A relação entre saúde mental e doenças de pele é um tema que merece destaque nas discussões sobre o bem-estar integral do indivíduo.
A pele, a maior barreira protetora do corpo humano, não apenas desempenha funções biológicas vitais, mas também reflete o estado emocional de uma pessoa.
Ao longo dos anos, tenho observado que pacientes com condições que acometem a pele, como psoríase, albinismo, dermatite atópica, vitiligo e lúpus, enfrentam não apenas desafios físicos, mas uma sobrecarga mental significativa.
A interface entre cérebro e pele é tão profunda que, muitas vezes, o sofrimento emocional desencadeia ou agrava a condição dermatológica, criando um ciclo de frustração, isolamento e, em muitos casos, depressão.
A pesquisa sobre esta conexão é cada vez mais robusta. Segundo o estudo “Relação entre psoríase, depressão e ansiedade“, publicado pela revista Ibero-Americana, há uma alta prevalência de transtornos psicológicos em pessoas com psoríase. Sendo em média 30% a 40% para a depressão e 20% a 30% para a ansiedade, números significativamente maiores do que na população geral.
No entanto, o impacto na autoimagem e na forma como esses indivíduos se veem frequentemente passa despercebido, mas é fundamental para entender a gravidade do quadro de saúde geral do indivíduo.
A autoimagem é um conceito-chave que sustenta a percepção de si mesmo. A pele, sendo o primeiro ponto de contato com o mundo, tem um papel central nessa percepção. Conforme um estudo brasileiro, este órgão é parte essencial da imagem corporal e é também um instrumento de manifestação cultural.
Dessa forma, seu comprometimento por lesões, principalmente se forem visíveis, pode acarretar sofrimento psíquico ao indivíduo, o que aumenta a sensação de estresse e dos níveis do hormônio cortisol no sangue.
Esse hormônio tem influência direta na imunidade do organismo como um todo, incluindo a ativação de células de defesa na pele e liberação de radicais livres, o que favorece a fragilidade cutânea e piora os quadros dermatológicos.
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Portanto, quando a pele está comprometida, a percepção da própria identidade é desafiada, e isso pode gerar uma espiral de autocrítica e estresse. que só agrava a condição original e a saúde mental.
Além disso, pacientes muitas vezes evitam interações sociais em decorrência do estigma e da falta de conhecimento das pessoas acerca do tema. Isso afeta suas relações e favorece, perigosamente, o isolamento. Segundo estudos, portadores de doenças dermatológicas sofrem preconceito social, sendo discriminados de diversas formas.
No artigo “Aspectos psicológicos em dermatologia: avaliação de índices de ansiedade, depressão, estresse e qualidade de vida”, por exemplo, há uma frase bem emblemática que diz:
“As doenças de pele, diferentemente de outras doenças, estão expostas ao externo e, talvez por isso, as pessoas com estas condições necessitem de adaptação tanto à sua doença quanto à exposição ao outro.”
Na frase, fica claro que esse impacto não se deve apenas à carga emocional associada à administração de sua doença, mas também à incessante batalha contra olhares curiosos e comentários insensíveis que minam a autoestima e bem-estar psicológico dos portadores de peles raras.
É fundamental ressaltar a necessidade de uma abordagem psicoterápica para estes indivíduos, em conjunto ao tratamento medicamentoso da patologia. A abordagem deve ser integrada, e isso impacta inclusive no sucesso do próprio tratamento.
Felizmente, nos últimos anos as estratégias de manejo para doenças de pele evoluíram, incorporando a importância da saúde mental. Essa combinação é essencial para quebrar o ciclo de dor física e sofrimento emocional. O tratamento não é apenas sobre curar a pele, mas também sobre curar o coração e a mente daqueles que vivem com essas condições.
*Cynthia Nara é farmacêutica, doutoranda pelo departamento de Farmacognosia e Tecnologia Farmacêutica da Faculdade de Farmácia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), fundadora e CEO da Pele Rara, startup que desenvolve produtos para peles sensíveis.