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Alimentação

RECONECTE-SE COM A COMIDA

Nos últimos meses, tudo mudou. E em meio à revisão de hábitos há oportunidades para criarmos, de uma vez por todas, uma relação mais gentil com as refeições

por Thaís Manarini Atualizado em 18 set 2020, 15h46 - Publicado em 18 set 2020 14h52

“Fiquem em casa.” A mensagem, reforçada à exaustão pela Organização Mundial da Saúde (OMS) durante a escalada do coronavírus, ecoou em nossos ouvidos e nos quatro cantos do planeta. Embora o isolamento social não tenha pegado 100% por aqui, boa parcela da população acabou permanecendo muito mais tempo dentro do próprio lar. Afinal, no início da crise, empresas estimularam o trabalho remoto e academias, bares, restaurantes, shoppings e outros estabelecimentos fecharam as portas. “No fim, a pandemia colocou as pessoas em contato consigo mesmas”, reflete a nutricionista Cynthia Antonaccio, idealizadora do Instituto Nutrição Comportamental, em São Paulo. Nessa viagem interna, hábitos foram repensados e novas atitudes despontaram. E a cozinha se destacou como um dos grandes palcos de transformações.

A nutricionista Sophie Deram, doutora pela Universidade de São Paulo (USP), enxerga o esboço de uma nova relação com a alimentação e suas repercussões no corpo: “Muita gente passou a valorizar outras questões além de peso, peso e peso”. O reconhecimento da importância de um organismo fortalecido frente à Covid-19 é, em parte, responsável por esse movimento, sugere uma pesquisa do aplicativo Dietbox, cuja base de dados reúne mais de 170 mil nutricionistas e 2,5 milhões de pacientes. Quando os usuários elencaram as principais apreensões no isolamento social, engordar surgiu em primeiro lugar, mas, logo em seguida, apareceu a melhora da imunidade. O levantamento Global Consumer Insights Survey 2020, da PwC, também traz indícios disso: após a disseminação do vírus, 63% dos 4 447 entrevistados disseram estar mais focados em cuidar da rotina alimentar.

“Houve a percepção de que a imunidade sai ganhando quando se está bem nutrido”, analisa Sophie. Cynthia considera esse entendimento de que a alimentação vai além de emagrecer ou engordar extremamente valioso. “Ele incentiva o maior interesse na qualidade do comer”, interpreta. Mas a especialista levanta uma ponderação: “É preciso ter cuidado para não desenvolver uma visão reducionista, enxergando os alimentos somente do ponto de vista dos nutrientes e seus efeitos no organismo”.

Os achados da Dietbox ainda evidenciam uma preocupação com a necessidade de cozinhar. “Com os restaurantes fechados, foi inevitável colocar a mão na massa. Isso trouxe experiências novas para o dia a dia”, observa Júlia Canabarro, nutricionista da plataforma. O protagonismo na alimentação, começando pela escolha do local para a compra de cada ingrediente, tornou o momento das refeições mais consciente e importante. “Antes, era só ir até o bufê por quilo e se servir”, lembra Júlia.

“Alguns de meus clientes não tinham nem fogão ou forno decentes”, repara a nutricionista Marcia Daskal, de São Paulo. Entusiasta da chamada nutrição amorosa, a profissional anda encantada com esse novo olhar para a comida: “Havia muito tempo não víamos algo assim”, afirma. “E é um processo que está acontecendo com pessoas de idades diferentes. Elas estão se permitindo comer de outras formas”, acrescenta. No início da pandemia, ficou difícil até achar farinha e fermento, de tanta gente que resolveu preparar o próprio pão do zero. “Nunca se compartilhou um volume tão grande de receitas. O que era um movimento de poucos ganhou escala. E acho que isso não vai mudar”, avalia Cynthia. “Aprendemos muito sobre o nosso potencial produtivo”, raciocina.

É claro que nem todo mundo seguiu na mesma direção. Sentimentos como ansiedade, medo e angústia se tornaram mais presentes. Some isso à impossibilidade de participar de situações lúdicas, viagens e festas e, por outro lado, ao acesso livre a guloseimas dentro de casa… “A alimentação ganhou uma dimensão maior em nossa rotina”, acredita Cynthia. Recorrer à comida para se dar um pouco de prazer, ainda mais nesse contexto, não é fatalmente um problema. Segundo a coautora de Mindful Eating — Comer com Atenção Plena (Editora Abril), a encrenca começa quando essa atividade vira uma saída para suprir demandas emocionais e tamponar a tristeza, a raiva e o tédio. É o que se batizou de comer emocional. “Ele é desatento, compulsivo e, em geral, rápido. Os alimentos buscados são aqueles considerados proibidos em outras ocasiões”, caracteriza.

Muito desse descontrole tem a ver com uma relação destrambelhada com a alimentação cultivada por anos. “O Brasil está na quarta geração de dietas restritivas”, calcula Sophie. Em 2014, ela escreveu o livro O Peso das Dietas, da Editora Sensus (clique aqui para comprar), sobre a furada desses métodos, e, de lá pra cá, acha que a história só piorou. “As dietas se tornaram mais loucas. Como as pessoas não emagrecem, buscam outras estratégias estressantes”, interpreta. Para Sophie, este é o momento de voltarmos ao básico, compreendendo, por exemplo, que a imunidade não sairá fortalecida por causa de um alimento, e sim devido ao estilo de vida. “A alimentação deve ser mais simples, variada e tranquila”, defende. A pandemia instigou certas reflexões e pavimentou a estrada para mudanças. A seguir, elencamos as oportunidades para despertar uma (re)conexão com a comida.

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1- Alimente-se com consciência

Cynthia nota que, na fase pré-coronavírus, vivíamos em um circuito frenético de trabalho, cuidados com a casa, compromissos sociais e viagens. No meio disso, a alimentação muitas vezes ocorria às pressas, como se fosse mais uma tarefa a ser completada — um convite para escolhas desbalanceadas. Aí veio o hiato causado pela pandemia.

“Passamos a ter mais tempo e curiosidade para cozinhar”, avalia. E esse é um processo que incita outras atitudes bem-vindas: há o planejamento das refeições de acordo com gostos pessoais e um foco nos ingredientes da compra ao uso. Sair do piloto automático traz equilíbrio às decisões e faz a degustação ganhar novo sentido, tornando-se mais saborosa — o que, em última instância, favorece a saciedade.

Até quem não curte cozinhar, mas vislumbra uma rotina saudável, pode comer com maior atenção (e sem culpa). Hoje, há uma imensa variedade de restaurantes e empresas que fornecem cardápios mais saudáveis. “Não aja impulsivamente, olhando só as fotos de pratos em aplicativos. Tem que pesquisar e pensar”, diz a nutricionista Magda Ramos da Cruz, da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR).

Atenção ao comer

Os preceitos do mindful eating, conceito que favorece uma refeição mais focada e equilibrada

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Analise as opções
Olhe todos os pratos servidos e planeje as combinações que deseja fazer. Em paralelo, avalie sua fome, de 0 a 10. Sirva-se, pense na origem da comida e agradeça. Sinta cada garfada.

Curta a situação
Escolha um tema para a refeição. Divirta-se elaborando receitas e descobrindo curiosidades sobre os pratos. Se tiver convidados, vende os olhos deles e faça-os imaginar os ingredientes.

Troque impressões
Ao escolher um vinho, por exemplo, analise o rótulo, a uva, a procedência e a data de fabricação. Compartilhe a experiência com outra pessoa, debatendo sobre aromas e sabores da bebida.

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Ouse nas compras
Vá ao supermercado com a cabeça de principiante, escolhendo um ingrediente novo em cada parte da lista, como uma fruta que não costuma comprar ou uma verdura que nunca experimentou.

Trabalhe sua fissura
Pegue o alimento que tira você do eixo, coloque uma música e observe-o atentamente. Escreva o que vem à sua mente. Consuma de pouco em pouco, avaliando a fome, a saciedade e o desejo.

Prepare o ambiente
Crie rituais. Arrume uma mesa bonita, com pratos especiais e jogos americanos. Largue as panelas no fogão. Mantenha o celular longe e desligue a televisão. Permita-se esse vínculo.

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(Foto: Tomás Arthuzzi | Modelos: Bia Prete e Manuela Prete/SAÚDE é Vital)
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2- Envolva a família na cozinha

A nutricionista especializada no atendimento de crianças Fernanda Monteiro, de Brasília, tem percebido dois fenômenos diferentes em relação aos pequenos. Há famílias que estavam mais habituadas à compra de itens ultraprocessados (macarrão instantâneo, bolachas, salgadinhos, refrigerantes e companhia) e, agora, por causa do acesso livre a esses alimentos e do sedentarismo em alta, viram a criançada ganhar peso.

Já a parcela de pais que desbravaram a cozinha acabou, mesmo sem querer, estimulando os filhos a terem maior contato com a comida de verdade — a molecada enxerga os ingredientes, às vezes os manipula e, durante a preparação, sente o cheirinho que sai das panelas. “Elas aprendem do que as receitas são feitas”, nota Fernanda.

Instigar meninos e meninas a participarem do processo que engloba se alimentar — da ida à feira ao preparo — é uma das táticas mais clássicas para melhorar a composição de seu prato. Com as aulas presenciais suspensas, essa pode ser a chance de colocá-la em prática. Segundo Fernanda, nunca é tarde para reestruturar a dieta dos filhos — mesmo adolescentes. “O essencial é a família toda entrar no jogo.”

Tem tarefa para todas as idades

Fernanda Monteiro dá ideias de funções na cozinha da infância à adolescência

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2 a 4 anos
Eles são capazes de regar plantas, buscar frutas e verduras na fruteira e também comer sozinhos. Podem ainda lavar os vegetais e distribuir ingredientes em travessas.

5 a 8 anos
Conseguem descascar alguns alimentos (como banana e mexerica), misturar e medir ingredientes, temperar receitas, guardar as compras e arrumar a mesa para a refeição.

9 a 12 anos
Confie neles para usar o fogão e o micro-ondas — com supervisão — e auxiliar mais de perto no preparo de algumas refeições. Peça seus palpites para definir o cardápio.

13 a 16 anos
Já conseguem preparar sozinhos algumas de suas refeições e podem lavar a louça vez ou outra. Também aprendem o que fazer caso ocorra algo errado ou algum acidente na cozinha.

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3- Valorize a comida afetiva

Pesquisas indicam que, durante o isolamento, ingredientes como leite condensado e manteiga foram mais caçados pelos consumidores. “Acho ótimo que as pessoas tenham se liberado para provar coisas gostosas”, avalia Sophie. Afinal, comer é muito mais do que uma via de obtenção de nutrientes. “Esse rito traz alívio e segurança”, crava a nutricionista. Há até uma definição para pratos que inspiram com mais intensidade sentimentos assim: comfort food, ou comida afetiva.

Nos últimos meses, Marcia Daskal de fato percebeu o conceito em alta. “Tem gente que passou a fazer pratos que remetem à família devido à impossibilidade de se reunir pessoalmente”, exemplifica. Para a professora Magda, não há problema algum em seguir nessa toada após a pandemia do coronavírus. “Basta buscar o equilíbrio”, indica.

De acordo com Sophie, estudos revelam que, quando a gente se autoriza a degustar o pudim da tia ou a lasanha da mãe, aquele alimento fica menos importante como recompensa. “Assim, basta um pouquinho para matar a vontade.” O contrário ocorre quando se pratica uma restrição severa. Aí o apetite vem com voracidade.

O que caracteriza a comida afetiva

Saiba como identificar um prato que se encaixa na concepção de comfort food

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É palatável
Em geral, o alimento que mexe com nossas emoções é gostoso e mais calórico. Normal: o cérebro registra com facilidade aquilo que fez nosso sistema de recompensa vibrar.

Traz lembranças
“A comida afetiva é feita do momento”, esclarece Magda. “É aquela receita que traz consigo o gosto da infância”, acrescenta. Por isso, o ideal é que o sabor seja igualzinho ao da versão original.

É específico
Se você guarda belas memórias ligadas ao bolo de laranja que sua avó preparava, não adianta buscar o mesmo conforto com outros tipos — ou demais doces. A sensação não é a mesma.

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Acalma a alma
A cada mordida, somos brindados com sentimentos de bem-estar e contentamento. Trata-se de um acontecimento especial, que desperta o lado emocional, mas sem voracidade e descontrole.

É muito pessoal
Como a comida afetiva é atrelada a memórias, não tem regra. Há quem se emocione com uma macarronada, enquanto outros se inspiram com o chocolate que remete à saída do colégio.

Dá satisfação
De acordo com Sophie, às vezes o prato que traz a infância à tona até resulta em certo exagero. “Mas, depois, a tendência é ficar sem fome por um tempão”, tranquiliza a nutricionista.

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4- Invista no que é fresco e natural

Iniciado em janeiro, o projeto NutriNet Brasil pretende avaliar a dieta e a saúde de 200 mil brasileiros em uma década. Mas alguns resultados prévios já chamam a atenção. Na pandemia, os cientistas notaram maior frequência no consumo de frutas, hortaliças e feijão entre os primeiros 10 mil participantes da pesquisa. “Isso aconteceu em todas as regiões do Brasil”, conta Carlos Monteiro, professor do Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública da USP e coordenador da investigação.

Em paralelo, as regiões Norte e Nordeste apresentaram ligeira alta na procura por itens ultraprocessados. “Mas, ao olhar para o país, percebe-se uma estabilidade nesse sentido”, pondera Monteiro. Para o professor, a volta à cozinha talvez ajude a explicar os dados. “Por causa da Covid-19, também houve a noção de que, fora o isolamento, uma medida viável para se proteger é comer melhor”, deduz. Nesse caso, a ciência é cada dia mais clara: convém maneirar nos produtos ultraprocessados. “Além do excesso de gordura, açúcar e sal, esses produtos perdem substâncias benéficas, como os antioxidantes”, pontua Monteiro. Quanto menos modificado, melhor.

Graus de processamento

As principais características do alimento de acordo com o nível de manipulação

In natura e minimamente processados
Vêm direto de plantas ou animais (frutos, folhas, ovos, leite etc.). Valem também versões desses alimentos submetidas a processos para aumentar a durabilidade.

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Ingredientes culinários processados
Passam por procedimentos para virarem itens para cozinhar, como sal, açúcar, óleos e gorduras de origem vegetal ou animal.

Processados
Incluem produtos que reúnem sal, açúcar e, às vezes, óleos, vinagre ou outras substâncias. São conservas, carnes salgadas, peixe em óleo ou água e sal, queijos, pães e frutas em calda.

Ultraprocessados
Têm vários ingredientes, além de aditivos que alteram aroma e cor. Trazem substâncias que não achamos para usar na cozinha. Biscoitos, salgadinhos e refris são alguns exemplos.

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5- Prestigie o pequeno produtor

Com os alimentos in natura (como frutas, hortaliças, leguminosas e grãos) conquistando distinção no dia a dia, alguns questionamentos apareceram: “de onde eles vêm?”, “como são cultivados?”, “quem os produz?”. Um desenrolar natural ao se explorar mais a cozinha. De repente, há o desejo de obter os melhores ingredientes — para a saúde e o sucesso da receita. Assim, os pequenos produtores ganharam mais protagonismo.

Muitos deles cultivam alimentos orgânicos, isto é, sem agrotóxicos, ou estão em fase de transição para esse tipo de cultura. Sabe-se que a exposição direta dos trabalhadores a tais substâncias é ligada a vários problemas de saúde — daí a aflição do consumidor. Sem contar que as técnicas empregadas pelos pequenos costumam ser mais amistosas com o meio ambiente.

Segundo Cynthia, priorizar esse sistema era uma tendência de nicho e agora se ampliou. Para ter ideia, desde março as vendas online do sítio A Boa Terra subiram 300%. A plataforma Raízs viu os pedidos mais que dobrarem (217%), assim como a base de usuários (215%). “Se a escala de vendas cresce, o preço tende a cair”, diz o professor Monteiro.

Como encontrar os pequenos

Há várias maneiras de encurtar a distância entre campo e cidade

Plataformas de busca
O Instituto de Defesa do Consumidor lançou a Comida de Verdade. Dá para achar os produtores mais próximos — muitos fazem entrega.

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Pedidos online
Também é possível adquirir orgânicos online — há a opção inclusive de assinar cestas fixas. Empresas como Raízs, A Boa Terra, Casa Orgânica e Orgânicos in Box prestam o serviço.

Feiras presenciais
Há espaços dedicados à agricultura familiar. Que tal mapear locais próximos e visitar após a pandemia? Muitos mercados também têm áreas para exibir esses produtos.

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(Foto: Tomás Arthuzzi | Modelo: Bia Prete/SAÚDE é Vital)
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6- Cultive seus temperos

Entre aqueles indivíduos encafifados com a origem dos alimentos, uma parcela considerável decidiu que pelo menos algumas variedades cresceriam no próprio lar. “No começo da pandemia, muitas pessoas entraram em contato para saber como iniciar uma horta”, relata a herbalista Gabi Pastro, da Hortas e Saberes, na capital paulista.

Outro sinal dessa inclinação: na Embrapa Hortaliças, o curso de hortas em pequenos espaços soma, desde abril, 57 mil inscritos, e é a primeira vez que ele ocorre online. Para Henrique Carvalho, chefe-adjunto de Transferência de Tecnologia da instituição, a atividade tem apelo emocional, já que traz lembranças do ambiente rural — e, muitas vezes, da casa da avó — e é vinculada a uma rotina saudável.

“Os alimentos são frescos e produzidos sem defensivos químicos”, destaca. Sem falar no poder de o cultivo caseiro ocupar a mente e aplacar a ansiedade. Ninguém precisa ter um jardim ou uma varanda para usufruir desses ganhos. Um vasinho de manjericão ou cebolinha já dá bastante satisfação e ânimo para arriscar-se na cozinha. “Quando participam do cultivo, até as crianças comem melhor”, salienta Sophie.

O que as hortas ensinam

Cuidar de uma planta culmina em uma série de impactos positivos no dia a dia

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Respeito à natureza
Acompanhar uma espécie desde o plantio até seu crescimento completo reforça como é essencial zelar pelo meio ambiente. Fica mais fácil entender também que os alimentos têm seu próprio tempo.

Aproveitamento total
Quando há o ritual de regar, podar e contemplar a planta, é natural que, ao vê-la pronta para o uso culinário, pensemos em jeitos de usufruir ao máximo tudo o que ela nos proporciona.

Novas receitas
Assistir ao desabrochar do alimento, seja uma singela erva, seja um legume robusto, faz a gente pensar em formas diferentes de incorporá-lo à rotina. Isso diversifica a dieta e exercita o paladar.

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7- Descomplique as refeições

A pandemia aumentou a popularidade da cozinha, fato cada vez mais corroborado por pesquisas, como uma recém-realizada pelo BTG Pactual. Os dados de buscas no Google, o tráfego de sites e os downloads de aplicativos indicam que, em paralelo a um maior interesse por receitas, a procura por acessórios que facilitam a vida do mestre-cuca sofreu um boom na pandemia. Foi assim com lava-louças (+170%), miniforno elétrico (+150%), liquidificador (+80%), batedeira (+40%) e fogão/cooktop (+32%).

A tendência é celebrada pelos experts, já que cozinhar favorece uma alimentação equilibrada e sem neuras. “É quase um momento meditativo. E a saciedade vai ocorrendo ao longo do processo”, afirma Sophie. Para quem ainda não é tão habilidoso, há serviços bacanas que ajudam a soltar o freio de mão. É o caso da startup Cheftime: você escolhe uma receita em um banco com mais de 2 mil opções e recebe os ingredientes frescos e porcionados, além de fotos do passo a passo. “Queremos dar confiança para as pessoas testarem coisas novas”, conta Daniella Mello, CEO da marca. Está funcionando: no segundo trimestre de 2020, as vendas subiram 177% em relação ao mesmo período de 2019.

Caseira e sem frescura

Não tem por que gourmetizar a comida diária. Aprenda truques para ela ser rápida e gostosa

Recorra ao forno
“Se a receita é preparada nele, você não precisa ficar cuidando”, justifica a nutricionista Júlia, da Dietbox. Só tome cuidado para não se distrair e a comida esturricar. Olho atento no relógio!

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Higienize os vegetais
Tire um tempinho para lavar folhas, frutas etc. Assim, já ficam prontinhas para aquelas semanas mais corridas. Também é possível comprar itens higienizados e picados. São uma mão na roda.

Varie o preparo
Cansou do bife grelhado? “Faça-o ensopado, rolê, picadinho…”, sugere a professora Magda. Dessa maneira, não é necessário contar com mil ingredientes em casa — reinvente o básico.

Abuse de temperos
“Descubra as opções naturais de que você gosta e aprenda a utilizá-las”, aconselha Magda. Ela afirma que esse é um dos principais segredos para incrementar receitas aparentemente simples.

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Guarde para depois
“Reserve um dia para cozinhar em maior quantidade e armazenar”, indica Júlia. O feijão, por exemplo, pode ser guardado em potes pequenos e descongelado ao longo da semana.

Navegue na internet
Os sites de receitas estão cheios de opções fáceis. Explore-as — sem deixar a diversão de lado. Se você só tiver três ingredientes, busque inspirações. “A sensação de se virar é muito boa”, nota Magda.

Recrute aliados
Alguns utensílios facilitam a vida do cozinheiro, como processador manual para picar ingredientes (serve para cebola, alho…), secador de salada, ralador e descascador de legumes e talheres medidores.

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(Foto: Tomás Arthuzzi | Modelo: Bia Prete/SAÚDE é Vital)
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8- Escute o seu corpo

Essa foi uma dinâmica natural no período de isolamento — e não passou despercebida pelos nutricionistas. “A noção sobre a fome mudou”, sintetiza Marcia. Ela repara que, por estarem dentro de casa e, eventualmente, acordando mais tarde, alguns pacientes testaram comer menos. Ora, se o estômago roncasse, bastaria dar um pulinho na cozinha. Com isso, muitos constataram que ficam felizes com porções mais modestas ou uma tigela de sopa.

Devido ao acesso rápido à comida, o papo de que é fundamental comer de três em três horas também foi desafiado — e não resistiu. “Em vez de encararmos isso como desorganização, prefiro enxergar como um ganho, porque significa que as pessoas passaram a se conectar com seus sinais internos de fome e saciedade”, examina Cynthia.

Mas isso não é desculpa para avacalhar. “Se estiver comendo a cada 30 minutos, não é fome”, pontua Magda. Está mais para um apetite psicológico. Dentro dessa linha, é vital avaliar se falamos de um desejo genuíno e específico, que merece ser respeitado — como a musse de limão da mãe. “Isso é imprescindível para diferenciar da fome emocional, que nos faz devorar coisas que nem queríamos de verdade”, distingue Sophie.

As armadilhas

Os fatores capazes de criar ruídos e atrapalhar nossos sinais internos

Guloseimas à vista
Sabe aquele pote de biscoito que fica em cima da bancada da cozinha? Há grandes chances de você sempre sair com uma unidade de lá sem nem se dar conta.

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Vício em telas
Quem come sem tirar os olhos de celular, televisão e computador não sente direito a saciedade se aproximar. Em pouco tempo dá vontade de comer de novo.

Utensílios grandes
Marcia aponta que eles acenam para o abuso. Por isso, incentiva a utilização de pratos menores. “Se continuar com fome, tudo bem repetir”, acalma a nutricionista.

Receitas caprichadas
Ao botar a mão na massa, reflita sobre as quantidades. Um bolo para duas pessoas é uma exorbitância. “Dê metade ao porteiro ou vizinho”, propõe Magda.

Pressa nas garfadas
É o mesmo dilema das telas: devorar o prato correndo afeta a assimilação da saciedade. Sem falar que dificulta a digestão. Reserve 20 minutos para a refeição.

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9- Combata o desperdício

No fim de 2018, ao avaliar 1 764 famílias brasileiras, a Embrapa calculou que cada uma jogava fora, em média, 128 quilos de alimentos ao ano. Arroz, carne, feijão, frango e leite eram os itens que mais iam para o lixo. A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) estima que, na verdade, quase um terço de todos os alimentos que produzimos no mundo inteiro tem esse destino. Enquanto nutrientes inestimáveis são desprezados, milhões de indivíduos passam fome. Há ainda o custo da produção toda — que nem é aproveitada — para o meio ambiente. Sem falar que a perda gera emissão de gases de efeito estufa. O cenário precisa mudar.

E é possível que a pandemia tenha dado uma forcinha aqui. “Antes, normalmente a comida chegava pronta até as pessoas”, recorda Marcia. “Agora, ficamos mais próximos de toda a cadeia alimentar”, acredita a nutricionista. O envolvimento desde a compra até o preparo contribui para o melhor planejamento — ponto crítico para a redução do desperdício. Segundo Marcia, a maior familiaridade com o alimento também favorece a consciência de que ele não se presta a uma única e exclusiva finalidade.

Desfrute total

Seis táticas para minimizar o descarte indevido de alimentos

Rastreie a despensa
Realize uma verdadeira caça ao tesouro: no caso, falamos de produtos prestes a vencer. Posicione-os na frente dos demais para que sejam utilizados mais rapidamente.

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Faça uma lista
Antes de ir ao mercado, e após checar o estoque de comida, registre os itens que estão em falta. De preferência, planeje as compras para um período curto, evitando que os ingredientes estraguem.

Não compre faminto
O toque sempre foi ligado ao controle de peso, mas também faz sentido contra o desperdício. Quem vai ao mercado com fome tende a lotar o carrinho — e o prazo de validade não perdoa.

Calcule porções
Grande parte das famílias brasileiras tem o hábito de preparar vários pratos e em quantidade suficiente para sustentar um batalhão. Resultado: sobras que nem sempre são reaproveitadas.

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Invente com os restos
O excedente que não foi consumido pode se transformar em novos pratos. O arroz vira bolinho, as frutas se tornam geleia, o pão duro dá belas torradas… Pesquise e crie!

Utilize cascas e afins
Inúmeros vegetais merecem ser usados em sua totalidade. Há receitas com cascas, sementes, folhas e talos. E vá além da aparência. Tipos mirrados ou estranhos não são menos nutritivos.

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(Foto: Tomás Arthuzzi | Modelo: Bia Prete/SAÚDE é Vital)
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10- Fuja de radicalismos

Por vários motivos, cardápios restritivos sempre geraram aversão entre parcela considerável dos nutricionistas. Para começar, esses menus não inspiram mudanças capazes de serem seguidas pela vida inteira. Aí, embora o indivíduo veja resultados satisfatórios no início, acaba preso a um efeito ioiô. Suas propostas costumam ter um foco específico (cortar os carboidratos, esquecer a lactose, turbinar a ingestão de gorduras etc.), ou seja, não contemplam todas as nuances associadas ao ato de se alimentar — incluindo o tão valoroso prazer.

Não à toa, quando a pandemia se alastrou, permanecer dentro de casa com tanto alimento disponível (e a ansiedade disparada) foi um martírio sobretudo para aqueles que nunca conseguiram estabelecer uma relação serena com a comida. “A restrição leva ao exagero depois”, afirma Sophie. A nutricionista alega que a alimentação deve retornar ao básico e ser menos estressante. “O certo é pensar nela de forma global, respeitando o corpo e a saúde”, define. Se você está confuso diante das refeições e espera reencontrar o eixo, a boa pedida é buscar o auxílio de um especialista — desses que respeitam o lado emocional do comer.

Banquete de bobagens

Medidas extremas que não trazem vantagens duradouras

Vilanizar alimentos
Fontes de carboidratos, glúten e lactose vivem no banco dos réus. O primeiro item é um nutriente essencial, enquanto os outros só valem ser revistos se houver intolerância.

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Exaltar ingredientes
A lista dos enaltecidos é grande: tem goji berry, manteiga ghee, suco de aipo, óleo de coco e mais uma infinidade. A dura realidade é que não operam milagres e o abuso traz riscos.

Acreditar em detox
Temos órgãos para realizar a limpeza interna, como rins e fígado. Portanto, nenhuma dieta, receita ou chá vai otimizar a eliminação de eventuais toxinas. Detox bom mesmo é o de fake news.

Dieta líquida
Viver de combinações para beber destrambelha o organismo: deixa com fome, dá fraqueza e afeta o humor. Como é difícil manter o esquema, o abandono é certo, assim como o retorno do peso.

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11- Pegue leve na proteína animal

Esse comportamento já vinha sendo referido como positivo, já que estudos têm ligado o abuso de carne vermelha (a mais valorizada no Brasil) a um maior risco de doenças cardíacas e câncer. Com a pandemia, outras fontes de proteína animal estão na mira, e por novas razões. “Frangos e porcos atuam como hospedeiros intermediários e amplificadores de patógenos que podem ser transmitidos à população”, avisa Cynthia Schuck Paim, doutora em zoologia pela Universidade de Oxford, na Inglaterra, e coordenadora científica e de meio ambiente da Sociedade Vegetariana Brasileira.

Não é que você vá pegar esses germes ao consumir um filé, mas o modo de criação dos bichos em boa parte do mundo oferece condições para que esses micróbios se espalhem. “Quanto maior a demanda por produtos de origem animal, principalmente desse tipo de sistema, maior o risco de surgirem cepas com potencial pandêmico”, reforça Cynthia, autora do livro Pandemias, Saúde Global e Escolhas Pessoais, da Cria Editora (clique aqui para obter). Do nosso lado, o que podemos fazer é moderar no consumo e escalar mais redutos de proteínas vegetais, como grão-de-bico, ervilha, lentilha e o nosso tradicional feijão.

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