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Estudo refuta suspeita de que dengue eleva risco de microcefalia por zika

Chegou-se a imaginar que a pré-exposição à dengue favorecesse essa condição nos bebês. Mas uma pesquisa brasileira parece descartar a associação

Por Luciana Constantino, da Agência Fapesp*
Atualizado em 26 Maio 2021, 18h53 - Publicado em 26 Maio 2021, 18h38

A infecção prévia por dengue não aumenta o risco de uma gestante infectada pelo zika dar à luz um bebê com microcefalia. Essa é uma das conclusões de uma pesquisa que comparou dados de mulheres grávidas de duas capitais brasileiras, Rio de Janeiro e Manaus.

A epidemia de zika no Brasil ocorreu entre 2015 e 2016 em regiões historicamente endêmicas para a dengue, e ambos os vírus têm o mesmo vetor de transmissão, o mosquito Aedes aegypti. À época, alguns Estados afetados observaram um aumento de casos de microcefalia (um raro distúrbio neurológico no qual o cérebro do bebê não se desenvolve completamente), enquanto outras regiões não tiveram o mesmo crescimento.

De acordo com o estudo, dois fatores explicam o maior número de registros de microcefalia em algumas áreas: a alta taxa de casos de zika em relação ao total da população (a chamada taxa de ataque) e o fato de as mães dos bebês com o distúrbio terem contraído o vírus no primeiro trimestre da gravidez.

Apoiado pela Fapesp, o trabalho está inserido na Rede de Pesquisa sobre Zika Vírus em São Paulo, conhecida como Rede Zika. Os resultados foram publicados no periódico Viruses no fim de abril, em uma edição especial sobre zika e gravidez.

“As discrepâncias do número de registros de microcefalia entre regiões durante a epidemia de zika levaram a muitos questionamentos. Uma das hipóteses era de que a pré-exposição à dengue poderia agravar os casos”, afirma o virologista Maurício Lacerda Nogueira, da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (Famerp). “Mas no interior de São Paulo, mesmo sendo uma área altamente endêmica para dengue, não houve muitos efeitos adversos do zika. Por isso, fomos investigar o que poderia explicar as diferenças”, completa o professor, um dos orientadores do grupo juntamente com a pesquisadora Patrícia Brasil, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

Segundo Nogueira, ao analisar os dados do Rio de Janeiro e de Manaus, aquela taxa de ataque teve destaque. Enquanto na capital fluminense, que registrou muitos casos de microcefalia, o número de pessoas contaminadas com o zika foi de dez para cada 10 mil habitantes, em Manaus, onde o índice de bebês com a síndrome foi baixo, a taxa ficou em 0,6 por 10 mil pessoas.

“A microcefalia provocada por zika é um fenômeno raro. Porém, quando há muitos casos da doença em uma região, ele torna-se mais aparente. O fato de a mulher se contaminar com o vírus no primeiro trimestre da gestação já havia sido apontado como relevante e agora comprovamos isso”, explica o virologista.

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Metodologia

Para realizar a pesquisa, o grupo investigou as diferenças nos resultados adversos da gravidez e nos bebês de 114 gestantes com infecção pelo zika entre setembro de 2015 e junho de 2016. As participantes foram recrutadas na Fundação Heitor Vieira Dourado de Medicina Tropical (FMT-HVD), um centro de referência para doenças infecciosas em Manaus, e no ambulatório de doenças febris agudas da Fiocruz, no Rio. A exposição prévia à dengue também foi avaliada.

No geral, 31 mulheres tiveram resultados adversos (27 no Rio e quatro em Manaus). Desse total, houve quatro perdas na gravidez e 27 bebês nasceram com anomalia cerebral. “Apenas as taxas de ataque de zika e infecção no primeiro trimestre da gravidez foram associadas a efeitos adversos”, concluem os pesquisadores no artigo. A imunidade preexistente à dengue não foi ligada a resultados anormais.

Nogueira cita que outro estudo coordenado por ele em 2017 já havia mostrado que pacientes infectados pelo zika depois de terem tido dengue não apresentavam uma enfermidade mais severa.

O que é a microcefalia e o histórico do zika no Brasil

A microcefalia é resultado de alterações no processo de formação do sistema nervoso durante o desenvolvimento embrionário. Isso faz com que a cabeça e o cérebro do bebê sejam menores se comparados aos valores de referência para a idade. Na maior parte dos casos, as crianças apresentam atrasos e problemas de desenvolvimento mental, físico e motor.

Entre as causas da microcefalia estão fatores genéticos, exposição a substâncias químicas, bactérias e vírus. Recentemente, mostrou-se que o zika, ao infectar gestantes, pode comprometer o desenvolvimento do feto.

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Durante a epidemia no Brasil, o zika afetou pessoas de todas as idades e foi associado à ocorrência de um grande número de casos congênitos. Em novembro de 2015, o Brasil declarou situação de emergência em saúde pública por causa do aumento de ocorrências. Em seguida, a Organização Mundial da Saúde (OMS) lançou um alerta epidemiológico, destacando a possibilidade de desenvolvimento de malformações neurológicas congênitas associadas à infecção de gestantes pelo zika.

Somente naquele ano foram registrados mais de 2 400 casos de microcefalia no país, distribuídos em pouco mais de 540 municípios de 20 Estados. Para ter uma ideia, o total de registros no Brasil entre 2010 e 2014 havia sido de 781 casos.

Em relação ao zika, o país teve cerca de 214 mil casos prováveis em 2016. No ano seguinte foram 17 mil casos, caindo para 8 mil em 2018. De janeiro a março deste ano, o boletim epidemiológico do Ministério da Saúde aponta 448 registros prováveis da doença.

Transmitido pela picada do Aedes aegypti, o zika tem sintomas parecidos aos da dengue. Na maior parte dos contaminados provoca febre, dor de cabeça, vermelhidão nos olhos, dores nas articulações e manchas no corpo, desaparecendo, em média, em dez dias.

*Este conteúdo é da Agência Fapesp.

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