É curioso como uma pequena estrutura localizada no pescoço chega a fazer nosso vigoroso arcabouço tremer nas bases. Pois essa é a sólida verdade: basta a tireoide começar a liberar constantemente doses elevadas de dois hormônios, o T3 e o T4. “O hipertireoidismo, capaz de desencadear nervosismo, insônia, palpitações e emagrecimento excessivo, já vem sendo associado a um maior risco de osteoporose e fraturas”, explica o endocrinologista José Augusto Sgarbi, professor da Faculdade de Medicina de Marília, no interior de São Paulo, e membro do Thyroid Studies Collaboration, um grupo de investigadores espalhados pelo mundo que se dedica à glândula. Só que mais impressionante ainda é a descoberta recente dos companheiros de Sgarbi nesse consórcio internacional.
Com base nos dados de 70 298 pessoas, os cientistas revelaram que o chamado hipertireoidismo subclínico – uma forma mais branda da disfunção clássica que às vezes nem acarreta sintomas claros – também está atrelado a um maior risco de ter os ossos trincados. Para ser exato, esse distúrbio, que atinge cerca de 2% da população ocidental, aumenta em 28% o risco de uma fratura dar as caras.
Uma das hipóteses para esclarecer o elo recai sobre a ação direta dos hormônios tireoidianos na ossatura. Isso parece até contraditório, já que, por definição, o hipertireoidismo subclínico apresenta taxas de T3 e T4 dentro dos parâmetros considerados adequados pelos laboratórios. Mas vamos com calma, pois ainda há outro hormônio na história: o TSH.
Primeiro convém esclarecer melhor o funcionamento da tireoide. Em resumo, ela acelera ou freia várias atividades do organismo, produzindo mais ou menos T3 e T4. E tal sistema é regido pela hipófise. Essa estrutura, sediada na base do cérebro, quando quer estimular a glândula, fabrica em maior escala o hormônio TSH. Já nos momentos em que precisa segurar o ritmo da parceira, suspende a linha de montagem da substância. Mas, em alguns azarados, alterações na tireoide fazem catapultar a manufatura de T3 e T4 independentemente dessa interação. Aí, a hipófise tenta, sem sucesso, regular o quadro baixando a liberação de TSH”, relaciona Marise.
Acontece que, mais recentemente, o efeito dessa carência em quadris, vértebras, fêmur e afins começou a ser investigado. “O hormônio parece ter uma ação direta nas células responsáveis pela reabsorção de osso”, relata a endocrinologista Tania Furlaneto, do Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Logo, é possível que concentrações diminutas dessa partícula, encontradas inclusive no hipertireoidismo subclínico, também fomentem a osteoporose, abrindo as portas para a ossatura rachar com facilidade. “No entanto, o impacto dessas baixas doses ainda não está claro”, pondera Tania.
Mas como identificar um mal que não manifesta sinais claros nem taxas de T3 e T4 fora dos padrões? “É por isso que a dosagem do TSH é o teste mais importante e confiável para fazer o diagnóstico”, diz Sgarbi. O mesmo, aliás, vale para o hiper e o hipotireoidismo clássico. Mulheres acima dos 35 anos, prestes a engravidar ou no início da gestação, homens com mais de 60 e indivíduos com histórico familiar de encrencas na glândula estão entre as pessoas que precisam do exame — converse com seu médico. No fim das contas, ficar atento aos sinais e manter um contato próximo com um especialista é mesmo uma das melhores formas de se proteger das disfunções na glândula… e, assim, garantir firmeza aos ossos.