É compreensível e legítimo que o ser humano queira se ver mais bonito e procure artifícios para moldar-se ao que, no seu imaginário, representa um ideal de beleza.
Do ponto de vista evolutivo, adornar o corpo foi receita de sucesso em termos de reprodução e ascensão social. E, convenhamos, parte desses pressupostos segue vivíssima.
Mais recentemente, do ponto de vista histórico, a concepção e a valorização da autoestima — alimentada por aquilo que encaramos no espelho e, hoje, nas mídias sociais —, estimularam a vontade (ou necessidade) de estar e se sentir bonito como uma das rotas inescapáveis para se realizar pessoalmente.
Há tempos o belo também mantém íntima relação com o que é considerado certo e louvável, fazendo com que ética e estética deem as mãos — e talvez um exemplo simples e corriqueiro desse entrelaçamento seja a forma com que repudiamos uma criança quando ela comete algo errado: “Que feio!”
No entanto, a busca desenfreada por atingir um padrão de beleza — algo que um dia foi propagado por pinturas e esculturas, migrou para capas de revista e programas de TV e atualmente nada de braçada nos mares da internet — tem desgovernado o equilíbrio físico e mental de candidatos e candidatas a uma transformação facial ou corporal.
A demanda por procedimentos estéticos cresce e, nesse frenesi, decolam também queixas e intercorrências provocadas por intervenções malfeitas, tocadas por pessoas sem a devida habilitação ou mesmo descoladas de regulamentação ou embasamento científico.
A coisa fica feia, como comprovam relatos e fotos compartilhadas pelas redes sociais e a procura de médicos para remediar reações adversas e sequelas de técnicas executadas de forma inadequada.
No fim, o sonho se torna pesadelo visual e, não raro, compromete irreversivelmente a saúde. Daí o alerta da reportagem de capa da jornalista Ingrid Luisa.
Especialistas se preocupam com uma avalanche de problemas causados por procedimentos que vão de aplicações tresloucadas de ácido hialurônico a técnicas mais invasivas performadas por gente sem qualificação.
Preocupam-se também com a venda indiscriminada de falácias como chip ou soro da beleza. Uma explosão de tratamentos que carecem de evidência e regulação ou até funcionam e são seguros, desde que a indicação e a administração estejam a cargo de quem estudou e treinou para tanto.
Em tempos de alta exposição e padrões cultuados na febre das redes, cabe rever o que é, de fato, bonito, e se blindar do que pode maltratar o corpo por fora e por dentro.