Sabemos hoje que bactérias intestinais contribuem para a regulação de várias condições psíquicas e nervosas através do que chamamos de eixo microbiota-intestino-cérebro. Essa conexão repercute em situações como alterações de humor, memória, cognição, desenvolvimento cerebral e até comportamento social.
O entendimento dessa via, em que o estado da microbiota e do intestino se reflete na massa cinzenta, vem propiciando a busca por tratamentos alternativos e menos agressivos para transtornos psiquiátricos, em comparação com medicamentos atuais como os antidepressivos.
Pesquisadores já identificaram modificações na microbiota intestinal de pessoas com estresse crônico, depressão e ansiedade. Isso, por sua vez, resulta no aumento da inflamação pelo corpo, na ativação de uma resposta imune e na alteração de níveis de neurotransmissores como a serotonina, provocando mudanças no cérebro, no humor e no comportamento. Sim, é um círculo vicioso.
Nesse contexto, o uso de probióticos orais (suplementos que fornecem bactérias benéficas específicas) vem sendo investigado em todo o mundo na tentativa de equilibrar a microbiota intestinal e reduzir seus efeitos indesejáveis sobre o sistema nervoso.
Um experimento recente, feito com animais submetidos a estresse crônico, constatou que a utilização do probiótico Bifidobacterium breve CCFM1025 por cinco semanas minimizou significativamente comportamentos semelhantes a depressão e ansiedade. Além disso, no grupo que recebeu o probiótico, verificou-se o reequilíbrio da microbiota intestinal, com aumento na produção de ácidos graxos de cadeia curta, gordura que alimenta as bactérias boas, e de outra substância, o 5-HPT, que é um precursor da já citada serotonina.
Com isso, os pesquisadores concluíram que o probiótico Bifidobacterium breve CCFM1025 desempenha efeitos sobre o sistema nervoso muito semelhantes aos obtidos com antidepressivos. Ainda que sejam fruto de um trabalho experimental, os resultados abrem caminhos para novas estratégias terapêuticas contra ansiedade e depressão.
Esse é um campo de pesquisa que gera enorme interesse. Uma das razões é que as drogas psicotrópicas (como antidepressivos e ansiolíticos) apresentam frequentemente efeitos colaterais expressivos, inclusive na composição da microbiota intestinal. As reações incluem alterações gastrointestinais, disfunções sexuais, ganho ou perda de peso, dislipidemia, hipertensão, impactos na tireoide etc.
Nesse sentido, traz esperança a descoberta dos psicobióticos, os probióticos com efeitos no sistema nervoso. Falamos de uma classe de bactérias com grande potencial no tratamento de doenças psiquiátricas, capazes de controlar sintomas sem eventos adversos.
Os psicobióticos já protagonizaram diversos estudos em laboratório e em seres humanos. Destacam-se, em matéria de saúde mental, os probióticos dos gêneros lactobacilos e bifidobactérias — particularmente, Bifidobacterium bifidum, Bifidobacterium longum, Lactobacillus acidophilus, Lactobacillus plantarum, Lactobacillus reuteri, Lactobacillus paracasei, Lactobacillus helveticus e Lactobacillus rhamnosus.
No entanto, ainda não existe consenso entre os especialistas sobre qual é a dose adequada do psicobiótico a ser consumida para obter benefícios sobre o eixo microbiota-intestino-cérebro. De qualquer forma, já temos evidências de que a suplementação de cepas específicas com essas propriedades poderá beneficiar pessoas que sofrem de estresse crônico, ansiedade, depressão e outros transtornos psíquicos.
* Dan Waitzberg é nutrólogo, professor da Faculdade de Medicina da USP e diretor do grupo Ganep
(Este texto foi produzido pelo Nutritotal em uma parceria exclusiva com VEJA SAÚDE)