A crise da Covid-19 acelerou o cronograma de tecnologias disruptivas como as terapias digitais e aplicativos que usam comandos de voz para a execução de diversas funções. Dessa forma, hoje é possível agendar uma consulta com um médico pelo aplicativo ou portal da operadora de saúde utilizando apenas recursos vocais. Ou acionar o médico via app quando um familiar com doença de Parkinson ou problemas cardíacos precisa de cuidados, por exemplo.
Mais do que isso, já não é mais um sonho usar a voz para identificar sinais de uma doença. Tecnologias que permitem capturar sons em dispositivos usados no cotidiano, de aplicativos a sensores, demonstram potencial na detecção e na previsão de sintomas tanto para pesquisas quanto para o uso clínico.
Desde 2020, Israel conta com um aplicativo baseado em inteligência artificial capaz de indicar a presença de Covid-19 pela análise da voz do paciente. Na Europa e nos Estados Unidos, novas tecnologias abrem um mundo de possibilidades para a utilização da fala na triagem, no diagnóstico e no monitoramento de uma ampla gama de condições. Entre elas estão distúrbios neurodegenerativos, como Parkinson e Alzheimer, transtornos de saúde mental, como depressão e esquizofrenia, e doenças cardiovasculares, como insuficiência cardíaca.
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Para entender melhor o funcionamento dessas ferramentas, vale lembrar que a voz humana produz múltiplas frequências, algumas delas imperceptíveis ao ouvido. No entanto, elas são captadas pelas tecnologias digitais em todo o seu espectro. Com o auxílio de algoritmos especiais, essas plataformas conseguem monitorar sinais precoces de doenças baseadas no som.
Em linhas gerais, esses recursos analisam o que chamamos de biomarcadores presentes na voz. São sinais vitais, que revelam se o organismo está funcionando ou não dentro da normalidade. Os biomarcadores vocais foram estabelecidos pela comparação via computador de milhões de vozes de indivíduos.
Esse trabalho considera que a linguagem, a fala e o uso da voz são fenômenos complexos, resultantes da coordenação entre a função cerebral e pulmonar. Como estão ligados a muitos processos neurológicos e fisiológicos, os padrões, quando alterados, podem indicar uma série de doenças.
A voz também pode ajudar os profissionais de saúde no cotidiano, como aponta uma experiência realizada em hospitais associados à Universidade Harvard, nos Estados Unidos. Lá os médicos passaram a usar uma ferramenta digital para preencher os prontuários eletrônicos com a voz. Apesar da resistência inicial, hoje eles rejeitam voltar ao preenchimento convencional por escrito.
Assim como com qualquer nova tecnologia, aquelas que empregam o comando ou a interpretação da voz estão sujeitas a ajustes até sua implementação completa. Mas desde já mostram que os recursos vocais vêm alcançando um elevado patamar do ponto de vista científico e não serão mais vistos como antes no campo da medicina.
* Nathália Nunes é fonoaudióloga, consultora de mercado para saúde, fundadora da empresa Arta e palestrante do 7º HIS – Healthcare Innovation Show