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Profissionais do A.C.Camargo Cancer Center explicam e discutem as principais novidades e descobertas no diagnóstico e no tratamento da doença
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Por que a pesquisa clínica faz toda a diferença no combate ao câncer

Médico esclarece como são feitos os estudos que validam (ou não) os tratamentos e mostra os ganhos diretos e indiretos que eles propiciam à sociedade

Por Dr. João Paulo Nogueira Lima, oncologista*
Atualizado em 3 out 2019, 12h38 - Publicado em 13 dez 2018, 18h56

Todo tratamento, inclusive contra o câncer, surge de uma dúvida de como melhorar a saúde dos pacientes. Estudos iniciais em células e modelos animais ocorrem na bancada do laboratório a fim de testar compostos — que ainda não podem sequer ser chamados de remédios. Somente os “medicamentos” mais promissores seguem para avaliação em seres humanos. Assim, nenhum composto pode ir direto do laboratório para a farmácia. Afinal, não sabemos se são realmente seguros e eficazes em seres humanos doentes.

A pesquisa clínica forma essa ponte entre o laboratório e os pacientes, testando se compostos promissores são seguros e melhores do que os atualmente disponíveis. É um momento em que seres humanos voluntários – sadios ou doentes – aceitam embarcar numa experiência altamente controlada. Em oncologia, a pesquisa clínica é capaz de avaliar se uma potencial medicação é menos tóxica que as convencionais, se aumenta as chances de cura ou se ao menos aumenta o tempo e a qualidade de vida do paciente.

Nessas experiências – chamadas estudos clínicos ou clinical trials – a maior preocupação é proteger a pessoa que se voluntariou a participar do trabalho. O estudo clínico deve seguir princípios universais que garantem a segurança dos pacientes e evitam que abusos do passado voltem a acontecer. São as boas práticas clínicas.

O cuidado com o paciente envolve não só os pesquisadores – enfermeiros, farmacêuticos, médicos… – mas também um Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), que zela pela segurança dos pacientes. Este comitê deve ser absolutamente isento de pressões ou interesses e é formado por cientistas e também membros da comunidade. Antes mesmo do início do estudo, o CEP avalia se todas as medidas para garantir a segurança do paciente estão sendo tomadas. Ele funciona como um fórum plural que discute em detalhes cada estudo, unindo o conhecimento dos cientistas à visão da sociedade.

Com a ajuda do CEP, podemos lidar com a grande dúvida sobre o uso de placebo. Caso não exista qualquer tratamento comprovadamente eficaz para uma doença, é seguro e ético utilizar placebo como comparação. Se o tratamento novo for melhor do que o placebo, então teremos avançado no tratamento da doença. Parece simples, mas somente com o auxílio do CEP teremos certeza de que há base cientifica e ética sólidas para conduzir um estudo com placebo.

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A pesquisa clínica funciona como uma peneira, escolhendo medicações e rejeitando “compostos”. Nesta longa trajetória – que pode durar mais de cinco anos – a maioria dos compostos acaba sendo rejeitada. Em oncologia, estima-se que mais de 70% das moléculas “promissoras” falham e não se tornam remédios. Mesmo assim, muitas informações úteis podem ser colhidas destas quase medicações que auxiliarão o desenvolvimento de futuras e melhores moléculas.

Todo este esforço de pesquisadores, farmacêuticos e comitês se apoia num elemento-chave: o voluntário de pesquisa clínica. Em oncologia, ele é um paciente com câncer que aceita embarcar num estudo após ter sido extensamente informado dos riscos e benefícios. Os pacientes de pesquisa sabem que não há garantias de benefícios para si – já que o suposto medicamento ainda não teve sua eficácia comprovada – mas aceitam participar. Eles são parceiros excepcionais, que entenderam que a pesquisa clínica é o caminho para avançar o tratamento de futuros pacientes.

Outros pacientes entram num estudo por que parece haver uma chance – às vezes pequena – de ter um benefício clínico com estudo. Todas essas dúvidas são discutidas com o voluntário, que tem plena autonomia de perguntar, questionar e até mesmo desistir de participar da pesquisa, seja qual for o momento, sem que haja qualquer prejuízo ao seu tratamento.

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Os pacientes são acompanhados de perto por uma equipe multiprofissional a fim de garantir sua segurança e a coleta fidedigna dos dados. Nesse sentido, os voluntários são agentes ativos e indispensáveis para o desfecho adequado do estudo.

As fases da pesquisa clínica

Como falamos, os estudos em seres humanos começam apenas depois de um estágio pré-clínico, realizado em culturas de células e em animais (estes também tratados com todo o cuidado conforme convenções mundiais e sob orientação do CEP). A fase clínica propriamente dita pode ser dividida em três etapas.

Fase 1: Algumas dezenas de pacientes voluntários participam da primeira experiência em que o composto é testado em humanos. O principal objetivo é averiguar a segurança do composto e definir a dose recomendada para futuros testes em humanos. Avaliam-se os tipos e frequência de efeitos colaterais, que não podem sobrepor um limite pré-definido aceitável.

Esses pacientes devem ter uma boa saúde apesar do câncer, já que precisam tolerar efeitos colaterais algumas vezes desconhecidos e potencialmente graves. Assim, é muito comum um paciente não ser aceito, pois a função do fígado ou rim não está boa e aumentaria os riscos de problemas. São estudos muito delicados e os pacientes são monitorados de perto para garantir a segurança.

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Algumas vezes pode acontecer de um tipo de doença mostrar-se mais sensível ao composto, apontando um caminho a ser explorado. Em oncologia sempre convidamos pacientes oncológicos, pois já poderiam se beneficiar com resultados esperados da medicação testada, mas em outras situações onde o risco de efeito colateral é muito menor (dermatologia, cardiologia…) voluntários sadios podem participar.

Fase 2: O estudo passa a envolver algumas centenas de pacientes. Agora é o momento de testar a dose recomendada e analisar se a doença responde ou não a ela. Se na fase 1 houve alguma doença que se mostrou mais sensível, o estudo pode testar a medicação especificamente nessa circunstância. É aqui que o “candidato a remédio” precisa provar a que veio e, não à toa, a maioria das drogas na oncologia falha nessa etapa.

Fase 3: Nesta fase, são recrutadas centenas ou até milhares de pacientes. O medicamento em potencial deve se mostrar superior a fármacos já existentes — por exemplo, uma imunoterapia mais efetiva ou menos tóxica do que a quimioterapia normalmente prescrita.

Na fase 3, usamos algumas ferramentas estatísticas para saber se o novo composto é realmente melhor. Uma delas é sortear os pacientes entre dois grupos: um que usará o composto e outro que receberá o remédio convencional ou o placebo. Este sorteio permite separar os pacientes em dois grupos completamente iguais com uma única diferença: usar ou não o composto. Assim conseguimos saber se o novo composto é realmente melhor.

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Um detalhe fundamental para evitar vieses é o segredo ou cegamento. Os pacientes e médicos não sabem qual droga estão usando. Nem mesmo os profissionais que administram o tratamento. Tudo isso para evitar vieses capazes de impactar no resultado. São esses grandes estudos de fase 3 que permitem um “composto promissor” se tornar um medicamento e receber a aprovação de agências regulatórias, como a Anvisa no Brasil, FDA nos Estados Unidos e EMA na União Europeia.

Conhecimento, inovação e acesso

No A.C.Camargo Cancer Center, temos a oportunidade de participar e de coordenar diversas pesquisas clínicas, sejam elas voltadas a pacientes adultos ou pediátricos. Estamos investigando nesse momento os resultados da imunoterapia em vários tipos de câncer. Em paralelo, também desenvolvemos e conduzimos estudos com as chamadas terapias-alvo em tumores que vão de câncer de mama a leucemia.

Outro ramo importante é a medicina personalizada, onde buscamos escolher o tratamento certo para cada paciente com o auxílio de biologia molecular e desenvolvendo biomarcadores – bandeiras moleculares que podem sinalizar se um paciente deve usar esse ou aquele medicamento. Falamos aqui de moléculas encontradas no sangue que nos ajudam a entender se e quanto ele vem reagindo à terapia. Tais estudos nos colocam cada vez mais no caminho de uma oncologia de precisão.

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A pesquisa clínica também nos remete ao desafio do acesso a tratamentos melhores. Embora ela não deva ser vista como uma simples via de acesso ao paciente, algumas pessoas podem se beneficiar de participar de um estudo ou mesmo ter a oportunidade de tomada de decisão com mais uma opção terapêutica oferecida. E não só pela chance de receber uma medicação superior, mas também por toda a infraestrutura dos centros de pesquisa, bem como pelo acolhimento e suporte da equipe multiprofissional responsável pela coleta de dados e monitoramento dos pacientes.

Felizmente, vivenciamos uma evolução constante na pesquisa clínica feita no Brasil. Já possuímos material humano e hospitalar de qualidade para desenvolver estudos e, com a aprovação de novas legislações, teremos um sistema ainda mais dinâmico e efetivo. Tudo isso sem perder de vista o ponto mais importante dessa história: os direitos e a proteção do paciente.

* Dr. João Paulo Nogueira Lima é oncologista clínico e coordenador de Pesquisa Clínica do A.C. Camargo Cancer Center, em São Paulo

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