A nova onda dos chás: conheça tipos, benefícios reais e como preparar do jeito certo
Símbolo de tradição, aconchego e busca por saúde, cresce a procura por chás no Brasil! Entenda a história dessa bebida milenar e suas propriedades

O que é, o que é? A segunda bebida mais consumida no mundo (só perdendo para água natural), tem uma trajetória que remonta a 6 mil anos antes de Cristo e hoje movimenta um mercado bilionário? Sim, é a vez do chá!
Ou melhor, dos chás. Para uns, sinônimo de receita certeira da vovó; para outros, inclusive a nova geração, o hype do momento. Em casa, nas gôndolas e nos restaurantes, quentinho ou gelado, ele vem se popularizando.
No Brasil, faz jus às nossas heranças indígenas, embora os braços e paladares também estejam abertos a sabores do mundo inteiro — afinal, a diversidade é imensa.
O fato, líquido e cristalino, é que a demanda por infusões decolou nos últimos anos e o leque de opções, tradicionais ou inventivas, transbordou.
Enquanto a camomila e a erva-cidreira continuam com lugar cativo na despensa de uns, outros estão descobrindo o matchá, a versão em pó do chá-verde de alta qualidade que virou sensação em cafeterias na forma pura, com leite, em sobremesas ou junto a especiarias. Só o macthá, pasme, deve movimentar expressivos 4 bilhões de dólares pelo mundo em 2025.
E ele não vem sozinho. No Brasil, não só o termo “chá” saltou 120% nas pesquisas do Google na última década como esse mercado de pós, saquinhos e ervas mobiliza mais de 1 bilhão de reais ao ano.

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O crescimento na procura por aqui, aliás, é mais acentuado que o dos nossos vizinhos latino-americanos, que já tinham enraizado o costume de apreciar a bebida. Ainda somos um país dominado pelo café, fato.
Mas especialistas veem uma mudança de comportamento se desenhando, apoiada na busca por novos sabores e na conscientização sobre o autocuidado — é aí que os chás passam à frente de refrigerantes e bebidas alcoólicas, por exemplo.
“As pessoas ainda começam a beber chá pelas suas propriedades e benefícios, mas hoje se vê cada vez mais gente buscando infusões gostosas e aromáticas, transformando o consumo numa experiência”, diz Michel Bitencourt, sommelier de chás e CEO da Tea Shop Brasil.
Outra vantagem das infusões é a versatilidade. “Tem quem consuma quente, outros que gostam gelado ou em drinques. Dá para tomar em qualquer hora do dia, e, respeitando eventuais restrições, elas são liberadas para crianças, idosos e gestantes”, destaca Bitencourt.

Com esse potencial democrático — e uma miríade de efeitos e sabores —, o chá está com tudo.
Nesta reportagem, você vai conferir:
- A história milenar do chá: da China para o mundo
- O Mapa dos chás: maiores produtores e destaques
- Os diferentes tipos de chás “verdadeiros”
- Chás e infusões: iguais ou diferentes?
- Chá mate: a primeira infusão do Brasil
- A chegada da Camellia sinensis e o sucesso por aqui
- A derrocada do chá brasileiro e seu recente renascimento
- Como fazer um bom chá
- Passo a passo para preparar o chá (e o blend) perfeito
- Chá faz bem? Saiba os reais benefícios à saúde no chá
- Os perigos das falsas promessas terapêuticas
- Cuidados para o chá não fazer mal
- O futuro do chá no Brasil
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A história milenar do chá: da China para o mundo
O chá tem uma história literalmente milenar, como conta a enciclopédia recém-lançadaChá: Da Folha à Xícara, Como É Explorado e Apreciado pelo Mundo (Editora Senac — clique para comprar), da britânica Krisi Smith.
Apesar de ser consenso que os chineses inventaram a bebida, não se sabe ao certo quando exatamente isso aconteceu. No entanto, os registros mais antigos da planta Camellia sinensis — para os puristas, a base do autêntico chá — datam de cerca de 6 mil a.C.
Desde as origens, a bebida era recomendada por suas propriedades medicinais, tais como aliviar náuseas, melhorar o humor e espantar a fadiga.
A popularização da infusão, contudo, só ocorreu milênios depois, com a ascensão da religião budista. O cultivo se espalhou pelos monastérios chineses e o consumo se incrustou no seio das elites.
Não demorou muito para que monges budistas levassem a bebida ao Japão e ela se espalhasse pela Ásia, principalmente em países como Índia, Sri Lanka e Indonésia.
Daí, inclusive, sua íntima associação com a espiritualidade e a busca da harmonia física e mental.
Apenas no período das grandes navegações o chá finalmente chegou à Europa. No virar do século 16 para o 17, a Companhia Holandesa das Índias Orientais conduziu a bebida ao norte global e o comércio de chá acabou se tornando mais rentável que o de seda, porcelana e especiarias.
Assim o chá começou a ganhar o mundo.
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O mapa dos chás: maiores produtores e destaques

Quem são os maiores produtores e o que cultivam
- China – 14 542 600 t/ano. Os chás mais populares são o verde e o oolong — o chá-preto é produzido sobretudo para exportação.
- Índia – 5 969 000 t/ano. Maior produtora de chá-preto para máquinas do mundo — 60% do suprimento global.
- Quênia – 2 326 000 t/ano. O maior exportador de chá do mundo está na África — corresponde a 22% do mercado internacional.
- Sri Lanka – 1 400 000 t/ano. O único país capaz de cultivar chá durante todo o ano. Exporta 94% de tudo o que cultiva no território.
- Turquia – 1 300 000 t/ano. Produz principalmente chás-pretos, que são tomados quentes e com açúcar no país.
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Embora hoje se fale muito sobre a tradição inglesa de tomar chá, fontes históricas esclarecem que o costume se consolidou no Ocidente graças aos portugueses.
Devido à colônia lusitana na China, Macau, eles se apropriaram do hábito e disseminaram a cultura do chá pela península e as colônias ibéricas. Foi Catarina de Bragança, após casar-se com o rei inglês Carlos II, que levou o vício à Grã-Bretanha.
A corte e o povo abraçaram a ideia. Os britânicos popularizaram e desenvolveram seu jeitinho de apreciar o chá, criando blends como o English Breakfast (que mistura três ou mais variedades de chá-preto) e o ritual do chá da tarde, em que as xícaras recebem também leite e açúcar.

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Os diferentes tipos de chás “verdadeiros”
Da folha da Camellia sinensis se originam seis famílias de chás: verde, preto, branco, amarelo, oolong e pu’erh.
O sabor dos chás pode variar bastante e depende de uma combinação de fatores naturais (terroir e condições de cultivo), de processamento e de preparo.
Mas, a diferença básica entre os chamados “chás verdadeiros”, que rende sabores e aromas distintos e complexos entre si, é o processamento: algumas folhas são minimamente modificadas (caso do branco), outras são totalmente oxidadas (o preto) ou parcialmente oxidadas (oolong) e até envelhecidas e fermentadas (pu’erh).
“O Ocidente classifica o chá pela cor das folhas, enquanto a China categoriza pela cor do licor. O que chamamos de chá-preto por aqui, lá na China é chá-vermelho, o hong cha”, diferencia o sommelier de chás Benício Coura, CEO da Chá Dō, e-commerce que vende chás e infusões selecionados de vários países, como China, Japão, Alemanha, África do Sul e Brasil.
Ele explica que, independente do nome, quanto mais inteiras as folhas, mais caro e com o sabor mais apurado é o chá.
Mas, há plantações com diferentes objetivo: originar um chá mais industrial, artesanal, micro lotes exclusivos, folhas para fazer blends (misturas) de sabores, etc. Há um mar de possibilidades.
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Chás e infusões: iguais ou diferentes?
Tradicionalmente, apenas os preparos de Camellia sinensis são considerados chás de verdade, o resto seria tudo infusão.

Divergências à parte, os experts também lutam para desfazer a noção de que os chás originais são amargos.
“O amargor do chá-verde é elegante, não aquele que nos induz a fazer careta depois de tomar”, diz Coura. “Quem faz careta é porque preparou errado.”
O sommelier afirma que, inclusive, é mais fácil degustar e perceber notas diferentes entre chás do que nos cafés ou mesmo vinhos.
“No chá, quando eu falo que há uma nota de pêssego, você vai sentir sabor de pêssego ou algo muito próximo, é bem mais nítido”, exemplifica. “E esse aspecto mais palpável pode estimular as pessoas a se aproximar de bons chás.”
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Chá mate: a primeira infusão do Brasil
O novo apetite pelos chás chama a atenção porque, historicamente, o brasileiro não cultivou tanto o hábito de tomar a bebida.
E olha que não é preciso comparar a gente com a China ou a Índia. Basta olhar a vizinhança. “Enquanto os brasileiros consomem, em média, 23 doses de infusões por ano, os chilenos ingerem 160”, afirma Marcelo Correa, CEO da Leão, marca conhecida pelo mate e líder do setor de chás e infusões no Brasil.
Os ventos, no entanto, estão virando. “Nosso número parece incipiente, mas dobrou nos últimos cinco anos, confirmando que temos um mercado em expansão”, observa Correa. E, se não temos tanta tradição com o chá de Camellia sinensis, com outras plantas as coisas mudam de figura. A erva-mate é o melhor exemplo.
Podemos dizer que nossa história com as infusões começa para valer com o mate, que vem de uma espécie originária da América do Sul já apreciada pelos guaranis antes da colonização — eles louvavam suas propriedades energéticas.
O chimarrão e o tereré, ainda hoje populares e fontes de orgulho na porção sul do Brasil, foram variações que sedimentaram a erva na rotina e no imaginário.
Mas um divisor de águas na disseminação do consumo ocorreu com a chegada do mate tostado, lançado pela Leão em 1938.
A empresa, fundada em 1901, catapultou a bebida, que, geladinha (para combinar com o calor tropical), popularizou-se nas praias do Rio a partir dos anos 1950. Um segundo marco no setor ocorreu na década de 1980, quando a companhia lançou o mate gelado pronto para beber.
Na esteira do sucesso, vieram blends em saquinhos com outras ervas, como camomila, cidreira e o tradicional chá-preto. “A gente vem desenvolvendo durante todo esse tempo o consumo de chás e infusões no Brasil e o de erva-mate no exterior, buscando inovar sempre”, diz Correa.

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A chegada da Camellia sinensis e o sucesso por aqui
Bem, já deu pra perceber que a infusão favorita do brasileiro não é a dos clássicos preparos de Camellia sinensis.
Mas se engana quem pensa que não existe chá nacional — e um público ávido por ele.
Na verdade, o primeiro exemplar da milenar espécie trazido ao país veio com dom João VI e foi plantado no Jardim Botânico do Rio de Janeiro.
Apesar de a erva vingar, o cultivo não foi pra frente: o chá-verde puro chinês não agradou aos portugueses, que preferiam chá-preto importado e adoçado. Por falta de investimento, o negócio não prosperou.
Mas o chá fez uma reestreia por aqui no século 20, em São Paulo, com a imigração japonesa. A partir da década de 1930, quando foi plantada uma variedade indiana da planta que se adaptou bem ao solo do Vale do Ribeira, a produção cresceu, atingindo seu auge entre as décadas de 1950 e 1980.
Para você ter uma ideia, a região abrigou 5 mil hectares de chazal, 600 produtores e cerca de 42 indústrias fabricando 11 mil toneladas de chá por ano, a maioria destinada à exportação. Em 1984, Registro, no interior paulista, onde se concentravam os maiores chazais, foi proclamada por lei a Capital Estadual do Chá.
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A derrocada do chá brasileiro e seu recente renascimento
Mas o sonho do Brasil de se consolidar como uma potência do chá foi destroçado na década seguinte.
“Mudanças de planos econômicos afetaram drasticamente a paridade cambial, e o chá brasileiro perdeu competitividade no mercado internacional”, explica André Luis de Freitas, gerente comercial da Amaya, uma das empresas fundadas na década de 1930 em Registro.
“Muitas fábricas não suportaram essa pressão e acabaram fechando as portas. A Amaya se manteve firme devido à sua resiliência, se adaptando e mudando sua visão de longo prazo”, completa.
Com quase 90 anos de produção ininterrupta, a Amaya foi o único chazal a sobreviver. “O chá do Brasil não teve incentivo do governo quando mais precisou. A Argentina teve, e hoje é um dos maiores produtores mundiais”, compara Yuri Hayashi, fundadora da Escola de Chá Embahú, uma das únicas voltadas ao ensino e cultura dos chás no país.
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Há uma década, porém, assistimos ao renascimento do chá brasileiro. Antigos chazais do Vale do Ribeira ressurgem investindo em produção artesanal, como o Sítio Shimada e o Yamamaru.
“O chazal fundado pelo meu pai acabou sendo abandonado em 1994. Quando voltei com meu irmão Kazu ao sítio, em 2011, ele havia virado uma floresta. Temos Camellia Sinensis de 15 metros!”, afirma Miriam, uma das donas do Sítio Yamamaru. “Hoje plantamos chá num sistema agroflorestal, que contribui para a proteção da Mata Atlântica e ainda oferece chá de qualidade e uma experiência única a quem vem visitar”, completa a especialista, que fez curso de turismo rural e estudou sobre o processamento do chá-verde no Japão.
A Amaya hoje não exporta mais e se dedica totalmente ao mercado interno. “Notamos um interesse crescente por bebidas mais saudáveis, e os chás se encaixam nessa tendência. O mercado brasileiro vem amadurecendo rapidamente para a cultura do chá”, relata Freitas.

Diante desses novos tempos, para educar e estimular o consumidor brasileiro, o evento Rota do Chá, fundado por Hayashi e a também sommelière Renata Acácia, leva um grupo de pessoas a adentrar as platações em Registro e se aproximarem mais desse universo.
“Conhecer o chazal é transformador”, afirma Yuri. “Você vai saborear um bom chá, ver que existe Camellia sinensis no Brasil e entender que a tradição por trás do preparo da bebida é apaixonante”, resume.
Renata também chama a atenção para a evolução das famílias e do mercado de chás: “Ao longo dos 10 anos de Rota, é notório o amadurecimento dos negócios com chá de cada propriedade que visitamos, e como as famílias tem se desenvolvido e crescido para expandir ainda mais o chá brasileiro”, aponta a especialista.
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Como fazer um bom chá
O passeio também é uma forma de se munir de informações para preparar seu chá. Porque isso faz simplesmente toda a diferença.
“Digo que 50% do sucesso é responsabilidade do consumidor”, crava Hayashi. “É diferente de você comprar um vinho, que já vem pronto na garrafa fechada”, compara a expert.
Um dos principais erros, segundo os entendidos, é perder a mão na dose da erva. Receita certa para o amargor.
Outros pecados cometidos por muitos brasileiros que prejudicam o sabor: ferver a água demais e colocar o saquinho de chá e não tirar de lá.
O preparo exitoso começa pela água. Além de estar sempre filtrada, ela precisa esquentar a uma temperatura controlada, dependendo da variedade do chá. O tempo também é crucial: cada tipo exige um período específico de infusão, e, após aguardar, é necessário coar ou retirar o saquinho imediatamente.
“O chá-verde infusiona em no máximo dois minutos numa temperatura abaixo da fervura. Caso contrário, você pode amargar e até queimar o chá, resultando num gosto intragável”, avisa a sommelière de chás e erva-mate Luciana Reginato, presidente da Associação Brasileira do Chá (AbChá).
Ela explica que existe uma regrinha bem fácil de lembrar para nunca se equivocar:
- Quando você utilizar flores e folhas, faz por infusão: ferva a água, coloque o substrato, deixe por cerca de cinco minutos, coe e beba.
- Quando você usa sementes, raízes ou cascas, faz por decocção: coloque tudo pra ferver junto com a água, espere uns dez a 15 minutos, coe e beba.
- Para o chá da Camellia sinensis, o preparo será sempre por infusão, no tempo determinado para cada variação.
“Alguns gostam um pouco mais forte, outros um pouco mais fraco… Sabendo o básico, ninguém vai errar”, diz Reginato.
Para quem está aprendendo a tomar chás e ainda não se adaptou aos sabores dos puros, uma opção é começar pelos blends, que misturam a Camellia sinensis a outros ingredientes e especiarias, suavizando o gosto e adicionando aromas.
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Passo a passo para preparar o chá (e o blend) perfeito
Escolha da água
Encha a chaleira com água fria recém-filtrada ou água mineral, se desejar. Boa água é essencial ao bom chá.
Aquecimento
Após a fervura, despeje um pouco da água no bule vazio para aquecê-lo levemente. Em seguida, descarte essa água.
Quantidade de folhas
Adicione ao bule a quantidade necessária de folhas: 1 colher de chá cheia (2 g) por xícara, seja usando folhas, seja usando sachês.
Temperatura correta
A água deve estar entre 97 e 98°C para chás-pretos, mas outros tipos podem exigir temperaturas mais baixas, como chá-verde.
Ajuste das folhas
Se algumas ficarem flutuando, mexa delicadamente com uma colher para cobri-las, pois todas precisam estar submersas.
Tempo de infusão
Recoloque a tampa do bule e deixe o chá em infusão pelo tempo recomendado para o tipo de chá. Não deixe além; pode amargar.
Coar e servir
Quando o tempo acabar, coe o chá (se não estiver usando um infusor) diretamente na xícara. Isso pode ser feito com um coador.
Use a imaginação
Adicione, se desejar, açúcar, leite, limão ou outros complementos. Mas lembre-se: tomar chá puro é um exercício ao paladar. Prove!
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Chá faz bem? Saiba os reais benefícios à saúde
Depois desse mergulho pelos chás, com direito a um passeio pelos chazais do Brasil, imagino que você já esteja ansioso para saber sobre os reais benefícios para a saúde, não? A resposta mais honesta é: depende. Calma, vou explicar.
O chá tradicional de Camellia sinensis, por exemplo, tem quatro compostos: catequinas, cafeína, o aminoácido L-teanina e um punhado de minerais, como magnésio, zinco e potássio.
Não à toa, é estudado pelas propriedades antioxidantes — nesse sentido, quanto menos processado o produto, melhor; ponto para o chá-branco.
Em poucas palavras, ele defende nossas células de enroscos mais comuns com a passagem do tempo e, devido à pitada de cafeína, tem ação estimulante.
Consumido com equilíbrio, sim, ajuda a manter o organismo resguardado. Um raciocínio que se estende a outras infusões, que são inclusive contempladas pelo Guia Alimentar para a População Brasileira, do Ministério da Saúde.
“Elas fazem parte da cultura alimentar nacional e merecem ser valorizadas desde que estejam inseridas em um contexto de alimentação saudável e segura”, afirma Erika Carvalho, presidente do Conselho Federal de Nutrição (CFN). Erva-cidreira, camomila, hortelã, mate…
“Algumas plantas têm compostos com propriedades já reconhecidas pela ciência, como efeitos digestivos e calmantes”, expõe a nutricionista.

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Os perigos das falsas promessas terapêuticas
A questão é que a indústria da cura natural se aproveita dos chás para vender milagres — um fenômeno que não é recente, diga-se. E, na realidade, muitas das indicações por aí carecem do aval de pesquisas controladas.
Por isso, pode parecer contraintuitivo, mas exagerar em seus supostos benefícios só prejudica a cultura do chá.
Vamos pegar o macthá como exemplo. Enquanto algumas marcas, estabelecimentos e influenciadores ressaltam seu sabor e versatilidade, outros propagam que ele tem ação anticâncer, faz perder peso e controla o diabetes.
Será que faz tudo isso mesmo? Pode apostar que não. Transformar bebidas e alimentos em panaceia só prejudica sua reputação.
“Chá não é remédio”, sentencia Reginato. “Na AbChá, queremos promover o chá como uma bebida gastronômica e, sim, com possíveis benefícios no longo prazo. Mas não se trata de milagre”, esclarece a presidente da entidade.
“O problema é que, se alguém passa a dizer que tal chá faz bem contra o câncer ou outra doença, há o risco de alguém sem tanta instrução abandonar o tratamento sério para tomar só aquele preparo”, completa. O triste é que os vendedores de poções mágicas seguem comercializando falsas soluções por aí — na feira e nas redes sociais.
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Um dos maiores críticos desse mercado alternativo é o hepatologista Raymundo Paraná, professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia (UFBA).
Ele nota que é comum profissionais, empresas e influenciadores se arvorarem em um princípio ativo isolado de uma erva para alegar seus poderes surpreendentes.
“Só que cada planta e cada chá têm diversos compostos, que podem interagir com medicamentos e mesmo entre si”, adverte. “Um simples chá de boldo pode interagir com anticoagulantes e causar sangramentos, enquanto um preparo de cavalinha, vendido como anti-inflamatório e emagrecedor, interfere na ação de quase todos os medicamentos, podendo causar reações graves”, ilustra.
O professor é categórico: “A visão de que o natural não faz mal é completamente errada. O que é natural pode fazer muito mal por aí”.
Por essas e outras, se você usa medicamentos de forma recorrente ou tem uma doença crônica, é prudente consultar um profissional antes de tomar uma infusão, sobretudo para fins terapêuticos.
“É essencial ter conhecimento técnico e considerar cada caso, especialmente para evitar interações com remédios”, ressalta Carvalho. E lembrar que uma coisa é apreciar um chá após uma refeição ou no meio da tarde; outra, completamente diferente, é se encharcar de um preparo que “previne ou cura” qualquer moléstia.
Infusão derivada de folhas de chacrona (Psychotria viridis) e casca do cipó-mariri (Banisteriopsis caapi), é capaz de gerar efeitos mentais que alteram os padrões de percepção da realidade — daí a pecha de “alucinógeno” ou “expansor de consciência”. O chá é utilizado em rituais indígenas e xamânicos de diversas etnias brasileiras, e considerado sagrado para religiões como Santo Daime, União do Vegetal e Barquinha. Leis regulam seu consumo responsável, e hoje não é permitida a comercialização para uso individual. Efeitos colaterais relacionados ao mal uso incluem diversos graus de náuseas, vômitos, diarréias, e casos graves podem gerar arritmia, espasmos musculares, tremores e até convulsões. Estudos avaliam o potencial de baixas doses controladas para depressão e outros transtornos psiquiátricos.

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Cuidados para o chá não fazer mal
Bom senso e informação confiável permitem degustar sem risco
FAZ BEM | FAZ MAL | |
QUANTIDADE | Consumo moderado: de 2 a 3 xícaras por dia. O chá hidrata e oferece diversos antioxidantes. | Mais de 1 litro ao dia pode causar problemas como insônia, gastrite, taquicardia etc. |
PREPARO | Água filtrada, tempo e temperatura corretos evitam amargor. Prove sem adoçar. | Com folhas velhas, água muito quente ou tempo longo demais, pode até gerar intoxicação. |
FONTE | Compre de marcas confiáveis, de boa procedência ou com certificados orgânicos. | Ervas sem identificação clara podem conter impurezas ou mesmo plantas perigosas. |
RESTRIÇÕES | Infusões devem ser adequadas ao estado de saúde — na dúvida, consulte o médico. | Algumas ervas são contraindicadas a pessoas que tomam certos remédios. |
OBJETIVOS | Apreciado por prazer ou como complemento para relaxar, se hidratar e cuidar da saúde. | Quando é visto como “cura milagrosa” ou substituto de tratamento médico. |
O futuro do chá no Brasil
Sim, bom senso e parcimônia são ingredientes úteis a qualquer cardápio ou plano de autocuidado. Para a presidente da AbChá, até três xícaras por dia está de bom tamanho.
E está cada vez mais acessível ter boas experiências com chás no Brasil. Renata explica que o público do chá (principalmente o especial) não é novo: é o mesmo do vinho, do café, da erva mate e até da cerveja artesanal.
“São bebidas complementares, pois pessoas que valorizam a qualidade, o sensorial e o bem-estar com certeza apreciam um bom chá”, comenta a sommelière , dona da Infusorina, que oferece uma consultoria sobre chás para cafeterias.
“Enquanto o brasileiro não desenvolve totalmente a cultura própria de apreço aos chás, é importante que boas opções sejam oferecidas em cafeterias e outros espaços semelhantes. Por isso venho fazendo esse trabalho desde 2016”, afirma a expert.
E, aos pouquinhos, esse gosto pelo chá vai ganhando espaços próprios. A unidade da Tea Shop localizado no bairro Vila Madalena, em São Paulo, por exemplo, inaugurou uma Tea Room: um local só para você tomar chás, harmonizar com comidinhas e ter uma experiência gastronômica de qualidade, como numa boa cafeteria ou restaurante.
Durante a apuração desta reportagem, tive a oportunidade de fazer uma degustação de chás lá, e, dentre variações como chá verde com jasmin e chá branco com frutas vermelhas, nenhum era sem graça ou amargo. Todos eram complexos e deliciosos! Vale muito a pena a experiência.
Pode ser um chá-preto, mate ou rooibos, infusão de um arbusto africano que se populariza em clínicas e estabelecimentos pela sua pegada democrática, sem contra-indicação. O menu é enorme. E, acredite: para encontrar o chá perfeito, você só precisa provar!