Assine VEJA SAÚDE por R$2,00/semana
Imagem Blog

Virosfera Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO

O mundo também é dos vírus. E o virologista e especialista em coronavírus Paulo Eduardo Brandão, professor da Universidade de São Paulo (USP), guia nosso olhar sobre esses e outros micróbios que circulam por aí.
Continua após publicidade

Trabalho de detetive: as verdadeiras origens do coronavírus

Virologista estreia como colunista de VEJA SAÚDE explicando como realmente surgiu o vírus causador da pandemia de Covid-19

Por Paulo Eduardo Brandão
Atualizado em 17 set 2020, 15h05 - Publicado em 16 set 2020, 10h25

“Eliminadas as hipóteses improváveis, a que restar deve ser a verdadeira”. A frase do detetive Sherlock Holmes é a mais útil ferramenta para decifrar a maior polêmica sobre o novo coronavírus: afinal, qual é a sua origem?

O genoma do Sars-CoV-2 tem acidentes genéticos ausentes em outros coronavírus (há vários deles) e que só vieram à luz quando a receita molecular do vírus foi totalmente elucidada no início de 2020. Os elementos que compõem o genoma de um vírus — ou de um ser humano ou de uma planta — têm de funcionar de modo orquestrado, arranjados numa ordem correta, sem quebras ou atropelamentos em sua sequência. As peculiaridades do genoma do Sars-CoV-2 são o que dão a ele as características já observadas por aí: alta afinidade por células humanas, habilidade em produzir descendentes de forma viável e capacidade de causar uma doença respiratória que pode virar sistêmica.

O genoma dos coronavírus tem cerca de 30 mil bases em tamanho. É como um texto com 30 mil palavras, que devem ser escritas numa sequência correta para fazer sentido. Conseguir montar um coronavírus com todas essas letras e características tão precisamente ordenadas seria um trabalho com pouca chance de sucesso para nós, cientistas, o que torna a hipótese de fabricação do vírus em laboratório altamente improvável.

Na verdade, os coronavírus são comuns na natureza e têm nos morcegos seus hospedeiros preferidos. Os morcegos representam um quarto de todas as espécies de mamíferos no planeta. Estão presentes no mundo todo, exceto nos polos. E são fundamentais ao equilíbrio dos ecossistemas por serem polinizadores, disseminadores de sementes e comedores de inseto, por exemplo. Eles coevoluem com os coronavírus há milhões de anos sem sofrer prejuízos ou sintomas.

Mas alguns vírus podem pular de morcegos para a humanidade. Outros agentes infecciosos, como os vírus da raiva, do ebola, o nipah e o hendravírus, têm sua origem em morcegos e conseguiram se adaptar aos seres humanos ao longo de saltos entre espécies, podendo usar porcos, cavalos e outros animais como intermediários. É o que a gente chama de zoonose, uma doença transmissível entre humanos e outros bichos.

Os coronavírus da Sars (síndrome respiratória aguda grave) e da Mers (síndrome respiratória do Oriente Médio), detectadas em pessoas em 2002 e 2012, respectivamente, vieram de morcegos. Isso é um fato consolidado na comunidade científica internacional. Com o causador da Covid-19 não é diferente.

Com a velocidade com a qual foram obtidos os dados genéticos do Sars-CoV-2 mundo afora desde o começo da pandemia, descobrimos que o ancestral desse vírus já estava presente em morcegos do Sudeste Asiático desde a década de 1940 (pelo menos!). Seguindo a árvore genealógica dos coronavírus até hoje, o nascimento do Sars-CoV-2 é compatível com uma evolução esperada na natureza e sua adaptação para a espécie humana.

Durante essas décadas, o Sars-CoV-2 ancestral pode ter tido diversos encontros com pessoas, alguns sem sucesso para o vírus, outros levando a uma afinação do seu encaixe com as células humanas, mecanismo que lhe permite infectar nosso organismo. Aos poucos, o vírus ganhou força e aprendeu a ser transmitido entre humanos. Até que mutações genéticas decisivas resultaram na versão atual e “puramente humana”.

Continua após a publicidade

Mesmo a hipótese de um hospedeiro intermediário perdeu validade com os novos achados, livrando o pangolim, outro mamífero, de qualquer culpa. A necessidade de uma afinação contínua e a presença na natureza também tornam pouco provável a teoria de que o Sars-CoV-2 tenha escapado por acidente de algum laboratório de pesquisas chinês.

Encontros entre pessoas e morcegos não são incomuns. Contatos próximos podem expor as pessoas a fezes, urina e secreções respiratórias desses mamíferos. E elas podem estar repletas de vírus. Cavernas, árvores e abrigos artificiais como telhados podem propiciar esses encontros — que são fortuitos ou deliberados, como em uma atividade de pesquisa ou no caso de alguém que busque morcegos como alimento. A propósito: não é o hábito de comer morcegos em si que transmite o vírus, mas sim o contato durante a captura.

O novo coronavírus veio mesmo da natureza. Elementar!

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 2,00/semana*

ou
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Veja Saúde impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 12,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.