Quem já pegou coronavírus se beneficiaria de uma eventual vacina?
Responder essa pergunta não é fácil. Isso depende do tipo de vacina, do momento em que for aplicada, da imunidade promovida pela Covid-19 em si...
Os leitores que nos enviaram a Boa Pergunta de hoje já estão de olho no futuro. Aos montes, eles questionam: quando a vacina para o coronavírus (Sars-CoV-2) estiver disponível, os milhões de brasileiros que tiveram a doença deverão tomá-la?
Ainda não existe uma resposta exata. Mas tudo indica que eles poderão, sim, beneficiar-se da dose — se estiverem dentro do público-alvo de uma campanha de vacinação, como falaremos mais adiante. “Temos várias doenças que não conferem imunidade permanente, e esse pode ser o caso da Covid-19”, comenta Juarez Cunha, infectologista e presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm).
Ou seja, o corpo até ficaria um tempo protegido, mas, com o passar do tempo, suas defesas se perderiam, o que justificaria a vacinação. Entretanto, no contexto do Sars-CoV-2, não sabemos por quanto tempo a imunidade decorrente da infecção duraria, nem qual a validade do efeito de uma vacina.
Outa incógnita que interfere com essa questão é a potência da imunidade promovida pelo contato com o coronavírus em si. “Não temos elementos para afirmar que alguém que teve a doença está totalmente protegido. Então a infecção não impediria a vacinação”, explica Cristina Bonarino, imunologista do Comitê Científico da Sociedade Brasileira de Imunologia (SBI Imuno).
Mais um ponto a se considerar é a formulação das vacinas estudadas. É possível que uma promova uma imunidade melhor do que a de uma infecção natural, enquanto a outra, não. Só pesquisas futuras responderão isso.
Quem será o público-alvo da vacina contra o coronavírus?
Uma coisa é eventualmente se beneficiar de um imunizante. Outra é integrar a turma que deve participar das primeiras fases de uma campanha de vacinação. Em teoria, quem já pegou a Covid-19 poderia ficar um pouco atrás na fila por uma vacina, até porque estudos iniciais sugerem que, pelo menos no curto prazo, a maioria dos infectados desenvolve algum grau de proteção. Em uma entrevista, Dimas Covas, diretor do Instituto Butantan, defendeu que programa de vacinação nacional priorizasse quem ainda não teve contato com o vírus.
Só tem um detalhe importante aqui: reconhecer todos os brasileiros infectados pelo coronavírus não é moleza, principalmente se você considerar a falta de testes no cenário nacional e a presença de pessoas com casos leves ou assintomáticos que sequer foram investigar seu estado de saúde.
Considerando isso, os especialistas ouvidos por VEJA SAÚDE acreditam que, quando uma vacina estiver disponível, é possível que o histórico de infecção não seja levado em conta.
Esse argumento, claro, ganharia ainda força se a vacina precisar ser reaplicada de tempos em tempos. Em outras palavras, se no futuro a Covid-19 virar uma espécie de gripe, que demanda aplicações anuais da vacina, uma infecção prévia dificilmente interferiria na determinação do público-alvo.
“Muita gente que já teve a doença será vacinada até mesmo porque, para cada caso confirmado, estimamos algo entre seis e 12 assintomáticos ou com sintomas muito leves”, diz o médico Renato Kfouri, presidente do Departamento de Imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP).
Mas então quais grupos seriam priorizados? Fala-se muitos dos profissionais de saúde, de professores e de pessoas que integram outras atividades essenciais. Membros dos grupos de risco para o coronavírus — a exemplo de idosos e portadores de doenças crônicas como diabetes e hipertensão — também seriam privilegiados. Em uma reportagem de VEJA, você pode ver a recomendação que especialistas da Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos, fizeram sobre o assunto.
Com tantas candidatas à vacina, é possível que cada uma acabe sendo indicada para um perfil específico. Uma para crianças, outra para os mais velhos e assim por diante. Mas essas são meras especulações.
“No Brasil, não foi divulgado nenhum plano de prioridades, o que deveria ser feito urgentemente”, destaca Cristina. Nos Estados Unidos, se discute vacinar, além dos grupos que mencionamos, pessoas que não podem trabalhar remotamente e se expõem mais ao Sars-CoV-2.
Tomar a vacina pode ser perigoso se já tive Covid-19?
Essa é uma pergunta respondida com mais facilidade pelos especialistas. “Nosso sistema imune está preparado para isso. Tanto que já costumamos agrupar mais de uma vacina em uma mesma ampola”, argumenta Cristina.
Fora que as formulações atualmente testadas em humanos são feitas com o novo coronavírus inativado ou com apenas partes dele, o que torna impossível sua replicação no organismo.