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Sem evidência científica, não alcançaremos políticas públicas de qualidade

No Mês da Ciência, um especialista em políticas públicas aponta os caminhos para incorporarmos as medidas de saúde com maior custo-efetividade

Por Miguel Lago, especialista em políticas públicas de saúde*
18 jul 2022, 12h13
Foto de computador com gráficos
O sucesso de políticas públicas pode e deve ser mensurado.  (Foto: Lukas Blazek/Unsplash/Divulgação)
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Criticar os governos pelo mau uso dos recursos públicos, quando ocorre, não basta para gerar mudanças gerais. Chama a atenção para o problema, o que é louvável, mas é insuficiente. O Estado brasileiro só começará a servir adequadamente à sua população quando for capaz de formular e implementar políticas públicas com lastro e rastro

As políticas públicas são o conjunto de ações promovidas pelo Estado e que têm como objetivo melhorar a qualidade de vida da população. Mas como fazer políticas públicas que melhorem a vida da população de maneira substancial? 

O senso comum costuma atribuir essa função unicamente aos governos. “O governante A fez essas políticas públicas, às quais o governante B não quis dar sequência por estarem associadas a seu predecessor”. E o governante B está correto: governos podem iniciar e acabar com uma política pública. São eles que detêm o poder de decisão. 

Mas o sucesso de uma política pública não é algo abstrato. Não basta uma decisão para que ela funcione de verdade. Uma política pode ser ótima no papel e, na prática, não funcionar. E seu sucesso não se limita ao governo. Ele requer um engajamento de múltiplos atores, como a sociedade civil organizada, a academia e o serviço público. A cada um cabe um papel diferente. 

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A sociedade civil deve pressionar por mais direitos e mais serviços – articulando as demandas e cobrando seus governantes. A academia deve estudar as políticas públicas de maneira rigorosa: avaliar seu impacto, o custo-benefício e fazer recomendações fundadas em evidências científicas. Por fim, o serviço público é quem de fato implementa as políticas.

O Sistema Único de Saúde (SUS) é resultado desse processo de articulação de múltiplos atores. Há mais de três décadas está espalhado por todo canto do país, como um direito conquistado e vinculado diretamente à nossa democracia. Ele beneficia as camadas mais populares e também as mais abastadas da população, servindo mesmo àqueles quem têm plano de saúde. 

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De que modo? Seja por meio do atendimento do Agente Comunitário de Saúde (ACS) na porta de casa ou pela produção de vacinas e medicamentos na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e Instituto Butantan; seja pelo serviço da Unidade Básica de Saúde (UBS) ou pelo sistema de transplantes de órgãos; seja pela fiscalização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) ou pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU).

Devemos ter em mente que o SUS não é fruto da política de um governo. Ele nasce a partir de um movimento social que pressionou para que a saúde se tornasse um direito universal de toda a população. Ao longo desses 30 anos, está totalmente integrado à produção científica, que é decisiva para a qualidade das políticas de saúde. As servidoras e os servidores públicos são aqueles que, apesar das limitações orçamentárias e da instabilidade política, garantem a continuidade do serviço. 

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É nesse sentido que o Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS), em parceria com a Umane, lançou a Agenda Mais SUS: Evidências e Caminhos para Fortalecer a Saúde Pública no Brasil, um projeto que reúne dados e propostas para o futuro da saúde pública brasileira, em prol do fortalecimento do SUS. 

A agenda é produto dessa intersecção entre ciência, sociedade civil e serviço público. Todos os dados obedeceram a uma metodologia rigorosa, com olhar crítico e apartidário, a partir de ferramentas das Políticas Informadas por Evidências e grupos de trabalho com 72 especialistas da área no país, que trouxeram um amplo espectro das condições da saúde no Brasil, além de recomendações para os desafios do SUS

Dentre as propostas consta, por exemplo, a ampliação do gasto público em saúde para 5% do PIB até 2026 e 6% até 2030. O Brasil é o único país do mundo com mais de 100 milhões de habitantes a oferecer saúde universal, integral e gratuita para toda a sua população. No entanto, é um dos que menos investe nesse sistema: menos de 4% do PIB. 

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+Leia também: Azitromicina: o que é, para que serve, como tomar e cuidados

Um país como a Espanha, com um quarto da população, investe quase 7% de seu PIB. Propomos uma trajetória gradual, financiada pela redução da renúncia fiscal em saúde e tributação de produtos prejudiciais à saúde.

Em ano de eleições, exigir que os planos de governo e metodologias de gestão dos nossos elegíveis sejam informados por evidências é um caminho necessário para que as políticas públicas possam ser efetivas e contribuam para a redução de desigualdades, a promoção da justiça social e a melhora da vida da população. 

*Miguel Lago é diretor executivo do Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS), leciona Políticas Públicas na Universidade de Columbia. Esta coluna foi escrita para a campanha #ciêncianaseleições, que celebra o Mês da Ciência. Em julho, colunistas cedem seus espaços para refletir sobre o papel da ciência na reconstrução do Brasil. 

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