Hipospádia: por dentro da condição que pode causar micropênis
O problema congênito é uma das malformações mais comuns entre os homens, mas pode passar despercebido até impactar a vida adulta

Paulo (nome fictício) tinha 27 anos e era portador de uma hipospádia leve, não corrigida na infância. Tinha um relacionamento sério com uma parceira fazia 7 anos, que jamais havia comentado sobre sua aparência genital.
Porém, o relacionamento de ambos acabou e Paulo foi em busca de novas experiências. Uma parceira, no momento da relação sexual comentou que seu genital era muito estranho e que ele deveria procurar um urologista.
Esse comentário destruiu a autoconfiança de Paulo, que passou a colocar preservativo e a apagar a luz para esconder da parceira seu pênis sempre que tinha relações sexuais. Esse é um caso verídico de um homem que nasceu com hipospádia leve. As hipospádias mais graves trazem consequências mais severas que vão além dos problemas estéticos.
A hipospádia é uma condição congênita que afeta o sistema reprodutivo masculino, caracterizada por uma anormalidade na localização da uretra, o canal que transporta a urina e o sêmen ao meio externo.
Ao invés de se abrir na ponta do pênis, a uretra se abre em uma posição anormal, que pode variar desde a ponta do pênis, na glande, até a base do órgão, na região do escroto ou até mesmo no períneo.
As causas exatas da hipospádia ainda não são totalmente compreendidas, mas diversos fatores têm sido associados à sua ocorrência. Questões genéticas podem desempenhar um papel, uma vez que a condição pode ocorrer mais frequentemente em algumas famílias. Além disso, fatores ambientais também já foram investigados, como a exposição a certos hormônios ou produtos químicos durante a gravidez.
A hipospádia ocorre mais frequentemente em crianças provindas de reprodução assistida.
A hipospádia é uma das malformações congênitas mais comuns do sistema urinário. Estima-se que a prevalência varie de 1 em 200 a 1 em cada 300 nascimentos masculinos.
Quais são as consequências da hipospádia?
A condição pode se manifestar em diversos graus de severidade, influenciando de maneira significativa a vida do paciente. As repercussões variam conforme a gravidade da condição e a localização do meato uretral (abertura da uretra). A uretra localizada numa posição mais baixa pode levar a um jato de xixi espalhado ou para baixo, fazendo com que seja necessário urinar sentado.
Nos quadros mais graves, o líquido ejaculado não atinge o canal vaginal, levando à infertilidade. Além disso, a forma diferente do pênis pode levar o homem a ter inibição na relação sexual, com problema na autopercepção, autoconfiança e na autoimagem.
Além disso, em cerca de 25% das hipospádias há curvatura do pênis, que pode ser importante o suficiente a ponto de impedir a penetração. Uma associação frequente com a hipospádia é a ausência de testículos no escroto, o que pode contribuir para infertilidade no futuro.
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Diagnóstico e tratamento
O diagnóstico da hipospádia geralmente é realizado logo após o nascimento, durante o exame físico do recém-nascido. O profissional de saúde avaliará a posição do meato uretral, além de observar outras características do órgão genital. Geralmente há um excesso de pelo genital no dorso do órgão, formando um capuz e escassez de pele ao redor da uretra.
O tratamento geralmente envolve cirurgia, que é mais eficaz quando realizada em um período entre 6 meses e 18 meses de idade. O procedimento cirúrgico pode incluir diversas técnicas, dependendo da localização do meato e da gravidade da condição. A cirurgia consta do reposicionamento da uretra no topo do pênis, do melhoramento estético genital e da correção da curvatura peniana.
Hipospádias mais graves podem ser tratadas com cirurgias em duas etapas. Na primeira, forma-se o falo e corrige-se a curvatura e na segunda refaz-se a uretra. A taxa de complicações varia de 5 a 50%, a depender da intensidade da condição e da experiência do cirurgião. A fístula (vazamento de urina pela pele) e o estreitamento da uretra são as complicações mais comumente encontradas.
Em resumo, a hipospádia, apesar de trazer preocupações, pode ser gerida de forma eficaz com o acompanhamento adequado e intervenção cirúrgica.
O conhecimento sobre suas causas, consequências e opções de tratamento é fundamental para os pais e cuidadores, garantindo que a criança tenha acesso ao cuidado necessário e uma qualidade de vida adequada.
A cirurgia tem bom índice de sucesso, podendo ser realizada em regime de hospital dia, na maioria das vezes.
*Ubirajara Barroso é professor adjunto de urologia da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública, chefe da divisão de cirurgia urológica reconstrutora e urologia pediátrica do Hospital da Universidade Federal da Bahia, chefe do departamento de cirurgia afirmativa de gênero e estética genital da Sociedade Brasileira de Urologia.