Não é de hoje que as mulheres são ensinadas a conviver, aceitar e normalizar dores e incômodos inerentes à simples condição biológica de ser mulher. Essa mentalidade se reflete em comportamentos adotados desde muito cedo, após o primeiro fluxo. E, sozinhas, elas seguem tentando sublimar os desconfortos quando chegam à menopausa.
O resultado disso? Estudos indicam que, ao redor do mundo, a queda de produtividade das mulheres no trabalho devido aos sintomas do climatério causa prejuízos anuais da ordem de 732 bilhões de reais. É uma cifra alta, e só no Reino Unido 900 mil mulheres chegaram a abandonar o emprego em 2019.
Mas a situação pode ficar pior. Uma pesquisa recente da consultoria Warana indica que, até 2030, as mulheres nas fases de perimenopausa, menopausa e pós-menopausa vão corresponder a 25% da força de trabalho mundial.
Hoje, de acordo com levantamento da Bloomberg, elas são 11% dos profissionais em atividade nos países do G7 (Canadá, França, Alemanha, Japão, Itália, Reino Unido e EUA). Quantas não serão prejudicadas pelas manifestações do climatério?
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Falamos aqui de situações comuns, como fogachos (ondas de calor), mudanças de humor, secura vaginal, entre outros incômodos dos quais muitas mulheres ainda têm vergonha de falar, sobretudo no ambiente do trabalho. Mas precisamos tratá-los como uma questão de saúde pública.
É claro que estamos no curso de uma mudança cultural, com maior abertura para o debate de temas antes restritos à intimidade. Porém, ainda há um longo caminho a percorrer.
E ele passa por esclarecer e mover os tabus criados em torno da menopausa e das terapias de reposição hormonal. Esses são tratamentos com potencial de mitigar a maioria dos sintomas que atrapalham o dia a dia da mulher − mas ainda subutilizados devido à desinformação a respeito.
Isso se deve em grande parte a estudos feitos nos anos 1990 visando à formulação de estratégias de prevenção para doenças cardíacas, câncer de mama e intestino e fraturas por osteoporose entre mulheres que já estavam na menopausa.
À época, a reposição hormonal − que há 20 anos se baseava em tipos diferentes de hormônios e perfil de pacientes distinto do que é preconizado atualmente − foi administrada a mulheres já na menopausa e sem considerar o perfil e as comorbidades específicas de cada uma. No fim da análise, observou-se que muitas tiveram infarto, AVC e câncer.
Assim, a partir dos anos 2000 disseminou-se uma imagem negativa das terapias de reposição hormonal, como se não fossem seguras de maneira irrestrita, e grande parcela da classe médica ficava receosa de prescrevê-las.
Entretanto, avanços significativos nessa linha terapêutica aconteceram ao longo dos últimos anos. Primeiro: a redução na quantidade de hormônios utilizada. Segundo: a individualização da indicação e do tratamento, respeitando história, estilo de vida, fatores de risco e comorbidades de cada mulher.
Novas moléculas de progestagênio, por exemplo, tornaram a terapia mais segura. É o caso da drospirenona, que, além de possuir efeito similar ao da progesterona natural, possui ainda ação diurética, ajudando a diminuir a retenção líquida e a controlar a pressão arterial.
De fato, há alternativas para que as mulheres passem por essa fase da vida sem sofrer com tantos sintomas desagradáveis, podendo aproveitar cada momento com mais qualidade de vida.
Com base nos novos estudos e na divulgação de informações confiáveis sobre a reposição hormonal, mais mulheres poderão fazer uma escolha consciente junto a médicos qualificados.
* Rogério Bocardo é ginecologista e obstetra, membro do Grupo de Ginecologia Endócrina da Faculdade de Medicina de Jundiaí e consultor médico da Libbs Farmacêutica