicos visando melhorar seu valor nutricional — como a redução nos teores de açúcar, sódio e gorduras. O processamento também propicia segurança ao consumidor por meio da destruição de patógenos, além de garantir a qualidade sensorial e nutricional do produto. Com ele podemos assegurar abastecimento e reduzir desperdícios para atender um planeta de 6 bilhões de habitantes.

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Mas isso não significa que devemos abrir mais e mais espaço na despensa a alimentos industrializados. Precisamos continuar incentivando a ingestão de verduras, legumes e frutas e o preparo de refeições em casa como base de uma alimentação saudável. Essas recomendações têm um notório papel na promoção da saúde. Garantir acessibilidade a esses alimentos em todas as regiões do país constitui um desafio para a sociedade, que deve ser contemplado nas políticas públicas.

O consumo de alimentos ricos em gorduras saturadas, açúcar e sódio, e produtos indulgentes, mais ricos em calorias do que em nutrientes, pode fazer parte da nossa vida, desde que seja ocasional e em pequena quantidade, sempre associado a uma alimentação equilibrada e outros hábitos saudáveis.

O presente guia ainda aborda algumas orientações sobre comportamento alimentar muito pertinentes. Ele defende comer com atenção, em ambiente apropriado e, se possível, com companhia, assim como estimula o desenvolvimento de habilidades culinárias. São pontos cruciais para uma boa relação com os alimentos e que certamente devem continuar no documento.

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