Novas questões sacodem o universo da saúde suplementar à medida que os planos de saúde revelam um panorama financeiro desfavorável.
O debate da vez trata de um prejuízo acumulado pelas operadoras de espantosos R$ 11,5 bilhões em 2022, apesar dos lucros recordes de R$ 18,7 bilhões em 2020 e R$ 3,8 bilhões em 2021.
As operadoras argumentam que esse rombo é resultado de decisões desfavoráveis para as empresas, como a lista exemplificativa de cobertura obrigatória, o fim da limitação de sessões de terapia e o aumento dos custos com insumos.
Entretanto, soa estranho que tais alegações sejam justificativas plausíveis em apenas 8 meses de vigência da Lei n. 14.454/2022, que trata do rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
Seria uma simples lei capaz de causar tamanho estrago, ou os dados divulgados pelas operadoras escondem inconsistências?
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Quebras de contratos
Independentemente da resposta, a realidade é que as operadoras já tomaram medidas que consideram necessárias para a suposta sustentabilidade do setor, como rescisões contratuais.
Testemunhamos inúmeros relatos de famílias que tiveram seus planos de saúde cancelados sem justificativa, resultando na interrupção de tratamentos multidisciplinares para crianças com transtorno do espectro autista (TEA) e outros pacientes vulneráveis.
O Ministério Público de São Paulo até mesmo iniciou um inquérito civil para investigar as denúncias de rescisões de contratos de beneficiários em tratamento médico.
Vale ressaltar que a ANS determinou, no ano passado, o fim da limitação de sessões de psicologia, fonoaudiologia, terapia ocupacional e fisioterapia para portadores de autismo, bem como a cobertura de qualquer método ou técnica recomendada para o tratamento do autismo e outros transtornos globais do desenvolvimento.
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Coincidentemente, esse foi o grupo mais afetado pelos cancelamentos unilaterais.
O que parecia ser um benefício se transformou em pesadelo para muitas famílias que dependem do sistema de saúde suplementar para garantir as terapias de seus filhos.
No cerne da questão, está a obrigação da operadora de garantir a continuidade dos serviços médicos para pacientes internados ou em tratamento, desde que o usuário esteja em dia com as mensalidades.
Contudo, as operadoras de planos de saúde invocam cláusulas presentes em contratos empresariais e coletivos por adesão, que permitem o cancelamento a qualquer momento, sem necessidade de justificativa, desde que seja comunicado com 60 dias de antecedência.
Isso deixa o consumidor desamparado e à mercê das empresas.
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A estratégia desumana, no entanto, não possui amparo legal.
Isso porque o entendimento predominante no Poder Judiciário é de que as rescisões unilaterais de contratos empresariais com menos de 30 vidas, sem motivação idônea e com beneficiário em tratamento, são consideradas abusivas.
Quanto à rescisão de contratos individuais/familiares, o artigo 13, parágrafo único, da Lei 9.656/98 permite o cancelamento por fraude ou inadimplência por mais de 60 dias, desde que haja notificação prévia.
No entanto, essa modalidade sofre intervenção da ANS e está se tornando cada vez mais rara no mercado de saúde suplementar.
Diante desse cenário de desamparo, o Poder Judiciário tem acolhido as demandas dos beneficiários para que permaneçam nos convênios, caracterizando como abusiva a conduta das operadoras ao expulsar os usuários mais vulneráveis.