Ser uma CEO na área da inovação voltada à saúde é um desafio que ultrapassa as questões de gênero. O ambiente médico-hospitalar é um ecossistema complexo, que exige sensibilidade e, acima de tudo, investimentos. Não há sucesso sem conhecimento técnico e dedicação. Em tempos de alta demanda — como a atual crise sanitária da Covid-19 —, o papel das mulheres nesse segmento tem despontado, especialmente no trabalho que busca democratizar o acesso aos serviços.
Ainda existe, por razões geográficas, econômicas, sociais e culturais, uma parcela da população que não consegue atendimento em saúde no modelo ideal. Atentas a essa questão, mulheres de diversas nacionalidades têm encabeçado projetos que apostam na tecnologia como um instrumento de inclusão. A telemedicina, que recentemente foi autorizada no Brasil, é o futuro para além das fronteiras. Representa o acolhimento ágil, humano e eficaz, com economia e sustentabilidade, e extensivo a todas as idades — com consultas do pediatra ao geriatra.
Em uma rápida análise social, percebe-se a liderança feminina nas rotinas de cuidado com a saúde dentro de casa. Essa habilidade migra para o perfil das executivas no ambiente corporativo. A visão ampliada sobre as necessidades das famílias, a experiência de mercado e a qualificação médica são fatores que, juntos, geram enorme potencial para mudar a realidade.
Infelizmente, ainda há o desequilíbrio na questão de gênero, com diferenças de oportunidades e salários — sendo melhores para os homens, evidentemente. Quando se trata de tecnologia, o tema é ainda mais complicado, pois exige que as gestoras trabalhem além, para mudar o mindset do entorno. O grande desafio é não permitir um tratamento diferente. A meritocracia não tem sexo e ajuda a conquistar espaços, por mais limitados que eles possam parecer.
É fato que lideranças femininas ocupam, pouco a pouco, um papel estratégico no mundo da inovação. Há um longo caminho pela frente, considerando a estimativa de que apenas 15,7% dos negócios têm uma mulher no comando, conforme dados da Associação Brasileira de Startups (ABStartups). Em um recorte mais detalhado, uma pesquisa recente da Endeavor aponta que apenas 9,4% das startups são fundadas exclusivamente por mulheres e 1,4% são cofundadas por elas.
+ LEIA TAMBÉM: Machismo faz, sim, mal à saúde
A mesma pesquisa traz outros pontos importantes à tona. Há desigualdade na alocação de capital. Startups fundadas exclusivamente por mulheres receberam 0,04% do total de capital investido no país em 2020. Além disso, os tickets médios para mulheres são inferiores aos recebidos pelos homens.
Mas a semente da equidade já está sendo plantada. Prova disso é que essas dirigentes tornaram-se vozes ativas em projetos que evoluíram do campo das ideias para negócios escaláveis e têm atraído a atenção de investidores internacionais. Mulheres, tecnologia e saúde se complementam em um hub de transformação.
Os desafios não podem intimidar o nascimento de lideranças que saibam conduzir esse momento de travessia. O sucesso de uma serve de estímulo às outras. Em momentos recentes da história, as divergências já foram muito maiores e, com competência, líderes pioneiras conseguiram superá-las. Aquelas que não têm medo de enfrentar as estatísticas e probabilidades certamente vão testemunhar — e participar de — avanços importantes para a humanidade.
* Jihan Zoghbi é fundadora e presidente da healthtech Dr. TIS e da Associação Brasileira CIO Saúde (ABCIS)