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Sextou com a doutora

De médica para paciente (e vice-versa). Neste espaço, a mastologista e cirurgiã oncológica Fabiana Makdissi, uma das maiores autoridades em câncer de mama no país, compartilha seus conhecimentos, vivências e reflexões sobre a saúde da mulher.
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Português ou mediquês? A língua que a gente fala e o cuidado com a saúde

Uma reflexão sobre a importância de se estabelecer uma comunicação clara e efetiva, por fala e escrito, entre médico e paciente

Por Fabiana Makdissi
24 Maio 2024, 16h10

Os médicos se valem de suas palavras, de suas conversas e de sua escrita para chegar aos pacientes. No entanto, me pergunto o tempo todo: será que o que eu estou falando ou escrevendo está sendo compreendido?

Eu particularmente ADORO FALAR! Tem uma estimativa que diz o seguinte: mulheres falam em torno de 20 000 palavras por dia, ante 7 000, em média, para os homens. Segundo meu marido, eu não abro mão de nenhuma palavra da minha cota diária! Acho até que atropelo um pouco as 7 000 que seriam dele…

Em relação aos médicos especificamente, não tenho a referência dessa quantidade de palavras, já que cada especialidade tem um tipo de atendimento. Mas o que mais importa não é a quantidade, e sim a qualidade do que se fala, se escreve e se compreende. Se você já esteve em algum momento diante de um médico que tenha dito algo que você não entendeu, este artigo é particularmente para você.

Quando nascemos não falamos uma palavra! Pouco a pouco vamos ouvindo nossos pais, nossos irmãos, os amiguinhos e professoras na escola e começamos a repetir o que ouvimos, muitas vezes até sem entender o que estamos falando.

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Lembro da primeira vez que ouvi meu filho caçula dizendo a palavra “árvore”. Dou risada sozinha quando recordo porque ele achava que era o que dizia, mas o que eu ouvia era “lavle”, e como é que eu ia entender aquela palavra que era só dele? Só depois de muito esbravejar, apontar para a árvore e falar “Esse! Lavle!” é que entendi o que ele queria dizer.

E aí vem a grande questão. Nós, médicos, com muita frequência temos a péssima mania de falar uma língua que nossos pacientes não entendem. Percebi isso já no primeiro ano da faculdade de medicina. O dicionário de termos médicos tem mais ou menos 10 000 novas palavras que somamos ao nosso português original para definir doenças, sintomas, tratamentos…

Mas será que usando o que chamo de mediquês conseguimos chegar de verdade aos nossos pacientes? Nem nós mesmos, quando conversamos entre nós, com médicos de outra especialidade, entendemos o que o colega diz. Imagine se falarmos assim com as nossas pacientes, geralmente leigas?

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Vários estudos comprovam que, quanto melhor é a comunicação entre médicos e pacientes, maior será a compreensão e melhores os resultados do tratamento. Traduzir o mediquês para o português é tarefa nossa. E faz diferença. A comunicação precisa ser clara e eficiente, e as perguntas devem ser respondidas.

Leia também: A coluna de estreia de Fabiana Makdissi em VEJA SAÚDE

Por escrito

Até a receita médica entra nessa discussão. Lembro de um trabalho antigo que li e dizia que pelo menos 24% dos pacientes que passavam no médico saíam da consulta com uma receita sem entender o que estava escrita nela.

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Imaginem chegar à farmácia sem ter entendido o que foi dito na consulta e depois precisar usar um medicamento que você nem sabe o nome? Nem você nem o farmacêutico!?

Gracejos à parte, a chamada “letra de médico” é um desrespeito ao paciente. Aqui, pelo meu lado, com a mãe professora, ai de mim se em algum momento da minha vida de médica eu escrevesse algo que minha paciente pudesse não entender!

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Graças ao uso de computadores e à impressão de receitas, tudo ficou mais legível, e apesar de a pandemia de Covid-19 ter nos impactado negativamente em muitos aspectos, a liberação do uso de receitas digitais pelo Conselho Federal de Medicina gerou bons frutos para uma comunicação mais efetiva.

É como frisa meu colega Carlos Sacomani, coordenador médico de Inovação e Tecnologia do A.C. Camargo Cancer Center:  “O uso da receita digital tem benefícios para médicos e pacientes. Para o paciente, eu posso emitir uma prescrição de antibiótico, um medicamento controlado, e de exames à distância. Para o médico, consigo identificar o profissional que emitiu aquela receita com precisão, evitando, portanto, fraudes.”

E eu complemento aqui: a receita fica legível e compreensível para todos!

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Por fim, gostaria de deixar aqui algumas sugestões para você, paciente, quando pisar no consultório médico:

  • Nunca uma pergunta é boba ou inútil; se teve dúvida, pergunte
  • Não diga que entendeu se não entendeu. Para o médico, essa compreensão é necessária para que seja dado um próximo passo
  • Leve suas dúvidas anotadas em um papel
  • Faça suas buscas na internet, mas procure sempre por fontes confiáveis (podemos falar sobre isso num outro momento)

E para você, colega médico, divido algumas reflexões:

  • Nunca uma pergunta feita é boba ou inútil; se seu paciente perguntou, foi porque você não se fez entender
  • Nunca diga que “vou explicar somente uma vez”, mude seu jeito de comunicar se acha que seus pacientes não estão entendendo (eu desenho, por exemplo); se o paciente não entendeu agora, dificilmente entenderá depois e cooperar com o tratamento prescrito
  • Leia as dúvidas anotadas no papel e, ao final, questione se há mais algo a esclarecer
  • Entenda e respeite que seu paciente pode fazer buscas na internet; dê a ele indicações de boas fontes, ainda que você não seja um comunicador digital (aliás, tem espaço para todos nos meios virtuais; se puder, ocupe o seu!)

Eu realmente acredito que a cada pessoa que atendemos temos a oportunidade de sermos melhores, de comunicar com mais clareza e de nos lembrar que nosso papel como médicos é ajudar, cuidar e sempre nos fazer entender.

Fora o mediquês por aqui e viva o lindo e claro português! Seguimos juntas!

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